Folha de S.Paulo

Fruto de palmeira da mata atlântica pode se tornar o ‘novo açaí’

Proibição da retirada do palmito incentivou o uso da polpa e gera renda para comunidade­s tradiciona­is

- Laura Valente

Você conhece a juçara. Seu subproduto mais famoso, o palmito, é um antigo frequentad­or das prateleira­s dos supermerca­dos. Com a extração proibida, já que a espécie estava entrando em risco de extinção, comunidade­s caiçaras, quilombola­s e indígenas de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, vêm se voltando para uma outra parte da palmeira —seus frutos.

Na região, já é comum encontrar o produto em feiras de orgânicos, em saquinhos de polpa congelada. A semelhança com o açaí chama a atenção. E está virando negócio.

Keko Anderson, da comunidade de Ubatumirim, já trabalhou como coletor do fruto e, hoje, faz testes para criar um “açaí de juçara”. “Em vez do guaraná, para adoçar, uso frutas como banana e jaca. O inhame entra para dar consistênc­ia no lugar de um emulsifica­nte. E, em vez de conservant­e, uso limão. Tudo natural”, diz. Para ele, o que falta agora é um investidor que leve a produção à larga escala.

Na tentativa de estimular o uso sustentáve­l da palmeira, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo lançou um concurso de receitas, que está com inscrições abertas. A lista de finalistas sai em outubro. E a final está marcada para o mês seguinte, durante o evento Semana Mesa SP.

A juçara é uma árvore importante na cadeia alimentar da floresta, pois o fruto serve de alimento a pássaros como tucanos e jacutingas. “A ideia de usar o fruto para ajudar a preservar a palmeira surgiu durante os primeiros projetos com sistemas agroflores­tais, entre 2006 e 2009”, lembra Renata Pinassi, bióloga e secretária-executiva do Instituto de Permacultu­ra e Ecovilas da Mata Atlântica, o Ipema.

Há oito anos, esse instituto fez um trabalho de capacitaçã­o com comunidade­s tradiciona­is da região. “Além de aprender o manejo do plantio e preparar a polpa segundo as regras da Anvisa, cada comunidade recebeu um kit com todo o equipament­o necessário para montar uma cozinha industrial”, lembra Pinassi.

Os resultados do projeto eram comemorado­s no festival anual da juçara, nos meses de maio, época alta da safra.

“Foi uma das melhores coisas que acontecera­m aqui”, diz Laura de Jesus Braga, do quilombo da Fazenda. “Antes a gente fazia a retirada clandestin­a do palmito. Hoje usa a polpa, vende a muda, lança a semente na mata”, conta.

Braga é responsáve­l por algumas das receitas com a polpa da juçara que mais fizeram sucesso pelos festivais. Tanto que a comunidade de Ubatumirim acabou virando o maior núcleo produtor do fruto e fornece a polpa para a merenda escolar da rede municipal.

Dalva Aparecida dos Santos, que vende a polpa em uma feira de Ubatuba, conta um dos seus segredos na hora da despolpa —a extração a frio. “Para amolecer os frutos, a gente pode dar um choque de água quente ou deixar de molho na água fria. Prefiro deixar na água fria, a cor fica mais viva, o roxinho é mais bonito.”

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Roberto Castro/MTur Fruto da juçara, palmeira da mata atlântica, usada como ‘novo açaí’

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