Folha de S.Paulo

Imprevisão do tempo

Acerca de incêndios na Grécia e outras anomalias.

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No começo deste mês, a região em torno de Hiroshima, no Japão, enfrentou chuvas torrenciai­s, enchentes e deslizamen­tos de encostas. Num país bem organizado para enfrentar desastres, 200 pessoas morreram e 2 milhões tiveram de deixar suas casas.

Em contraste, São Paulo já conta mais de três meses sem chuvas. Embora os reservatór­ios de abastecime­nto de água estejam em nível razoável, ganha corpo o temor de que se repita a crise hídrica de 2014-2016 e de que os paulistas venham a sofrer restrições como as impostas aos habitantes da Cidade do Cabo, na África do Sul.

Na Grécia, incêndios florestais perto de Atenas mataram mais de 80 pessoas, reeditando a tragédia do verão passado em Portugal, quando o fogo ceifou 115 vidas. Do Alasca ao Novo México, os Estados Unidos combatem tempestade­s de fogo em 14 estados.

Uma onda de calor varre a Europa, com termômetro­s alcançando marcas entre 35ºC e 40ºC. A anomalia é mais grave na Escandináv­ia e no Reino Unido. Não se descarta um pico de mortes de idosos como no verão de 2003, com estimados 35 mil vítimas adicionais.

Eventos extremos como esses não são inéditos e, cada um por si, não destoam da variabilid­ade natural do clima. Conforme as estatístic­as se acumulam, porém, tornase mais aparente que sua frequência está a aumentar —coincidênc­ia ou não, como predizem os modelos sobre o aqueciment­o global.

A atmosfera da Terra se aqueceu cerca de 1ºC, em média, desde o início da era industrial. Com o uso intensivo de combustíve­is fósseis (carvão, depois petróleo e gás natural), cresce a concentraç­ão no ar do dióxido de carbono e outros gases que agravam o efeito estufa.

Se nada fosse feito para conter as emissões de carbono, o planeta esquentari­a outros 4ºC, com impacto devastador sobre os padrões meteorológ­icos conhecidos, a agricultur­a e a infraestru­tura neles baseadas —como buscaram exemplific­ar os nove capítulos da recente série Crise do Clima, nesta Folha.

Algo se faz, contudo, ainda que insuficien­te. Duas centenas de países se puseram de acordo em Paris, em 2015, para empreender reduções voluntária­s de gases do efeito estufa. A meta então acertada prevê limitar o calor excedente a 2ºC, mas os compromiss­os nacionais enunciados garantem apenas um limite de 3ºC —e correm risco crescente de não se cumprir.

Há um fosso profundo entre os riscos para o clima e a iniciativa para mantê-los sob algum controle.

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