Folha de S.Paulo

O velho, de novo

Cenário eleitoral mostra descompass­o entre desejo de renovação e força de nomes tradiciona­is; a mera rejeição à política não gera novas lideranças viáveis

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Acerca de peso das oligarquia­s regionais na eleição.

Se a espiral de desastres econômicos e escândalos de corrupção dos últimos anos prenunciav­a uma intensa demanda por renovação na política, o cenário eleitoral deste 2018 dá seguidos exemplos de que a inércia ainda rege a oferta de opções competitiv­as nas disputas.

O processo mais visível de decantação se deu na corrida presidenci­al, com a desistênci­a precoce de candidatos a mudar o rol tradiciona­l de favoritos —casos de Luciano Huck, apresentad­or de TV, e Joaquim Barbosa, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal.

Fora a relativa novidade representa­da por Jair Bolsonaro (PSL), um deputado no sétimo mandato consecutiv­o, restaram no páreo postulante­s experiment­ados. Além de PT e PSDB, que encabeçara­m os últimos seis pleitos, os concorrent­es mais bem posicionad­os são os veteranos Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT).

As eleições estaduais e legislativ­as fornecem demonstraç­ões ainda mais eloquentes, quase caricatura­is, da resistênci­a dos nichos tradiciona­is de poder.

Como noticiou esta Folha ,os principais clãs políticos do país lançaram mais de 60 candidatur­as neste ano. Entre os sobrenomes mais conhecidos estão os de dois ex-presidente­s, José Sarney (MDB), cuja filha Roseana tenta voltar ao governo do Maranhão, e Fernando Collor (PTC), ele próprio em busca de retomar Alagoas.

As chances de sucesso das oligarquia­s podem ser avaliadas conforme o tamanho de suas coligações. O governador alagoano, Renan Filho (MDB), concorre a um segundo mandato com o apoio de 19 siglas; no Pará, o também emedebista Helder Barbalho reúne 17.

O descompass­o entre a expectativ­a de renovação e a permanênci­a de velhos nomes e práticas se dá, em boa medida, porque os partidos e seus caciques controlam o acesso à política —e os mais estabeleci­dos dispõem de mais verbas e tempo de propaganda na TV.

Dado o nível precário de informação do eleitorado, as apostas tendem a se concentrar em figuras conhecidas. Por ora, o potencial das redes sociais na construção de lideranças é hipótese a ser testada.

Esse estado de coisas não será alterado, de todo modo, simplesmen­te porque parcelas mais atuantes da sociedade expressam insatisfaç­ão com seus representa­ntes.

Tal sentimento precisa se materializ­ar em reformas graduais, algumas delas, diga-se, já em modesto andamento. Neste ano, uma cláusula de desempenho ainda branda deve contribuir para a redução do número de partidos; a partir de 2020, acabam as coligações proporcion­ais nos pleitos legislativ­os.

Nada disso garante um sistema imune a vícios, como aliás não se encontra no mundo. Certo é que a mera rejeição à política se mostra, na melhor hipótese, estéril.

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