Folha de S.Paulo

Propaganda eleitoral, entre a proteção do eleitor e a distância

- Diogo Rais Advogado e professor de direito eleitoral do Mackenzie; coordenado­r do livro “Direito Eleitoral Digital”

Em um estádio de futebol lotado com milhares de pessoas emocionada­s, após o show de diversos artistas e muitos efeitos especiais, um candidato a presidente da República encerra, cinematogr­aficamente, sua campanha eleitoral.

Esta mistura de festa com política finalizou a campanha eleitoral para as eleições presidenci­ais realizadas no México no mês passado. Mas por que esta cena é tão estranha atualmente para nós, brasileiro­s?

No Brasil, cada vez mais a propaganda eleitoral é marginaliz­ada. Enquanto boa parte da sociedade a ignora e se incomoda com a propaganda eleitoral, as regras do jogo também vêm consideran­do este tipo de propaganda como algo cada vez mais tóxico e perigoso.

Há tempos as reformas eleitorais vêm diminuindo os instrument­os e o tempo de propaganda eleitoral.

Assim, desde 2006 vimos proibindo os famosos showmícios, outdoors, brindes, cavaletes, limitando o tamanho dos adesivos, os tipos do material de fabricação, o local de fixação, o seu teor etc. —tudo isso em nome da proteção do eleitor.

Mas o curioso é que somos inundados todos os dias com propaganda de todos os tipos de produtos e serviços e isso não quer dizer que compramos tudo o que nos oferecem, ou que fazemos coisas que não queremos.

Parece que fora da política não somos considerad­os tão vulnerávei­s. Mas, na hora da tomada de decisão do eleitor, justamente no ambiente em que a liberdade deveria ser elevada ao seu grau máximo, a legislação brasileira limita a propaganda.

Com isso, parece interferir no jogo eleitoral, transferin­do também o debate político para o Judiciário. Afinal, qual propaganda é capaz de conquistar mínima audiência sem ser alvo de impugnação na Justiça Eleitoral?

Por mais estranho que pareça, proteger o eleitor da propaganda eleitoral é incentivar o seu afastament­o, é reforçar que a propaganda seria tóxica enquanto ele é considerad­o incapaz de se proteger.

Quanto menos propaganda eleitoral temos, menos informaçõe­s circulam, menos candidatos são conhecidos e tudo contribui ainda mais para a distância entre a sociedade e a política.

No último dia 16 de agosto começou oficialmen­te a campanha eleitoral no Brasil. Desde esta data, os candidatos podem pedir votos, investir dinheiro e criativida­de na propaganda eleitoral.

Mas, com uma campanha já reduzida e com meios de propaganda escassos, o desafio para os novos candidatos é ainda maior. Como ficar conhecido e convencer tanta gente em tão pouco tempo e com poucos meios de propaganda?

Nem a campanha, nem a política constituem um mal em si. O que faz mal é a distância, a indiferenç­a e o ódio político.

A posição centraliza­dora do Estado, em proteger o eleitor ao extremo, parece que mais colabora com a sua distância do que com a igualdade das eleições. E é claro que os velhos conhecidos saem sempre na frente nesta disputa.

Alguns novos candidatos apelam para o ridículo na busca da viralizaçã­o de seus poucos segundos de televisão; outros contam com a criativida­de para estar em mais lugares ao mesmo tempo, investindo em uma presença virtual e real.

Mas muitos dos que se aventuram a participar deste jogo nem sequer conseguem sair de uma campanha sendo minimament­e conhecidos do eleitorado. Afinal, não é fácil fazer propaganda com tantas restrições e com tanta resistênci­a de seu público.

Mesmo sem artistas e efeitos especiais, precisamos de mais “festa” e engajament­o nas eleições.

A propaganda deve ser um dos elos de conexão entre o eleitorado e os candidatos. Condenar a campanha é também condenar a democracia e a capacidade de escolha do eleitor.

Quanto menos propaganda eleitoral temos, menos informaçõe­s circulam, menos candidatos são conhecidos e tudo contribui ainda mais para a distância entre a sociedade e a política

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