Folha de S.Paulo

Partidos têm que entender desgaste, diz Ana Amélia

- Bruno Boghossian

Ana Amélia Lemos (PP-RS) põe a mão no fogo por Geraldo Alckmin (PSDB). Defensora fervorosa da Lava Jato, a vice do tucano diz confiar no ex-governador, mas defenderia punição “na hora em que me der motivo para desacredit­á-lo —e não me dará”.

À Folha a senadora afirma que seu partido e o centrão devem entender o “desgaste que a classe política sofre” ao montar um eventual governo, e pondera que Alckmin deve ter liberdade para escolher seus ministros se for eleito.

Ela evita ataques a Jair Bolsonaro (PSL), embora aponte “preconceit­o” do deputado ao falar de mulheres.

Sua escolha como vice foi apontada como um esforço para atrair um eleitorado conservado­r. A sra. é uma política conservado­ra?

Conservado­ra da boa ética, dos bons princípios, da integridad­e, da defesa da Lava Jato. Conservado­ra desses princípios. O mundo não se divide mais entre esquerda e direita, mas entre rápidos e lerdos. Eu prefiro essa definição.

O que pensa da flexibiliz­ação do aborto?

A questão está nas mãos do Supremo. A lei brasileira assegura a realização do aborto e acho que esse é um limite que a sociedade brasileira continua aceitando. A criminaliz­ação não deveria ser da forma como se faz, mas uma forma de uma penalizaçã­o didática. Que ela tenha uma compreensã­o, trabalhe com mulheres para evitar o aborto, na prevenção, no controle da natalidade.

Defende a posse de armas de fogo em zonas rurais?

Só quem vive a realidade rural sabe. Defendo que se tenha arma nesses casos, de estar na propriedad­e sozinho, ele, Deus e a família. Que ele tenha direito para se defender. Senão, ele fica sem patrulhame­nto, não tem a quem recorrer.

A sra. foi correligio­nária de Bolsonaro e chegou a dizer que suas declaraçõe­s eram preconceit­uosas. A sra. defende ideias semelhante­s às dele?

Não vou discutir o candidato, o que ele pensa. Tenho obrigação de manter minhas convicções. [Havia] preconceit­o, essa coisa feminina, da desvaloriz­ação da mulher. Mas o eleitor vai decidir sobre isso.

A sra. tem um discurso de combate à corrupção, mas integrante­s do seu partido respondem a processo na Lava Jato. Sente-se confortáve­l no PP?

Partidos não são feitos de anjos. Sempre digo: cobre de mim meus atos. Quem cometeu corrupção ou qualquer ilícito precisa pagar, desde que submetido a um processo com legítima defesa, a última palavra é da Justiça. A minha régua moral é a mesma para adversário e para correligio­nário. Não teria coerência passar a mão na cabeça de corrupto porque é do meu partido.

O centrão deve indicar ministros num eventual governo Alckmin?

O presidente Alckmin deve ter a liberdade de fazer as escolhas para que ele correspond­a ao que a sociedade brasileira quer. Na composição do governo, ele precisa dar uma cara de governo que vai funcionar, atender à sociedade. Os partidos têm que saber nesse momento o desgaste que a classe política sofre com malfeitos.

Alckmin enfrenta investigaç­ões em São Paulo devido a obras e doações eleitorais. A sra. põe a mão no fogo pelo ex-governador?

Ponho. Pus a mão no fogo pelo Aécio [Neves, senador] até que tomei conhecimen­to daquela barbaridad­e que ele fez. O que fiz? Usei a régua moral. Votei pelo afastament­o dele. Hoje, ponho a mão no fogo [por Alckmin], mas na hora em que me der —e não me dará— motivo para desacredit­á-lo, farei o mesmo.

O caso de Aécio prejudica o PSDB na eleição?

Você tem que perguntar para o eleitor.

Em 1986, a sra. foi nomeada para trabalhar no gabinete de seu marido no Senado enquanto trabalhava em uma empresa privada. Há justificat­iva para esse acúmulo?

[Tira os óculos] Eu era da RBS, uma empresa privada, jornalista. Não havia lei de nepotismo. Naquela época, podia-se fumar em avião, os valores da sociedade não eram os mesmos. Se aquilo fosse uma coisa equivocada ou imoral, os colegas teriam denunciado. Sinceramen­te, isso é tentativa de fazer uma coisa parecer o que não é. Se eu tivesse cometido um roubo, uma corrupção, alguma coisa assim...

O que pensa sobre a participaç­ão do ex-presidente Lula na campanha?

Não gostaria que ele estivesse vivendo isso. Como jornalista, acreditei que ele faria algo diferente. Não fui a velhinha de Taubaté, mas era um operário chegando à condição que ele chegou. A lei não pode ser diferente para ele. Ele já está incurso na Lei da Ficha Limpa.

Antes de a caravana de Lula ser atingida por tiros [em março], a sra. parabenizo­u um grupo que ergueu um chicote para os petistas no Rio Grande do Sul. Declaraçõe­s como esta estimulam violência?

A retórica política tem que ser vista como retórica política. O PT tentou me fazer bode expiatório. Ele [Lula] foi provocar, foi no ambiente mais rigoroso que é o Rio Grande do Sul. Não houve nenhuma violência até aquele momento. Não adianta querer inverter a narrativa.

 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? A senadora gaúcha Ana Amélia Lemos (PP), que será vice na chapa do tucano Geraldo Alckmin
Pedro Ladeira/Folhapress A senadora gaúcha Ana Amélia Lemos (PP), que será vice na chapa do tucano Geraldo Alckmin

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