Folha de S.Paulo

Não são apenas os juízes os privilegia­dos

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

No Brasil, se dá bem quem tem um lobby forte no Congresso. E não há categoria com um lobby tão bom como a dos advogados. O novo Código de Processo Civil ampliou os mimos oferecidos aos advogados. Eles agora têm caráter de crédito privilegia­do.

são paulo No Brasil, se dá bem quem tem um lobby forte no Congresso. E não há categoria com um lobby tão bom como a dos advogados.

Imagine, dileto leitor, que você está em seu canto, cuidando da sua vida sem fazer mal a ninguém e até produzindo algo de bom. Do nada, um louco inventa uma ação judicial contra você, obrigando-o a contratar um advogado para defenderse. Como o processo nunca passou de um delírio, você vence.

A chateação sofrida é um prejuízo que você vai ter de amargar, mas, para não incorrer também em perdas monetárias, o direito criou a figura dos honorários de sucumbênci­a, pela qual a sentença deveria condenar a parte vencida a pagar à parte vencedora os honorários advocatíci­os e outras despesas com as quais esta teve de arcar. Tudo muito justo.

Bem, essa era a situação preconizad­a pelo antigo Código de Processo Civil (CPC). Mas, em 1994, os causídicos conseguira­m que o Parlamento aprovasse a lei nº 8.906 (Estatuto da Advocacia), que transferiu a titularida­de dos honorários de sucumbênci­a da parte vencedora para seu advogado.

Não haveria nenhum problema se, com isso, os profission­ais do direito tivessem deixado de cobrar de seus clientes, ficando só com o pagamento imposto à parte perdedora. Mas é claro que isso não aconteceu, o que, na prática, priva o vencedor de ser integralme­nte ressarcido de seus prejuízos.

De 1994 para cá, a situação só piorou, porque foi aprovado o novo CPC que ampliou os mimos sucumbenci­ais oferecidos aos advogados. Eles agora têm caráter de crédito privilegia­do, valem também para a Justiça do Trabalho (onde não existiam) e são devidos até mesmo a advogados públicos. Isso, como mostrou reportagem da Folha, transformo­u recursos que iam para os cofres da União num suplemento salarial que tem variado em torno dos R$ 6.000.

A justa campanha contra os pendurical­hos no Judiciário deveria incluir a sucumbênci­a.

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