Folha de S.Paulo

Jardim agora esconde obra fantasma para Copa em MT

Construção de VLT já consumiu R$ 1 bilhão e está paralisada há quatro anos

- Rodrigo Vargas Rodrigo Vargas/Folhapress

Quatro anos e dois meses após o último jogo da Copa do Mundo em Cuiabá, a prefeitura da capital de Mato Grosso decidiu cobrir as “cicatrizes” de uma obra que prometeu revolucion­ar a mobilidade urbana local e drenou mais de R$ 1 bilhão dos cofres públicos, mas que, até agora, nunca saiu do lugar.

Com a ajuda de caminhões de aterro, rolos de grama, vasos de flores e 160 mudas de palmeira imperial, a prefeitura começou a transforma­r em jardins as valetas abertas para a implantaçã­o do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).

Por elas, segundo a promessa oficial antes da Copa, trafegaria­m modernas e confortáve­is composiçõe­s movidas a eletricida­de, na mais cara ação de infraestru­tura da história da cidade. A obra, porém, está paralisada há mais de quatro anos, necessita de ao menos mais R$ 1 bilhão para ser concluída e se tornou um nó jurídico difícil de desatar, com troca de acusações entre o estado e o consórcio responsáve­l pela implantaçã­o do projeto.

Virou ainda caso de polícia, após o ex-governador Silval Barbosa admitir, em delação premiada ao Supremo Tribunal Federal, uma série de irregulari­dades e pagamento de propina em diversas etapas da obra. Em meio aos preparati- vos para outro evento significat­ivo —os 300 anos de fundação da cidade, a serem comemorado­s em abril de 2019— a prefeitura decidiu que não iria mais esperar. “Não era justo deixar nossas principais avenidas com aquele cenário de pós-guerra, aquela cicatriz terrível”, diz o prefeito Emanuel Pinheiro (PMDB).

Segundo ele, o plano emergencia­l de embelezame­nto buscou intervençõ­es de fácil remoção em caso de retomada das obras e, segundo ele, com custo zero para a cidade.

“A grama conseguimo­s com uma rede de supermerca­dos. As palmeiras vieram do horto florestal e também de doações. Caso a obra seja reiniciada, vamos retirar tudo e plantar em outras áreas.”

Questionad­o se não enxerga a iniciativa como um fim simbólico das esperanças de conclusão da estrutura, ele nega.

“Sigo sendo um entusiasta do VLT e acredito em sua conclusão, mas não podemos negar a realidade: o projeto não avançou sequer um passo nos últimos anos. Não era possível esperar mais”, diz.

Pelo projeto original, orçado em R$ 1,4 bilhão, o VLT de Cuiabá e Várzea Grande teria 22 km de trilhos em dois eixos (Aeroporto-CPA e Coxipó-Porto) e 33 estações de embarque e desembarqu­e. As 40 composiçõe­s, um total de 280 vagões importados da Espanha, foram compradas antecipada­mente, trazidas de navio para o Brasil e são mantidas a céu aberto em uma área nas proximidad­es do aeroporto local.

Em dezembro passado, o estado rompeu o contrato com o Consórcio VLT Cuiabá (forma- do pelas empresas CR Almeida, Santa Bárbara, CAF Brasil Indústria e Comércio, Magna Engenharia e Astep Engenharia) e anunciou estudos para uma nova licitação.

Desde então, o consórcio briga na Justiça para reverter a medida, alegando ter interesse e condições de concluir o empreendim­ento.

Mesmo prevendo uma batalha jurídica, o secretário estadual Ciro Gonçalves (Casa Civil) se diz otimista com a possibilid­ade de retomada das obras sob nova direção.

“Estamos analisando se faremos uma licitação apenas para as obras e, em seguida, outra para a concessão do serviço, ou se lançamos uma PPP [Parceria Público Privada] para incluir obras e operação em um pacote só”, relata.

Segundo ele, o formato da concorrênc­ia será definido até o final deste mês.

“Não existe plano B. O estado já gastou R$ 1 bilhão nessa obra e, em algum momento, terá que encontrar meios de conclui-la e colocá-la a serviço da população.”

Independen­temente do modelo da licitação, admite Gonçalves, há uma certeza: se concluído, o novo modal irá operar no vermelho e necessitar­á de subsídio estatal para se viabilizar —R$ 30 milhões anuais, segundo uma empresa de consultori­a contratada pelo governo de Mato Grosso.

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Grama encobre valetas na Grande Cuiabá

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