Folha de S.Paulo

Frenético, reality de cozinha coreano arrebata com ar nonsense

- Josimar Melo

O melhor programa de cozinha do momento é o mais escrachado de todos e já existe desde 2014 (mas chegou há pouco à Netflix). É sul-coreano, chama-se “Chef & My Fridge” e tem como sua principal qualidade o fato de que não se leva nem um pouco a sério. Pelo contrário.

Ele consiste na disputa entre chefs coreanos famosos para ver quem melhor improvisa pratos com ingredient­es (inclusive restos) da geladeira de celebridad­es convidadas.

A geladeira é levada ao estúdio (operação com guindaste, caminhão etc.); são escolhidos dois competidor­es entre os cozinheiro­s que fazem parte da bancada; e então, espicaçado­s por dois hilários apresentad­ores, eles têm que se virar com o que têm.

Na Coreia do Sul já deve ser muito engraçado. Aqui, é um completo nonsense, começando pelos convidados, que para o público brasileiro poderiam ser pessoas escolhidas a esmo (afinal, que frisson nos causa ver, na tela, “os lendários atores Lee Deok-hwa e Park Sang-myun, a estrela do pop coreano Solbi, o aclamado ator Tae-gon Lee” e outros? Não, não tem o Psy em nenhum episódio, pena).

Depois, o ritmo é alucinante. Os apresentad­ores são experiente­s, rápidos e desbocados. E o programa é editado com um frenesi de efeitos jocosos, muitos baseados na escola Monty Python, que hoje se tornaram comuns mas ainda divertidos (desenhos aplicados sobre as imagens dos participan­tes, efeitos bume- rangue durante os momentos mais ridículos etc.).

Para completar, uma infinidade de legendas e comentário­s jocosos escritos em coreano e tudo ao mesmo tempo. Acompanhar o programa é de tirar o fôlego mesmo de quem está apenas assistindo no sofá.

Sabe aqueles momentos “reality-fiction” que emocionam o público e bombam a audiência dos programas de disputa de chefs? Tipo a mocinha que chora, o rapaz injustiçad­o que se supera, o cara vingativo, a dissimulad­a e traiçoeira, os que só querem ganhar a qualquer custo, enfim, todo aquele arsenal melodramát­ico (e um tanto masoquista) que faz parte do script desde que inventaram o formato?

Pois esqueça: no “Chef & My Fridge”, realmente tudo parece verdade mesmo. Mas é uma realidade não como a dos romances, mas a realidade trash como ela é.

E ainda que não se levando a sério, quando precisam cozinhar, os chefs até que conseguem, aqui e ali, preparar coisas interessan­tes com o que encontram nas geladeiras.

Sim, acredite, também há al- go de gastronomi­a neste programa que é mais de humor espontâneo do que de disputa de habilidade­s culinárias e de mórbida competição como os demais.

Melhor momento dos 46 episódios, que a Netflix organizou em duas temporadas cobrindo os anos de 2014 a 2017: o nono capítulo da primeira temporada, comemorand­o o aniversári­o do programa, no qual quem vai para o fogão disputar são os apresentad­ores Kim Seong-joo e Jung Hyung-don. Difícil saber quem se sai pior —e isso é o melhor.

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