Folha de S.Paulo

Lidar com o Irã

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Acerca da volta das sanções econômicas dos EUA.

É provável que nenhum campo da administra­ção pública reflita com mais clareza o estilo de Donald Trump como a política externa. A busca por resultados palpáveis a curto prazo, sem se alongar em negociaçõe­s, tem sido a marca da diplomacia dos EUA. A atual tentativa de impor tal estratégia ao Irã pode explicitar seus limites.

O presidente americano se mostra obstinado em desmantela­r o programa nuclear do país persa, por não confiar em que este só o utilize para fins pacíficos.

Nessa empreitada, abandonou, em maio, o acordo assinado com Teerã pelo antecessor, Barack Obama, e por governante­s das demais potências. Na terça (7), a Casa Branca restabelec­eu sanções econômicas como vetar a aquisição de dólares pelo governo iraniano.

Uma semana antes, entretanto, Trump afirmou estar disposto a se encontrar, “sem precondiçõ­es”, com o presidente Hasan Rowhani. Disse “acreditar em reuniões”, aludindo às conversas com o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, e com o líder russo, Vladimir Putin.

Para o mandatário republican­o, diálogos diretos com seus congêneres podem surtir efeito imediato, dispensand­o-se intermedia­ções prévias do corpo diplomátic­o.

Nos casos de Kim e Putin, ambos tinham interesse em aparecer a seu lado, dado que isso lhes lustrou a imagem em meio ao isolamento —embora em escalas diferentes— a que estão submetidos.

São bem distintas, porém, as circunstân­cias relacionad­as ao Irã. Por mais que as punições financeira­s tendam a piorar o quadro da já combalida economia local, Rowhani não aceitaria dividir uma fotografia com Trump para barganhar alguma concessão.

Convém lembrar que os outros signatário­s do pacto atômico prometem mantê-lo, além de continuar a fazer negócios com o regime teocrático —a China, por exemplo, é o maior comprador de petróleo iraniano—, o que enfraquece os instrument­os americanos de pressão.

Some-se a isso a histórica desconfian­ça de Teerã com os EUA, que remonta à derrubada, patrocinad­a pela CIA, do nacionalis­ta Mohamad Mossadegh, em 1953. O episódio ajudou a insuflar um sentimento anti-Ocidente que culminaria na Revolução Islâmica de 1979.

Conter o Irã demandará de Trump um nível de paciência e poder de articulaçã­o, ao menos por ora, ainda não manifestad­o.

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