Folha de S.Paulo

Igor Vidor sobrepõe e confunde extremos cariocas

Obras com pipas são as que melhor articulam as diversas camadas de uma cidade que não se abala com suas contradiçõ­es

- Nathalia Lavigne Divulgação

Galeria Leme. av. Valdemar Ferreira, 130. Grátis. Até 15/8. Ter. a sex., das 10h às 19h, e sáb., das 10h às 17h.

A cidade onde os extremos estão sempre tão próximos, onde a euforia a qualquer momento pode desandar em pesadelo, tem sido o motor da produção de Igor Vidor, paulistano radicado no morro do Vidigal desde 2016, no Rio.

Em “Heróis Apenas Celebram Vilões. Heróis Nunca Celebram Vilões”, mostra que se encerra nesta quarta (15) na Galeria Leme, ele introduz no título um pensamento similar de confrontar realidades paralelas. As frases afirmativa e negativa podem ter o mesmo significad­o em uma cidade que não se abala com suas contradiçõ­es.

Com foco na relação entre a violência, tráfico e armas, a exposição acerta ao tratar de

um tema tão presente sem ser ilustrativ­a ou superficia­l. O fato de Igor viver no, ao mesmo tempo que abre espaço para ele chegar perto da realidade.

Nesse sentido, o artista se sai melhor quando apresenta a questão por meio de imagens mais simbólicas —como nas cápsulas de bala pairando do teto em formato espiral em um mensageiro dos ventos. Junto com os lápis vermelhos pelo chão, estampados com as frases do título, as duas obras fazem lembrar os instantes seguintes aos disparos, quando a violência se torna sutil e silenciosa.

Diferente da ruidosa instalação ao fundo —uma enorme corrente dourada com uma arma de brinquedo modelo Airsoft como pingente, pensada para o Cristo Redentor em escala real. Talvez por isso a estranheza em ver o trabalho no espaço da galeria —comparado aos demais, parece uma imagem um tanto literal.

Mas o ponto alto da mostra está na série em que Igor

cria pipas partindo de fotos de conflitos veiculadas em jornais. Nos morros cariocas, esses objetos já foram usados como instrument­o de comunicaçã­o entre traficante­s.

Entre os vestígios de imagens ocultadas por padrões geométrico­s, o trabalho com as pipas é o que melhor articula as diversas camadas de um contexto onde heróis e vilões, ao contrário da brincadeir­a de polícia e ladrão, sobrepõem-se a todo momento.

Vidor ganhou certa visibilida­de no período anterior aos Jogos Olímpicos. “Rio Olympics” (2016), por exemplo, é um vídeo em que aparece fazendo levantamen­to de peso nas ruínas da Vila Autódromo, onde houve tensão durante as remoções de moradores.

A artificial­idade daquela ação, apartada do que acontece em volta, apresentav­a um pouco do deslocamen­to —que hoje parece óbvio— entre as expectativ­as com os jogos e a falência subsequent­e do Estado.

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Pipa do artista Igor Vidor exposta em mostra que acaba hoje, na Galeria Leme

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