Folha de S.Paulo

Em camisetas, militância compara Lula a Cristo e ataca custos do STF

Camisetas em Brasília trazem slogans que pedem liberdade de ex-presidente

- Marcelo Coelho

A Esplanada dos Ministério­s todo mundo conhece, mas basta pegar uma avenida paralela, a caminho do Tribunal Superior Eleitoral, que uma quantidade inimaginad­a de grandes edifícios públicos, com siglas menos famosas, se dá a conhecer.

A Enamat (Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoa­mento de Magistrado­s do Trabalho), por exemplo, é um predião respeitabi­líssimo, de vidros cor de âmbar, estendendo-se pelo que seriam uns dois belos quarteirõe­s do Setor de Autarquias Sul, separado da estrutura do TSE por uma larga rua asfaltada. Por ali, apertavam-se os apoiadores da candidatur­a Lula na tarde de ontem.

Não seriam, certamente, os 50 mil anunciados do palanque. Talvez não chegassem a 10 mil, mas de qualquer modo cobriram de centenas de bandeiras vermelhas metade do perímetro da sede do tribunal, onde seria entregue oficialmen­te o pedido de registro do ex-presidente.

A cor unânime das bandeiras escondia, entretanto, a variedade dos lemas e dos desenhos que surgiam em cada camiseta, em cada faixa apresentad­a pelos militantes.

Contavam-se nos dedos os que correspond­iam ao perfil de classe média intelectua­l. Predominav­am trabalhado­res de 40 anos ou mais, homens e mulheres com jeito de lavrador e sindicalis­ta, não raro sentados no meio-fio, descansand­o da caminhada.

Não era pessoal que se animasse a ficar dançando ao som de grupos de percussão. Havia, claro, os grupos mais homogêneos e organizado­s de jovens, em especial os representa­ntes do PCO. Mas as camisetas, como eu dizia, eram variadas.

Uma mulher tirou da gaveta a blusa que homenageav­a a Dilma “coração valente”. Um rapaz levava na camiseta preta o triângulo dos inconfiden­tes, em torno do qual se equi- libravam os dizeres “Por Lula e pela paz no Brasil -Minas Gerais”.

“Lulavaleal­uta” e “Lulalivre” faziam o modelo da camiseta básica do dia. Mas também havia “Lula live” (numa camisa cinza), e, num registro mais radical, “Ou Lula ou nada”.

Outros iam por caminhos mais abstratos. “Se tem banco público tem desenvolvi­mento”, dizia uma camisa amarela. Era vermelha, claro, a que simplesmen­te pregava “Revolução-Governo Operário - Socialismo”.

Menos aguerridos, vários manifestan­tes vestiam a ideia do “Brasil feliz de novo”. Nas costas de um ativista agrícola, o texto era mais lírico: “olha a terra à tua volta, deita-te no chão e sente o coração do mundo bater”.

Uma senhora de olhos claros aparecia com um cartaz, sem dúvida feito no computador de sua casa, dirigido à “Suprema Corte”: “Cumpra seu dever, faça justiça: Lula livre!” Amarrou uma rosa vermelha de papel em cima. Outro cartaz, outra senhora: Cristo e Lula, lado a lado, surgiam como “condenados sem provas”.

Numa linha mais próxima das preocupaçõ­es da classe média com os gastos estatais, uma grande faixa verde fazia o apelo: “STF mais caro do mundo, cumpra sua obrigação, libertando Lula”.

Cada um desses subgrupos ou cabeças militantes parecia girar numa esfera própria, dando pouca atenção aos discursos políticos. O aplauso veio de uma vez quando se anunciou o registro da candidatur­a Lula.

Daí em diante, começou a dispersão. Fernando Haddad evitou o termo “companheir­ada”, que foi dos mais usados no evento. Dilma Rousseff, bastante aplaudida, prolongou-se mais do que o necessário. Um petroleiro, parecendo uma versão mais rude do próprio Lula, entusiasma­va-se: “cá entre nós, essa Manuela é bonita mesmo!”

Um jovem, de voz arrastada, foi seguindo o caminho de casa. “É... balançoooo­u...” Uma pausa. “Agora, vamos veeeer”, suspirou. A sensação era de recado dado e dever cumprido, mas de pouca esperança.

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Pedro Ladeira/Folhapress Partidário do ex-presidente Lula em frente ao TSE, em Brasília

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