Liudmila Petruchévskaia tira sarro da plateia, canta e se diverte em Paraty
Na Casa Folha, as neuroses atuais da sociedade estiveram no cerne da questão dos debatedores
Vestindo preto dos sapatos ao chapelão, a escritora Liudmila Petruchévskaia, 80, tirou sarro de sua entrevistadora, ouviu fiu-fius da plateia, cantou “Besame Mucho” e disse amar os gatinhos “de paixão.” “E as crianças também, porque dá para pegar no colo”, falou na noite deste sábado (28) na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty).
Foi mais um dia qualquer na vida da rainha do horror russo, um dos grandes destaques desta edição da Flip. Ela vem ao Brasil a reboque de “Era uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha” (Companhia das Letras), coletânea de contos mórbidos e sinistros que bebem do folclore de seu país e das cicatrizes de décadas de autoritarismo.
Diz que aprendeu a contar histórias com a avó acamada, que tinha uma “memória fenomenal” e sabia ao pé da letra contos de Nikolai Gógol. Também ajudou o fato de ela contar com o que Petruchévskaia chama de “orelhas de elefante”.
Proibida em seu país até os 50 anos —sua escrita não se encaixava nas diretrizes estéticas do regime comunista—, Petruchévskaia pouco falou sobre sua condição de proscrita. Na verdade, a partir de certo ponto da conversa, mal formulou frases inteiras.
Mediadora da mesa, a portuguesa Anabela Mota Ribeiro teve problema para ser compreendida pelo filho da escritora, que traduzia as perguntas para a mãe. O artista Fiódor Pavlov-Andreiévitch passa temporadas em São Paulo e fala bem o português brasileiro, mas teve dificuldade para entender as perguntas.
Petruchévskaia também não pareceu disposta a responder. Fez seu show, dando respostas cortantes.
Terminou a noite cantando com ares de diva e dando uns passinhos para cá e para lá. Empilhou canções em francês —além de alguns trechos em inglês de “Only You”— , enquanto parte do público aplaudia ao ritmo da música e outra debandava da sala. Os que ficaram aplaudiram de pé.
Já a mesa que reuniu o escritor carioca Geovani Martins e Colson Whitehead contou com uma pergunta definida pelo mediador, Pedro Meira Monteiro, como provocadora —mas que, na verdade, a pergunta trazia uma insinuação maliciosa.
Em um papel levado até o palco, alguém da plateia perguntou a Martins se sua literatura seria incensada caso ele não morasse na favela do Vidigal.
“Quem pode responder a essa pergunta são os leitores, né? Meu trabalho é o mesmo. Se você recebe de um jeito ou de outro...”, respondeu.
Mais cedo, também se destacaram a mesa do historiador Simon Sebag Montefiore, que afirmou que “política é teatro”. “Stálin foi o mestre das fake news, entendia como espalhar boatos e criar men- tiras que funcionavam bem”, disse o biógrafo. Quanto a Trump? “Ele quer ser o primeiro czar americano, e pode ter êxito nisso.”
“Ele [Trump] quer ser o primeiro czar americano, e pode ter êxito nisso Simon Sebag Montefiore Escritor britânico