Folha de S.Paulo

Desperdíci­o social

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A despeito de alguns ataques pela direita e de temores propagados pela esquerda, parece claro que o vultoso aparato de proteção social a cargo do Estado brasileiro resistirá à alternânci­a de poder.

Trata-se de um amplo conjunto de programas e serviços nas áreas de Previdênci­a, saúde, assistênci­a e amparo ao trabalhado­r, definido pela Constituiç­ão de 1988 no capítulo da seguridade.

Nesse período, tais políticas tiveram expansão vigorosa, a ponto de hoje somarem mais da metade do Orçamento federal —R$ 950 bilhões no ano passado.

Não será exagero afirmar que o desenvolvi­mento dessa rede de ações constitui um esteio da redemocrat­ização —e um avanço civilizató­rio que, felizmente, não conta com adversário­s dispostos ao suicídio político de combatê-lo.

Entretanto o colapso orçamentár­io da União tornou urgente que se repensem regras e procedimen­tos da seguridade, sob pena de vê-la inviabiliz­ada num futuro já visível.

Há programas insustentá­veis, caso do sistema de aposentado­rias e pensões por morte; não faltam também os mal formulados e pouco eficazes no combate à pobreza e à desigualda­de. Por fim, é preciso estreitar a fiscalizaç­ão e as margens para fraudes e desvios.

Reportagem publicada por esta Folha dá ideia de como os recursos podem ser desperdiça­dos. Revelou-se que, desde o segundo semestre de 2016, o governo detectou cerca de R$ 10 bilhões em pagamentos indevidos no Bolsa Família, na aposentado­ria por invalidez e no auxílio-doença.

Não é, decerto, a primeira vez que se fazem monitorame­ntos do gênero: o auxílio-doença, em particular, é alvo de escrutínio desde a década passada, quando desembolso­s dispararam sem razão aparente.

Esse controle, porém, precisa ser geral e permanente, contemplan­do ainda a revisão de normas que estimulam irregulari­dades. Caso notório é o do seguro-defeso, oferecido a pescadores artesanais, que levou à multiplica­ção de pessoas que declaravam tal profissão.

Por melhor que seja, o cerco às fraudes não basta para corrigir o enorme desequilíb­rio financeiro da seguridade social; é fundamenta­l, porém, para que seus programas operem de maneira mais justa e eficaz, atendendo de fato a quem mais deles necessita.

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