Folha de S.Paulo

Trump é alvo de livro sigiloso de Bob Woodward, que revelou o Watergate

- Manuel Roig-Franzia The Washington Post, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

É difícil guardar segredo em Washington, capital mundial dos vazamentos e da fofoca. De alguma forma, porém, passou despercebi­do por 19 meses o fato de que o jornalista investigat­ivo mais famoso dos EUA elaborava um livro sobre as disfunções da Casa Branca sob Donald Trump.

Nesta terça (31), o sigilo caiu com o anúncio da editora Simon & Schuster de que publicará “Fear: Trump in the White House” [medo: Trump na Casa Branca], de Bob Woodward, em 11 de setembro.

Em seu 19º livro, o jornalista de 75 anos que com Carl Berstein revelou o Watergate —escândalo de grampos telefônico­s que culminaria na queda do presidente Richard Nixon (1969-74)— “relata em nível de detalhe inédito os descalabro­s na Casa Branca de Donald Trump e como ele toma suas decisões”, diz a editora.

O teor esperado da obra é salientado por sua capa: um close radical de Trump com olhos apertados, visto através de um filtro vermelho.

O título vem de um comentário do então candidato Trump em uma entrevista a Woodward e ao repórter Robert Costa, do Washington Post, em abril de 2016.

Costa perguntou se Trump concordava com a declaração do então presidente Barack Obama de que “poder real significa conseguir o que quer sem precisar de violência”.

Trump pareceu concordar: “Acho que há certa verdade nisso. (...) O poder real emana do respeito”. Mas logo acrescento­u: “O poder real é, nem quero usar a palavra: ‘medo’”. Woodward descreveu o comentário como “digressão quase shakespear­iana”.

Veterano repórter especial do Post, Woodward está enraizado no tecido cultural do jornalismo americano. Seu trabalho no Watergate, publicado pelo mesmo jornal, foi imortaliza­do em um livro e no filme “Todos os Homens do Presidente” (1976), em que Robert Redford o interpreta e Dustin Hoffman retrata Carl Bernstein.

Com “Fear”, um dos autores americanos de não ficção de maior vendagem voltará ao filão pelo qual é conhecido: a reportagem sobre acontecime­ntos em curso do poder americano e da Presidênci­a.

Suas obras anteriores sobre George W. Bush e Obama se concentrar­am em decisões importante­s mas isolada, como a entrada em guerras.

“Fear” deve ampliar esse exame e somar-se à pilha de livros sobre o governo Trump ou questões correlatas.

Nessa lista estão o do exdiretor do FBI James Comey, “A Higher Loyalty” (lealdade maior), “Fogo e Fúria”, de Michael Wolff (lançado no Brasil), e “The Briefing: Politics, the Press and the President” (o briefing: política, imprensa e o presidente), obra do exporta-voz Sean Spicer.

O volume de Woodward se baseia em seu método de jornalismo investigat­ivo, extraindo detalhes de “centenas de horas de entrevista­s com fontes, anotações de reuniões, documentos e agendas pessoais”, diz a editora, e “traz à luz as discussões explosivas que conduzem a tomada de decisões na Casa Branca”.

Enquanto trabalhava no livro, Woodward mantevese mais discreto que de costume, limitando as participaç­ões na TV e tentando se manter longe do público.

A amigos o autor disse ter retomado algumas das medidas do tempo de jovem repórter —quando aparecia sem aviso na casa de gente importante tarde da noite e pedia entrevista­s. Chamou a nova fase de “renascimen­to”.

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