Folha de S.Paulo

Um ano após assassinat­o brutal, família enfrenta drama em casa

Mãe espera júri por morte de musicista, e violência doméstica traz disputa com pai

- Reprodução/ Facebook Silvia Frias

campo grande Há um ano, a musicista Mayara Amaral, 27, foi morta a marteladas, teve o corpo queimado e abandonado num matagal em Campo Grande, crime que causou comoção no país. O desfecho da história da irmã caçula ainda é de difícil assimilaçã­o para Pauliane Amaral, 32.

“Sempre espero que ela apareça, mande uma mensagem. No domingo, espero que venha almoçar, é uma coisa automática. Para mim, ela não foi embora, é tudo muito recente. Eu me pego esperando.”

A família também convive com outra espera igualmente angustiant­e: a do julgamento do baterista Luis Alberto Bastos Barros, 29, réu confesso, preso um dia depois do crime.

O processo tramita na 2ª Vara do Tribunal do Júri e está suspenso até que o réu seja ouvido novamente, no próximo dia 16. Atualmente ele está detido no Presídio de Trânsito de Campo Grande.

Mayara e Luis Bastos tinham um relacionam­ento e, no dia 25 de julho de 2017, haviam se encontrado em um motel da cidade. O rapaz deu três versões para o crime e, a última, adotada pela defesa, é a de que a matou a marteladas num momento de raiva, após discussão entre eles.

Depois, deixou o corpo em um matagal na rodovia MS080, região conhecida como Inferninho, e ateou fogo. Ele levou o carro dela e o vendeu.

Quando Mayara foi morta, Pauliane morava em Liège, na Bélgica, e só conseguiu voltar duas semanas depois. “Encontrei meus pais arrasados, minha mãe, catatônica, não tomava banho e não comia.”

Em meio à turbulênci­a decorrente do crime, viviam outro drama familiar. “Meu pai é alcoólatra e piorou muito depois da morte da minha irmã.”

Pauliane diz que, depois de mais um episódio de violência doméstica, ela e a mãe saíram de casa. A mãe, Ilda Cardoso, entrou com pedido de divórcio, além de obter medida protetiva contra o marido. “Parece que ela [Mayara] morreu para nos mostrar que não podemos nos subjugar a nenhum tipo de violência”, diz.

“Tanto eu como minha mãe nos tornamos mulheres mais fortes e que não aceitam isso”, afirma Pauliane. A reportagem procurou o pai de Pauliane, mas ele não respondeu.

Em setembro de 2017, o Ministério Público ofereceu denúncia sob a acusação de latrocínio contra Luis Alberto Bastos Barros. Porém o juiz Wilson Leite, da 4ª Vara Criminal de Campo Grande, declinou competênci­a e remeteu o processo para a 2ª Vara do Tribunal do Júri.

Para o magistrado, o caso se configurav­a como crime contra vida, não sendo o roubo um fator prepondera­nte.

Em outubro, a Promotoria recorreu da alteração de latrocínio para homicídio. Em maio, o recurso foi negado pelo TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e o processo começou a tramitar na 2ª Vara do Tribunal do Júri.

Luis Bastos passou a ser acusado de homicídio qualificad­o por feminicídi­o (violência motivada pelo gênero da vítima), motivo fútil e emprego de meio cruel, além dos crimes de furto e ocultação de cadáver. “Estamos de mãos atadas, esperando que a Justiça nos dê uma solução. É muito desgastant­e”, diz Pauliane.

No dia 2 de julho, ocorreu a primeira audiência de testemunha­s de acusação. Ela não estava em Campo Grande, mas conta que a mãe fez questão da presença do réu durante o depoimento.

“Ela queria dizer tudo olhando para ele, mas, em momento algum, ele sequer ergueu o rosto para olhar para ela.”

Houve uma segunda audiência, no dia 30 de julho, e o suspeito passou nesta terçafeira (7) por exame de sanidade. O réu será agora ouvido no dia 16 de agosto.

O advogado do réu, Conrado de Sousa Passos, afirma que a análise da sanidade será importante para atestar a linha da defesa, de que o rapaz estava sob efeitos de drogas, não sendo capaz de discernir a gravidade do fato. Além disso, exames anteriores mostrariam a instabilid­ade emocional de Luis Bastos, que iria internar-se para tratamento por dependênci­a química.

O advogado diz acreditar que será possível atestar a semi-imputabili­dade do réu, o que pode garantir a redução da pena, caso o juiz Aluizio Pereira dos Santos determine que o rapaz seja levado a júri popular. Essa definição será dada após as alegações finais da defesa e da acusação, ainda sem prazo previsto.

À espera do julgamento, Pauliane e a mãe dividem as lembranças da irmã. Os violões da musicista e outros itens pessoais foram levados pelo pai, quando ele foi obrigado a deixar a casa da família.

Agora, fazem parte da disputa judicial travada pelo casal na divisão dos bens, no processo de divórcio. A elas, restaram algumas fotos no computador e a bicicleta de Mayara.

Quando o caso for encerrado, mãe e filha planejam deixar Campo Grande. Enquanto isso, a mãe retomou os estudos e quer cursar psicologia. Pauliane terminou doutorado em letras e acompanha o andamento do processo.

No ano passado, ela denunciou que Luis Bastos estaria usando as redes sociais de dentro do presídio.

Segundo a Agepen-MS (Agência Estadual de Administra­ção do Sistema Penitenciá­rio em MS), um celular foi encontrado com o baterista.

Ele foi isolado em cela disciplina­r e punido com falta grave, o que pode aumentar o tempo de permanênci­a na prisão em caso de condenação.

“Parece que ela [Mayara] morreu para nos mostrar que não podemos nos subjugar a nenhum tipo de violência. Tanto eu como minha mãe nos tornamos mulheres mais fortes e que não aceitam isso Pauliane Amaral irmã de musicista morta

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Mayara Amaral, 27, que foi morta há um ano em Campo Grande

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