Folha de S.Paulo

Como diferencia­r o bom coach do charlatão

Ao escolher, desconfie do profission­al que dá garantia de sucesso, oferece soluções prontas e banca o terapeuta

- Anna Rangel

Há ao menos um coach para cada 1.793 pessoas no Brasil, cerca de um terço da proporção de médicos, que é de 470 por habitante. Segundo dados das cinco maiores escolas que formam esses gurus de carreira, foram diplomadas 116 mil pessoas desde 1999 —quando surgiu o o primeiro curso.

Com oferta em alta e nenhuma regulament­ação no setor —há pelo menos 12 associaçõe­s da categoria—, escolher um bom nome é um desafio.

O coaching virou sinônimo de aconselham­ento profission­al, mas sua função é desenvolve­r habilidade­s pontuais, como liderança e comunicaçã­o, diz Joel Dutra, professor da FIA (Fundação Instituto de Administra­ção).

Segundo ele, se a ideia é conversar sobre um plano de ascensão na empresa, o profission­al tem, como alternativ­a ao coach, um mentor, que pode ser um colega experiente disposto a agir como orientador.

As duas atividades são muito diferentes da terapia, que trata na origem problemas profundos, como conflitos relacionad­os à autoridade.

Quando a publicitár­ia Giovanna Peixoto, 25, procurou sua primeira coach, queria ajuda para melhorar o relacionam­ento com sua chefe e averiguar se deveria mesmo trabalhar em agências.

“Ela dizia que ia descobrir meu dom, mas só apontava problemas sobre meu passado. Não havia espaço para pensar em soluções. Achei parecido com a terapia, que já tinha feito, por isso desisti”, diz.

Se a técnica não ajuda o indivíduo a ver seu problema de forma crítica para tomar decisões sozinho, não serve, diz Sigmar Malvezzi, doutor em psicologia e professor da USP.

Giovanna encontrou outra coach após indicação de um amigo, o que costuma ajudar.

O que não funciona é se basear no número de seguidores do profission­al ou nos elogios que ele recebe em redes sociais, diz Vilela da Matta, presidente da SBCoaching (Sociedade Brasileira de Coaching).

“Há coaches que pagam para receber depoimento­s positivos e compram seguidores.”

O primeiro passo para escolher bem é listar alguns nomes, descobrir onde eles estudaram e se têm credenciam­ento em alguma associação.

Pedir referência­s e marcar uma conversa gratuita com pelo menos dois deles é essencial, diz João Luiz Pascoal, presidente da ICF (Internatio­nal Coach Federation).

Se nesse encontro o cliente não sentir afinidade com o profission­al, deve cortá-lo da lista. “É um trabalho que mexe com a intimidade, sem conexão não dá certo”, diz a coach Regina Nogueira.

Quem promete resultado em dez sessões também deve ser cortado, diz a coach Bia Nóbrega. Pior ainda se vende um pacote fechado, parcelado em várias vezes. “Não posso prometer nada. Há casos em que a pessoa resolve o problema em quatro consultas, outros pedem mais tempo”, diz.

Também age de forma antiética quem faz venda casada de coaching e recolocaçã­o profission­al, afirma Elaine Saad, presidente da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos).

Segundo ela, outro problema é quando o coach contratado pela empresa para atender um funcionári­o deixa o RH interferir no seu trabalho.

Pouco mais de seis meses depois de ser removido de um cargo de gestão, o engenheiro Mauro Cervellini, 48, ouviu de um coach pago pelo banco onde trabalhava que ele não tinha perfil para ser líder.

“Não conseguia concordar com o que ele dizia”, diz Cervellini, que escolheu o coach entre alguns nomes pré-aprovados pelo RH da companhia.

Quando se recuperou do baque, aceitou o convite de uma empresa do mesmo setor para chefiar 35 pessoas.

O profission­al deve ser avisado quando o coach conversa com seu gestor, diz Elaine. O que é dito nas sessões é confidenci­al. “Quando somos contratado­s por uma empresa precisamos atender dois clientes, o funcionári­o e a organizaçã­o, sem entrar no jogo

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Marcelo Justo/Folhapress O engenheiro Mauro Cervellini, 48, em São Paulo

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