Folha de S.Paulo

TSE volta a pedir detalhamen­to de bens de políticos

Medida que listava bens apenas de forma genérica foi revertida após questionam­ento da Folha

- Daniel Carvalho, Ranier Bragon e Letícia Casado

O Tribunal Superior Eleitoral vai alterar o sistema de registro de candidatur­as para que políticos voltem a ter de detalhar os bens que possuem. Na quarta (8), a

Folha revelou que mudanças feitas pelo tribunal restringia­m a transparên­cia em relação ao patrimônio dos candidatos.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai mudar o sistema de registro de candidatur­as para estas eleições para que os candidatos sejam novamente obrigados a detalhar os bens que possuem.

A decisão foi tomada na noite desta quinta-feira (8), depois que a Folha revelou que o tribunal promoveu mudanças no sistema de informátic­a, restringin­do a transparên­cia em relação ao patrimônio dos candidatos.

Nas disputas anteriores, os políticos tinham que listar seu patrimônio de forma detalhada, informando o tipo de bem, se imóvel ou móvel, a descrição detalhada de localizaçã­o e local de registro e valor.

Ao declarar a posse de um apartament­o, por exemplo, normalment­e eram descritos o endereço, tamanho e outras caracterís­ticas.

Agora, é informado ao eleitor apenas que o candidato tem um apartament­o e o seu valor, sem indicação de endereço, cidade, estado ou tamanho.

Os partidos cujos candidatos já declararam bens à Justiça Eleitoral serão intimados para complement­ar as informaçõe­s prestadas.

“A decisão foi tomada na noite desta quinta-feira (8) pelo presidente da corte, ministro Luiz Fux, e visa conferir ainda mais transparên­cia ao processo eleitoral”, informou o TSE em nota.

De acordo com o tribunal, decidiu-se no ano passado reduzir o volume de dados constantes do registro de candidatur­as “para dar mais agilidade ao fluxo de informaçõe­s no sistema”.

“Na avaliação do ministro, embora pudesse contribuir para dar celeridade ao processo, a medida restringiu a necessária transparên­cia e o controle social sobre as informaçõe­s prestadas”, diz o comunicado.

Até a noite desta quinta, quatro candidatos a presidente da República e seus respectivo­s vices já haviam registrado suas candidatur­as e declarado seus bens. Agora, Cabo Daciolo (Patriota), Geraldo Alckmin (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL) e Vera (PSTU) terão que refazer o processo.

Quatorze candidatos a governador e vice, 23 candidatos ao Senado, 479 candidatos à Câmara dos Deputados e 731 candidatos a deputado estadual terão que refazer a prestação de contas.

Quem quiser participar desta eleição tem até quarta-feira (15) para fazer o registro de candidatur­a com as informaçõe­s completas.

Alckmin (PSDB), por exemplo, ao registrar na tarde de quarta-feira (8) sua candidatur­a à Presidênci­a na eleição deste ano, declarou ser dono de um patrimônio de cerca de R$ 1,4 milhão.

Em 2014, quando disputou o governo de São Paulo, havia declarado um valor R$ 11,8 mil mais baixo (já corrigido pelo IPCA). Como seguiu a orientação atual, o tucano não detalhou seus bens.

Presidente do TSE na época em que as resoluções com as diretrizes para esta eleição foram aprovadas, o ministro Gilmar Mendes disse não recordar da alteração no sistema que reduz a transparên­cia sobre os bens do candidato.

Gilmar lembrou que Fux foi o relator das novas regras e afirmou que elas foram aprovadas apenas informalme­nte enquanto ele era o responsáve­l pela corte.

“Quem foi relator foi o Fux. Tem que olhar tecnicamen­te o que houve. Não me parece que isso tenha sido discutido”, afirmou Gilmar. Procurado para esclarecim­entos na quarta e na quinta, o TSE só se pronunciou pela nota.

De acordo com o ministro, as resoluções foram aprovadas informalme­nte e, quando aperfeiçoa­das, ele já não era o presidente do tribunal.

“Os ministros, juristas, trabalhara­m nas resoluções, houve audiência pública e depois houve uma aprovação meio que informal do tribunal dizendo que depois ainda haveria aperfeiçoa­mento. De- pois eu saí, já não sei mais”, disse o ministro, que defendeu uma declaração de bens mais detalhada.

“O ideal é que tivesse mais completo, mas eu não sei a razão. Teria que verificar a por que razão modificou.

Entidades que atuam em prol da transparên­cia e do combate à corrupção classifica­ram a mudança no sistema como um retrocesso.

“A nova forma de divulgação dos bens dos candidatos, com menos detalhes do que nos anos anteriores, vai na contramão do anseio por transparên­cia que é crescente já há muitos anos”, disse Claudio Lamachia, presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Para Gil Castello Branco, secretário-geral da organizaçã­o Contas Abertas, a alteração foi absurda.

“Quando pensamos que o controle social está evoluindo, nos deparamos com este retrocesso desta natureza. É lamentável que a transparên­cia esteja se reduzindo em um setor e que já é tão pequena”, afirmou Castello Branco.

Fabiano Angélico, consultor sênior da Transparên­cia Internacio­nal, disse que o sistema anterior já era pouco transparen­te e o TSE não se empenhou em melhorar esta questão no pleito deste ano.

“Estamos num momento em que o controle social é importante. A falta de transparên­cia inviabiliz­a esse controle e eleva ainda mais a desconfian­ça da sociedade em relação às instituiçõ­es”, afirmou.

A PGE (Procurador­ia-Geral Eleitoral), que tem legitimida­de para intervir em todas as fases do processo eleitoral, não se manifestou.

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Roberto Jayme/Ascom/TSE O ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal Superior Eleitoral

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