Filme com pessoas sintetiza a melancolia do Ursinho Pooh
História ganha estofo com roteirista de ‘Spotlight’ e diretor Marc Forster, de ‘007’
O diretor Marc Forster (“007 – Quantum of Solace”) estava em um avião com a filha de seis anos. Entretida com o desenho do Ursinho Pooh no iPad, a menina pediu: “Por que você não faz um filme para mim? Todos seus filmes são sombrios e não posso ver nenhum deles”.
“Três anos depois, aqui estou eu”, diz Forster à Folha no lançamento de “Christopher Robin - Um Reencontro Inesquecível”, longa da Disney baseado nos amados personagens infantis criados pelo escritor A.A. Milne (1882-1956). “Criamos uma história original, algo muito difícil de encontrar neste mundo de sequências e adaptações.”
A ideia da produção que estreia nesta quinta (16), no entanto, é mais antiga. Desde que o produtor Brigham Taylor viu o ursinho falante de “A.I. – Inteligência Artificial”, em 2001, ele arquiteta a ideia de levar Pooh para o cinema. O conceito coincidiu com o sucesso da Disney ao transformar as animações como “A Bela Adormecida” e “A Bela e a Fera” em filmes com atores em carne e osso.
A transposição foi complicada. O cineasta independente Alex Ross Perry (“Rainha do Mundo”) foi contratado para escrever o primeiro tratamento do roteiro, há três anos. Mas o estúdio não gostou do resultado, que se concentrava na jornada do Ursinho Pooh em busca do seu amigo humano, Christopher Robin.
Tom McCarthy, ganhador do Oscar por “Spotlight ” (2015), lapidou o texto para Allison Schroeder (“Estrelas Além do Tempo”) melhorar o terceiro ato.
“Quando trabalhamos com grandes estúdios, os executivos podem achar que estão fazendo um filme, enquanto o diretor acredita fazer outro. Não deixei isso acontecer, porque seria um conflito”, diz Forster.
“Christopher Robin - Um Reencontro Inesquecível” virou uma história melancólica que pode se conectar diretamente aos livros de Milne: anos depois de abandonar o bosque, Christopher Robin (Ewan McGregor) enfrenta as dificuldades da vida adulta ao equilibrar trabalho e família.
“Ele é um homem desconectado por causa dos traumas da guerra e das suas responsabilidades como adulto”, diz McGregor. “Qualquer um que precisou passar um tempo longe da família para o bem da própria família vai se identificar com o filme.”
Um outro tipo de identificação, porém, prejudicou a carreira internacional do filme. “Christopher Robin” foi proibido na China porque, para driblar a censura, blogueiros costumam comparar a figura redonda do Ursinho Pooh com a do presidente chinês Xi Jinping. O estúdio, no entanto, diz que o banimento foi em razão do limite de filmes ocidentais impostos no país.
Marina Galeano
Virar gente grande não é fácil. Que o diga Christopher, amigo humano inseparável do ursinho Pooh. Depois de uma infância colorida e repleta de aventuras no Bosque dos Cem Acres, o garoto come o pão que o diabo amassou no novo filme da Disney.
Internato. Morte do pai. Convocação para a guerra. Rotina massacrante numa fábrica de malas. Falta de tempo com a família. Não há alegria que resista a tanto desconsolo em “Christopher Robin – Um Reencontro Inesquecível”.
Desbotado como muitos dias da vida adulta, o longametragem dirigido por Marc Forster —de “Em Busca da Terra do Nunca” (2004), “O Caçador de Pipas” (2007) e “Guerra Mundial Z ” (2013)— incorpora um tom meio sombrio, coisa rara nas produções vibrantes e graciosas do estúdio.
A começar pelos bonecos. Com cara de bichos de pelúcia surrados, os personagens criados pelo escritor inglês Alan Alexander Milne ganham contornos nostálgicos e melancólicos nesse live action (interpretado por atores) que tem jeitão de película antiga.
O comedimento de cores e de meiguice também se traduz numa trama mais densa e madura, que conversa com públicos de todas as idades.
Aos pequenos, está reservado o humor doce e ingênuo do urso amarelo (voz original de Jim Cummings) e de sua turma. Pooh, Ió (Bisonho), Leitão, Tigrão e companhia se encarregam de dar leveza à atmosfera carrancuda que paira sobre a história.
Já os adultos devem se reconhecer nos dilemas de Christopher Robin (Ewan McGregor), um homem engolido pelo trabalho, negligente com a mulher (Hayley Atwell) e com a filha (Bronte Carmichael), cujas lembranças felizes da época de criança ficaram trancafiadas em algum baú inacessível da memória.
E aí entra o tal reencontro inesquecível do título em português. Passados muitos anos, Pooh surge do nada em um jardim de Londres para ajudar o amigo a redescobrir os verdadeiros valores da vida.
Não deixa de ser uma jornada batida e previsível sobre amizade, família, resgate à infância, amor etc. Mas o entorno se apresenta tão cativante que compensa qualquer clichê. Realidade e fantasia em doses equilibradas.
A fotografia e a computação gráfica impecáveis completam o cenário no qual personagens cheios de camadas nos relembram que, apesar da névoa, “Christopher Robin” tem o selo da Disney.
Um filme encantador, alheio ao excesso de barulho e de ação, que se desenrola sem pressa, no ritmo de um conto aconchegante para ser ouvido antes de dormir, no quentinho das cobertas.
Sérgio Alpendre
No cinema de horror, geralmente os clichês são ainda mais evidentes, num jogo tácito com o espectador, que os respeita, e por isso costumam ser trabalhados com cuidado.
O caso de “Medo Viral”, contudo, é drástico. Trata-se de um longa-metragem inteiro em que só encontramos clichês, ao sabor dos sustos e das incoerências dos personagens, como também de uma trama que mais parece de uma sátira.
Dirigido pelos irmãos Abel e Burlee Vang, o filme se inicia com uma jovem garota chamada Nikki (Alexis G. Zall) sendo perseguida por uma entidade sobrenatural.
Depois conhecemos os cinco amigos de Nikki, todos num misto de lamento pela perda da amiga e vontade de investigar o que de fato aconteceu.
E diante da necessidade de dizer do que se trata o filme, sob o risco de provocar gargalhadas, arrisco: esses cinco amigos baixam um aplicativo em seus smartphones, e tal aplicativo, chamado “Bedeviled” (também o nome original do filme), desperta uma força maligna que os ameaça.
E aí é aquela história. Sabem que ficar sozinho é perigoso, mas sempre arrumam um jeito de se isolar, de preferência em uma casa escura, com sombras fáceis e janelas que mais parecem portas para outras dimensões.
E se tudo no filme é ridículo, imaginem quando surgem as brilhantes deduções desses jovens viciados em seus celulares. Nesses momentos o filme se torna uma paródia involuntária.
Ou seria tudo intencional desde o princípio? É o que indica o desfecho, e é o que muitos entusiastas do subgênero “terrir” vão alegar. E se assim for, é ainda pior, porque não há graça alguma.
E para encerrarmos com um clichê à altura de tudo que vimos, podemos dizer que “Medo Viral”, mais do que um filme de horror, é um horror de filme.