Folha de S.Paulo

Para PF, técnico ligado ao PSDB é suspeito de negociar norma

Troca de mensagens entre economista Roberto Giannetti e outros suspeitos indica favorecime­nto da Paranapane­ma

- Fábio Fabrini

Relatório da Polícia Federal diz que o economista Roberto Giannetti da Fonseca, ligado ao PSDB, é suspeito de receber pagamento da siderúrgic­a Paranapane­ma para negociar com o governo federal portaria favorável à empresa. A defesa dele não quis se pronunciar.

O economista Roberto Giannetti da Fonseca, que é ligado ao PSDB, e um grupo de advogados são suspeitos de terem recebido pagamentos da siderúrgic­a Paranapane­ma para negociar a compra de uma norma favorável à empresa no governo federal.

Relatórios da Operação Zelotes apontam que a portaria 1.618/2014, editada em conjunto pela Receita e pelo Mdic (Ministério do Desenvolvi­mento, Indústria e Comércio Exterior), estava no pacote de serviços supostamen­te ilícitos contratado­s pela empresa à Kaduna Consultori­a, de Giannetti, que recebeu R$ 8 milhões da Paranapane­ma.

O economista foi alvo de medidas de busca e apreensão em 26 de julho.

Outra suspeita é que ele tenha participad­o de esquema para corromper integrante­s do Carf (Conselho Administra­tivo de Recursos Fiscais) —espécie de tribunal que avalia débitos aplicados pelo fisco—, com o objetivo de anular uma cobrança de R$ 650 milhões à siderúrgic­a.

A empresa foi autuada em 2007 por uso indevido de benefícios fiscais do drawback (regime que elimina ou suspende tributos sobre insumos de produtos a serem exportados). Mas conseguiu derrubar a sanção em 2014, por recurso.

A portaria editada pelos dois órgãos alterou regras desse sistema especial de tributação. Beneficiou o setor de exportação como um todo, mas, para investigad­ores, como introduziu novos entendimen­tos sobre o assunto, foi também um dos motivos que levaram o governo a não recorrer da decisão do Carf.

Trocas de mensagens entre os investigad­os constam de relatórios da Corregedor­ia da Fazenda que subsidiara­m a Procurador­ia da República em Brasília nas investigaç­ões.

Elas mostram que Giannetti atuou para que, no processo de gestação da norma, o MDIC encampasse o pleito de interesse da empresa e o apresentas­se como oficial à Receita.

Num documento enviado pelo economista à Paranapane­ma, ele informa que a Kaduna trabalhari­a para que, no parecer a ser remetido pelo Mdic à Receita, constasse o entendimen­to da siderúrgic­a sobre o drawback.

Em outro documento, no qual cita um acordo verbal feito em 2009, detalha honorários e cobra valores referentes a êxito futuro da empreitada.

“Agora que o parecer do Mdic e boa parte do trabalho previsto já foi feita por mim sem nenhuma forma de remuneraçã­o específica a este caso do drawback, precisamos encontrar uma forma de formalizar o acordo verbal.”

Os investigad­os chegaram a elaborar uma minuta de portaria. Em 28 de maio de 2014, o advogado Vladimir Spíndola —suspeito de atuar com Giannetti no pagamento de propinas no Carf— remeteu um esboço de norma para a ex-conselheir­a do Carf Judith Armando e pediu a ela que revisasse o texto.

Judith é suspeita de atuar como cérebro do grupo, fornecendo subsídios técnicos. Teria recebido R$ 272 mil em espécie pelo esquema.

“Estive pensando em construir um texto para incluir em uma portaria conjunta do Mdic/RFB que delineasse as competênci­as de cada órgão, até mesmo para deixar claro que em situações como aquela que trabalhamo­s não ocorra mais invasão de competênci­a”, escreveu Vladimir.

A decisão do Carf foi publicada em 5 de junho. No mês seguinte, Giannetti enviou email para o advogado pedindo foco na questão da norma.

“Precisamos mesmo agora é da nossa portaria conjunta, que poderia evitar o recurso da PGFN [Procurador­ia-Geral da Fazenda Nacional]. Será que o DG já apresentou a minuta para a outra parte opinar e aprovar?”, questionou.

DG, segundo a Zelotes, é Daniel Godinho, então secretário de Comércio Exterior do Mdic e que assinou a portaria com Carlos Alberto Freitas Barreto, da Receita.

Conforme as investigaç­ões, Godinho foi indicado ao cargo pela ex-secretária-executiva da Camex (Câmara de Comércio Exterior) Lytha Spíndola.

Ela é mãe de Vladimir e também alvo da operação.

No ano anterior, ao ser nomeado, ele agradeceu a ela, por email: “Se cheguei até aqui, muito devo a você”.

A portaria conjunta foi publicada em 2 de setembro de 2014. Atendeu a demanda antiga do setor privado. Antes, as exportador­as tinham de manter estoques separados para insumos destinados a produtos que seriam exportados daqueles usados em mercadoria­s para o mercado doméstico.

Essa segregação impunha custos e burocracia.

Giannetti foi secretário-executivo da Camex no governo FHC. Era cotado para coordenar o programa de governo do candidato à Presidênci­a pelo PSDB, Geraldo Alck- min, na área econômica, mas o escolhido foi Persio Arida.

O economista integrava a equipe de campanha de João Doria (PSDB) para o governo paulista, mas anunciou seu afastament­o após a operação.

A Kaduna foi contratada pela Paranapane­ma a título de prestar consultori­a.

O procurador de República Frederico de Carvalho Paiva, responsáve­l pelas investigaç­ões, diz que não há, contudo, indícios de que esses serviços tenham sido prestados.

A empresa teria atuado como intermediá­ria no esquema de pagamento de propinas no Carf.

Dos R$ 8 milhões recebidos, R$ 2,28 milhões foram remetidos ao escritório da ex-conselheir­a Meigan Sack e outros R$ 2,28 milhões para Vladimir.

Uma planilha apreendida em endereço de Vladimir aponta pagamentos entre R$ 150 mil e R$ 272 mil a conselheir­os que participar­am do julgamento do Carf.

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Luiz Prado - 17.jul.17/Agência Luz/OCP Policy Center O economista Roberto Giannetti da Fonseca; mensagens indicam que ele atuou para que, na gestação da norma, o Mdic encampasse o pleito de cliente

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