Não queremos ser uma seita verde, diz vice de Marina
Eduardo Jorge entrou na campanha de Marina Silva na “prorrogação”, como ele mesmo diz. Dois dias antes do lançamento da candidatura da ex-senadora, o exdeputado e candidato ao Planalto em 2014 conseguiu unir seu partido, o PV, e a Rede.
O médico, vice na chapa, afirmou à Folha que a coligação mostrou capacidade de Marina de fazer composição.
Ex-petista, assim como a líder da Rede, ele critica o partido por seguir um oráculo — Lula, preso em Curitiba— e diz que a dependência do expresidente matou a democracia interna que havia na sigla.
O sr. defendia havia meses a aliança do PV com a Rede. Qual era o entrave?
Estou defendendo desde 2010, desde a separação. O partido já tinha fechado muitas alianças locais, nos estados, com PDT, PSB, PCdoB. A maioria da executiva queria a neutralidade na eleição presidencial.
O sr. foi contra a saída de Marina do PV e criticou a criação da Rede. Que avaliação faz hoje?
Eu sempre fui crítico dessa separação. Não me conformo que o movimento ambientalista, que já não é muito poderoso, ainda se divida.
Muitas pessoas dizem que o ambientalismo se diluiu dentro da Rede, em meio a bandeiras liberais, por exemplo. O sr. vê o partido de Marina como um verde? Isso é ótimo.
EDUARDO JORGE, 68
Filiado ao PV, é vice na chapa de Marina Silva (Rede). É médico sanitarista e servidor estadual em São Paulo
HISTÓRICO
• Foi do PT entre 1980 e 2003
• Ex-deputado estadual em São Paulo e federal
• Foi secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo nas gestões José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (então no DEM). Foi secretário municipal de Saúde de São Paulo nas gestões Luiza Erundina e Marta Suplicy (ambas à época no PT)
• Disputou a Presidência da República em 2014. Terminou em sexto lugar Nosso interesse é que a pauta se estenda para o lado socialista e para o liberal. Essa crítica que fazem à Rede e ao PV é equivocada. A gente não quer ser uma seita verde.
O que o sr. pensa que sua chegada agrega à candidatura?
Trouxe uma recomposição do movimento ambientalista brasileiro.
O sr. foi petista de 1980 a 2003. Como vê a dependência do PT em relação a Lula?
Uma coisa que compartilho com a Marina é que na redemocratização brasileira os dois partidos mais importantes foram PSDB e PT. Apesar das coisas boas que fizeram, são igualmente responsáveis pela crise atual. Mas os erros que tiveram não querem dizer que não tenham salvação.
Minha avaliação é que o Lula congelou, sequestrou o PT. O PT chegou aonde chegou porque sua grande força foi a democracia interna. Hoje quem manda são os caciques.
Lula virou um cacique? Ele é o cacique-mor. Isso está corroendo o principal patrimônio do partido, que era a democracia. É péssimo, é humilhante um partido que nasceu pela democracia, pela força da base, depender em tudo de um oráculo. Vão lá os sacerdotes Gleisi [Hoffmann], [Fernando] Haddad, consultar o oráculo. Aí saem de lá: “O oráculo falou isso, falou aquilo”.
Marina também é criticada por um estilo supostamente centralizador na Rede. Todas essas grandes lideranças, que têm uma história extraordinária, como o Lula, a Marina, têm esse, vamos dizer, poder magnético de atrair seguidores, fiéis. Mas o que eu acho é que a Rede, pela característica de jovens, de rebeldes que ela tem, eu acho que talvez precisasse até de uma organização maior, tão livre, tão liberal é a convivência entre eles. A Marina dá certa unidade, mas eu vejo o pessoal da Rede como jovens bastante rebeldes, sadiamente rebeldes.
O PV, como Marina, apoiou Aécio Neves (PSDB) no segundo turno de 2014 e até hoje é cobrado por isso. Éramos obrigados a escolher a Dilma ou o Aécio ou lavar as mãos. Comparando o compromisso ambiental do PT com o do PSDB, apesar de serem os dois partidos desenvolvimentistas, os governos do PSDB tinham mais compromisso. Nossa escolha foi racional.
Jair Bolsonaro, que disputa o eleitorado religioso com Marina, usou as redes sociais para dizer que o sr. é a favor da descriminalização do aborto e da maconha. Como viu esse ataque?
Ele está incomodado com isso? Ele está com medo da Marina, é? Do alto de seus 20%, ele está com medo dela? Nós temos divergência de opiniões, todo mundo sabe disso. Em alguns pontos nós não temos concordância, mas o que prevalece na campanha são as posições da candidata.