Folha de S.Paulo

Investigaç­ão sobre muro sem dono na USP é inconclusi­va

Quebra de peças é mistério, e execução está em um limbo entre prefeitura, empresas e universida­de

- Mariana Zylberkan e Thiago Amâncio Zanone Fraissat - 3.jul.18/Folhapress Divulgação/Prefeitura de São Paulo

A investigaç­ão policial sobre as 20 placas de vidro quebradas no muro que separa a marginal Pinheiros da raia olímpica da USP é inconclusi­va. O muro não tem dono —foi construído com doações de 44 empresas à prefeitura.

O novo muro de vidro que separa a marginal Pinheiros da raia olímpica da USP, hoje, não tem dono, já tem sinais de abandono e é alvo de uma investigaç­ão policial que deve ser arquivada sem nenhuma conclusão.

O modelo de muro com vidraças foi anunciado em julho do ano passado. A construção foi feita por meio de doação de empresas à USP, sob intermedia­ção do então prefeito e atual candidato ao governo, João Doria (PSDB).

A negociação para a construção do muro não dispõe de um contrato entre as companhias e a universida­de, apenas um termo de doação, o que dá margem ao atual limbo em que se encontra a execução dos serviços.

Para a gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB), apesar de a obra ter sido desenhada sob os moldes das doações de empresas à prefeitura, praticadas desde o início da gestão Doria, não cabe ao município fazer nenhuma intervençã­o por não se tratar de obra da administra­ção. O chamamento público foi feito pela universida­de, ressaltou a gestão.

Por outro lado, a USP afirma que, até a obra ser entregue, qualquer intervençã­o é de responsabi­lidade das 44 empresas que aceitaram fazer doações, inclusive a substituiç­ão de ao menos 20 placas quebradas de forma misteriosa nos últimos quatro meses.

A USP diz ainda que não está definido quem irá pagar a conta de toda a manutenção do muro após o fim da obra —composta de 1.222 placas de vidro, cada uma delas avaliada em cerca de R$ 4.000.

Diante de grave crise financeira, a universida­de terá dificuldad­e com esses custos.

Com 96 mil alunos e orçamento de cerca de R$ 5 bilhões por ano, a USP tem quase todo recurso onerado pela folha de pagamento. A universida­de fez planos de demissão voluntária, congelou contrataçõ­es e obras, e o Hospital Universitá­rio reduziu atendiment­os.

Mesmo assim, a definição a respeito da manutenção do muro de vidro deve ser decidida em breve, já que resta pouco a ser feito na obra.

Há cerca de duas semanas, o muro recebeu as últimas placas de vidro, e a empresa responsáve­l pela instalação afirma que, com isso, sua participaç­ão na obra chegou ao fim.

A fabricante doadora dos vidros ainda disponibil­izou cerca de 120 placas extras de reserva em caso de quebras.

Nesta terça (7), havia sinais de abandono no local. Ainda restava um vão com vidros estilhaçad­os desde a última quinta-feira (2) e que ainda não tinham sido substituíd­os. Parte do estoque está armazenado ao ar livre, em cavaletes de ferro, à beira da marginal Pinheiros, sem proteção.

A Folha encontrou ao relento cerca de dez placas de vidro —só esse conjunto vale em torno de R$ 40 mil. Por estarem à disposição das va-

riações de tempo e temperatur­a, apresentav­am avarias como quinas trincadas e sujeira provocada pela lama do canteiro de obras do muro.

Até o momento, não há também posicionam­ento oficial sobre o trecho de cerca de 20 metros que continua com as esquadrias de alumínio instaladas, mas vazias, sem as placas de vidro. Um muro de alvenaria ainda protege essa parte.

De acordo com o empresário Jorge Abduch, um dos responsáve­is pela instalação das placas de vidro, o trecho irá ficar de fora da obra por estar em uma área afetada por uma tubulação de esgoto, que dificulta a instalação das placas.

A pulverizaç­ão de empresas envolvidas na construção e a falta de um contrato têm dificultad­o também o trabalho da Polícia Civil, que apura desde abril o motivo de pelo menos 20 placas terem quebrado.

O delegado Ubiraci Oliveira afirma que o inquérito aberto em abril deve ser concluído em breve sem apontar o autor ou as causas das avarias. “Por ora, não existe nenhum suspeito”, diz ele, que deve postergar a conclusão do inquérito por mais 30 dias.

Em comum, os 16 boletins de ocorrência registrado­s desde então são vagos em apontar suspeitos ou causas técnicas que levaram ao espatifame­nto das peças. Duas testemunha­s, entre elas um remador que frequenta a raia olímpica da USP, afirmaram que ouviram o barulho dos estilhaços, mas não sabem dizer quem ou o que o provocou.

De acordo com o delegado, 11 placas de vidro quebradas foram submetidas à perícia, mas cinco laudos foram considerad­os inconclusi­vos. Dos outros seis, três apontam que o vidro foi quebrado de dentro para fora da raia, e os outros três, no sentido oposto.

Não há também vestígios de objetos que possam ter sido usados nas depredaçõe­s, arremessad­os de veículos que passam pela marginal ou vindos de outra forma. Em frente ao muro, no lado de fora da raia, há um lamaçal com pedras para todos os lados e o acesso ao muro não tem barreira.

A esperança dos investigad­ores é de alguma prisão em flagrante que leve a outros suspeitos. Nenhuma denúncia foi feita, nem sequer anônima.

De acordo com a USP, está prevista para o início de setembro a instalação das câmeras de vigilância prometidas desde o início da obra.

A expectativ­a da polícia é que as imagens ajudem a solucionar o mistério dos vidros quebrados, apesar de levar em conta um extenso leque de fatores técnicos, como falha de projeto, movimentaç­ão do solo e trepidação dos veículos.

Os laudos dizem, por exemplo, que problemas no armazename­nto podem deixar os vidros mais suscetívei­s às quebras, já que ficam soltos ao ar livre, sem suporte.

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Parte do muro de vidro da USP onde placas não serão instaladas, segundo empresa, devido a tubulação de esgoto;Sete placas de vidro reservas sofrem danos ao ar livre, sob chuva e sol; no chão, obra onde passarão cabos de câmeras de segurançaP­eça que foi quebrada em3de julho, de madrugadaP­rojeto apresentad­o em 2017 de como deveria ficar a raia olímpica com o muro de vidro pronto
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