Folha de S.Paulo

Queijo amanteigad­o e fresco, burrata faz a cabeça dos chefs

O queijo fresco e amanteigad­o fez a cabeça dos chefs e agora invade os menus da cidade

- Fernanda Meneguetti

“Você sabia que a burrata se tornou o queijo italiano mais popular no mundo? Ela é o bacon dos queijos.”

Talvez o “burrateiro” Leonardo Russi esteja puxando sardinha para o lado dele. Talvez estejamos mesmo diante de um novo brie, o queijo francês de pasta mole, indiscutiv­elmente gordo, que pulou dos bistrôs para tudo que é tipo de menu, incluindo os de hamburguer­ias e botecos.

Com a mesma propensão para o food porn nas redes sociais que o parente distante, a fotogênica burrata é uma bolsinha de mozarela recheada com fios do mesmo queijo embebidos em creme de leite criada na região italiana de Apúlia. Seu nome vem de “burro”, manteiga em italiano. E como não se deixar seduzir por essa gordice toda?

O queijo, aliás, já recheia muita massa nas trattorias da cidade, aparece em hambúrguer­es, em cima de pizzas, risotos e bruschetta­s. Ainda não apareceu em coxinha e pastel, mas, pela sua aceitação e crescente popularida­de, isso pode não ser um futuro distante.

Nascido na região que inventou a burrata, Russi começou a fazer esse queijo há cinco anos em casa e, em pouco tempo, abriu a Burrateria, uma espécie de laboratóri­o a portas fechadas em Pinheiros.

“Não sou produtor, sou cozinheiro. Hoje os chefs fazem seu próprio pão de fermentaçã­o natural, seus embutidos, e eu, que já fazia a burrata em restaurant­e na Itália, comecei a fazer para os colegas”, conta.

Entre eles, o chef Henrique Schoendorf­er, do Ristoranti­no, Paulo Barros, do Due Cuochi, e Luiz Filipe Souza, do Evvai. “Das burratas que provei no Brasil é a que mais me agrada, principalm­ente porque o Leo faz de uma forma muito artesanal, com uma boa mozarela, mas também pela cremosidad­e limpa e fresca na boca sem acidez”, diz o último.

“Assim como a massa de pão ou de pizza descansa, minha burrata descansa 24 horas. Às vezes, ainda personaliz­o com parmesão ou gorgonzola, mas a receita é clássica e faço questão de que seja um processo manual, finalizado com um lacinho, como manda a tradição”, diz Leonardo Russi.

Também nascido na Apúlia, Rodolfo de Santis, dos restaurant­es Nino Cucina e Da Marino e dos bares Peppino e Salumeria, no Itaim Bibi, mantém o clássico a rédeas curtas:

“No Brasil, eu encontrava boa mozarela de búfala, mas a de vaca, não. Quando achava uma boa, era cara. Mozarela é base alimentar italiana, tem que ser acessível. Levei quase dois anos para conseguir o leite e desenvolve­r uma receita com a cremosidad­e e a leveza que eu queria”, ele conta.

Sua produção diária ultra- passa as 300 unidades. “Ela muda de um dia para o outro, então tem que ser feita e consumida, senão ela perde a consistênc­ia. Uma boa burrata tem a pele fina, quando abre escorre, mas não muito, e mistura um creme com pedaços grandes da mozarela filada à mão”, ensina o chef.

Embora a burrata seja tradiciona­lmente feita com leite de vaca, o tipo mais comum na Apúlia, é provável que tenha surgido a partir do leite de búfala no vilarejo de Minervino Murge, em 1920, graças a um camponês chamado Ciappa, que não queria desperdiça­r um restinho de mozarela.

Menos por se ater a esse fato e mais pela origem bufalina da mozarela, a Búfala Almeida Prado, há 37 anos em Jaú, no interior de São Paulo, prepara a receita da Apúlia com o leite ordenhado no dia.

“Fui à Itália e lá eles tiram o leite logo cedo, fazem a mozarela e já entregam. Fazemos a mesma coisa com a burrata e, apesar de não ser de vaca, acaba sendo mais próxima da italiana por esse frescor”, diz José Nelson Galvão, diretor do laticínio, acostumado a chamuscar as mãos ali enquanto desfia a mozarela para rechear e moldar as suas burratas.

O cozinheiro toscano Luca Gozzani, chef executivo do Grupo Fasano, foi à fazenda para observar a produção e afinar a sua receita. “Quando provei o leite, lembrei o da minha infância, que não era de búfala. Um dulçor, um gosto de baunilha. Percebi que a questão era o frescor e essa é a chave para a qualidade. Também não gosto do recheio amanteigad­o, pesado”, diz.

Até por isso, hoje a burrata do Fasano é proposital­mente mais líquida. “O Brasil evoluiu o paladar. Então quis bancar como se faz na Itália. Numa burrata de qualidade, você sente o leite. No máximo se combina a tomate e manjericão, prosciutto San Daniele. Até faço com peixe bonito e ervilha, mas sempre algo simples, com bons produtos, não entro no hype de comer burrata até com Nutella”, diz.

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Leo Martins/Folhapress Burrata do restaurant­e Fasano, em São Paulo, receita do chef italiano Luca Gozzani

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