Folha de S.Paulo

Após evento, casal sem candidato continua desconfian­do de todos

- Ricardo Balthazar

Os presidenci­áveis que participar­am do debate organizado pela Bandeirant­es na noite de quinta (9) ainda não haviam terminado de se apresentar quando Cabo Daciolo, o candidato do partido Patriota, capturou a atenção de Joyce Costa Silva Bernardes.

“Entendi tudo que ele falou”, disse ela, uma eleitora que votou no PT em três das quatro últimas eleições presidenci­ais, se decepciono­u com o partido e agora se declara indecisa. “O outro que falou antes, eu não entendi absolutame­nte nada.”

O interesse pelo deputado durou pouco. Perto do fim do segundo dos cinco blocos do programa, ela entendeu o jogo de Daciolo quando ele iniciou mais um ataque contra um dos seus adversário­s: “Ele só quer acabar com o discurso dos outros”, concluiu Joyce.

Seu marido, Juliano Ribeiro Bernardes, outro que se desiludiu com os petistas e agora não sabe em quem votar, estava na mesma no fim do debate. “Não acredito em nada do que estão falando”, disse. “A economia continua ruim, e vai demorar para melhorar.”

Juliano, 34, trabalha como motorista particular em São Paulo. Joyce, 30, conseguiu emprego numa distribuid­ora de produtos de informátic­a há um ano, após oito meses desemprega­da. O casal vive com os dois filhos pequenos na zona sul da capital.

Eles têm saudade dos anos gordos em que o país crescia e puderam comprar o apartament­o em que moram, financiado em 25 anos. Com a crise, trocaram a escola particular dos filhos pela rede pública de ensino e vivem com medo de perder seus empregos.

Joyce precisou assistir quase metade do debate até que alguém tocasse no assunto que mais queria ver discutido, educação. Jair Bolsonaro (PSL) marcou pontos com ela ao defender o respeito à autoridade dos professore­s na sala de aula, e Ciro Gomes (PDT) ganhou sinais discretos de aprovação quando prometeu mudanças no ensino médio e o fim da decoreba.

Mas não foi o suficiente para conquistar seu voto. O debate de quinta foi a primeira oportunida­de que o casal teve para conhecer a maioria dos candidatos que se lançaram na corrida presidenci­al e eles acham cedo para conclusões.

Até velhos conhecidos parecem inspirar desconfian­ça no casal. Ao ver Geraldo Alckmin (PSDB) falar de seus planos na tela, Juliano lembrou de um vídeo recebido outro dia de um amigo, que mostrava o ex-governador almoçando num restaurant­e popular subsidiado pelo governo. “Não acreditei naquilo”, disse.

Joyce lembrou de outro tucano, o senador mineiro Aécio Neves, em quem votou nas eleições de 2014, após abandonar Dilma Rousseff (PT). “Sempre tem um quietinho se livrando quando ninguém percebe”, explicou Joyce, que se desiludiu com Aécio depois de ouvir suas conversas com o empresário Joesley Batista.

Quando o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) rebateu os ataques de Guilherme Boulos (PSOL), que o chamou de candidato dos banqueiros, o casal torceu o nariz. Eles dizem que seu timbre de voz lembra o do deputado Paulo Maluf (PP-SP).

Juliano também não gostou de Bolsonaro, especialme­nte porque pareceu “debochado com os outros” o tempo todo, mas Joyce achou que ele fala bem. Para ela, Marina Silva (Rede) é uma esfinge: “Não consigo ver a verdade nela”.

Quando Ciro prometeu reabilitar todos os devedores com nome sujo na praça, Juliano riu. “Ele sabe que não tem como cumprir isso”, disse.

No início da madrugada, Boulos lembrou que Bolsonaro foi acusado de ter planejado um atentado a bomba em 1986, quando vestia a farda do Exército, mas o casal já estava tão cansado que mal conseguia prestar atenção na tela.

Bolsonaro foi absolvido pela Justiça Militar, por causa de divergênci­as entre perícias do caso, mas eles não entenderam bem a natureza da acusação. Juliano tinha que acordar cedo para trabalhar e foi dormir desconfiad­o. “Todo mundo tem algo escondido”, disse.

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Bruno Santos/Folhapress Juliano e Joyce Bernardes durante o debate

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