Folha de S.Paulo

Exército implanta bases para asfixiar garimpo em Roraima

- Leão Serva

O Exército iniciou, na segunda-feira (13), uma operação de combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena ianomâmi, em Roraima. Com 1.012 militares na selva, a ação tem por objetivo desbaratar áreas de intensa atividade de mineração e implan- tar duas bases fixas de vigilância no curso dos rios Uraricoera e Mucajaí, que servem de rota para as invasões.

A operação é iniciativa da Primeira Brigada de Selva, baseada em Boa Vista.

Às 15h, helicópter­os levantaram voo da capital do estado, levando soldados para dois núcleos de garimpeiro­s. Mais cedo, de manhã, barcos foram posicionad­os nos dois rios para impedir que embarcaçõe­s possam subir para áreas de garimpo ou descer em direção à capital.

Os dois grandes focos de garimpo ficam no rio Uraricoera e são chamados de Mutum (com cerca de mil trabalhado­res ilegais e aproximada­mente 40 mil m² de devastação já consolidad­a) e Brabinho da Iolanda (em uma área afastada do rio, o que permitiu que se alastrasse sem ser detectada em operações anteriores que usavam embarcaçõe­s).

As bases nos dois rios serão fixas, localizada­s em locais onde os dois rios têm uma calha só (na região há vários arqui- pélagos que criam vários canais, com rotas de fuga). Com isso, poderão vigiar e controlar o trânsito de barcos e monitorar a presença de aeronaves, impedindo o abastecime­nto da atividade ilegal nos dois principais eixos.

Um desses bloqueios é a comunidade indígena de Waikás, de índios da etnia Ye’kwana, às margens do rio Uraricoera; o outro ponto é junto à localidade chamada Baixo Mucajaí, onde há uma comunidade de Yanomamis. Nesses locais, o exército vai utilizar parcialmen­te infraestru­tura existente, postos da Funai e da Secretaria de Saúde Indígena, e equipament­os que estão sendo levados desde ontem.

A Folha esteve na comunidade de Waikás no mês passado e testemunho­u a presença ostensiva dos garimpeiro­s, inclusive monitorand­o com homens armados o movimento na pista de pouso usada pelos órgãos públicos na comunidade.

O rio Uraricoera é onde o escritor Mário de Andrade localizou o nascimento de seu personagem Macunaíma. Se nascesse hoje, o herói do romance teria no corpo traços de mercúrio além dos níveis considerad­os aceitáveis pela OMS (Organizaçã­o Mundial de Saúde), como acontece com os moradores de Waikás, pelo uso intensivo do metal pesado pelos garimpeiro­s.

Uma terceira base vai começar a ser implantada a partir de hoje, em um local chamado Serra da Estrutura. A área é de selva densa e habitada por um grupo de Yanomamis isolados. Nos últimos anos passou a atrair garimpeiro­s a poucos quilômetro­s da maloca dos isolados. Uma base da Funai nas proximidad­es foi desmobiliz­ada por falta de recursos em 2013, a floresta se regenerou.

Em 25 de julho, a Folha noticiou que um conflito entre índios isolados e garimpeiro­s teria deixado dois Yanomamis e um garimpeiro mortos. O comando da operação militar decidiu eliminar o foco de garimpo e preparar o centro de vigilância na área, para garantir o isolamento dos índios.

A operação contempla também ações pontuais em duas outras áreas de Roraima: no sudeste do estado, contra exploração ilegal de madeira; e em Pacaraima, no norte, principal ponto de entrada de refugiados venezuelan­os, para combater contraband­istas.

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Leão Serva/Folhapress Garimpo de Mutum no rio Uraricoera
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