Folha de S.Paulo

Porco sai da lama, vai para empórios, ganha pedigree e agora é nova tendência

- -Marcos Nogueira

Ele já foi sujo, feio e malvado. Mas o porco deu a volta por cima, saiu da lama e hoje ocupa posição de destaque no mercado das carnes especiais. Como ocorre com os cortes bovinos, é possível entrar em um açougue —perdão, boutique de carnes— e pedir porco de acordo com a raça do animal. São suínos com genética e manejo direcionad­os ao ganho de muita massa gorda. Com ênfase na gordura entremeada nas fibras musculares —o célebre marmoreio, que dá sabor e maciez. No modelo industrial, os porcos são criados para ter muita carne e pouca gordura. Bom para fazer presunto e salsicha. Para assar e grelhar, nem tanto. “A carne suína que chega fresca ao mercado é sobra da indústria de embutidos”, diz o pesquisado­r Élsio Figueiredo, da Embrapa Suínos e Aves. De certa forma, o mesmo se aplica às carnes de porco ibérico que chegaram recentemen­te ao Brasil, trazidas de Portugal pela importador­a Casa Flora. O porco ibérico —chamado de porco preto alentejano— é a matéria-prima do jamón pata negra, o tipo mais apreciado de presunto cru espanhol. Mas chamar essas carnes de “sobras” chega a ser ofensivo. São cortes de uma tonalidade rosa-escura, facilmente confundíve­is com bifes bovinos, de marmoreio uniforme. O preparo é o mesmo de um bife de chorizo: pouco tempero (sal basta) e fogo alto. Sirva ao ponto ou, de preferênci­a, malpassado. A gordura é o diferencia­l da carne ibérica. Seu sabor vem da alimentaçã­o dos porcos: bolotas, o fruto do sobreiro. E o também chamado “cerdo de bellota” é valorizado: tanto que a carne ibérica custa entre R$ 127 e R$ 327 o quilo. Os cortes, feitos sob encomenda pelo charcuteir­o espanhol Josep Llorens, fogem do comum —inclusive porque o pernil é destinado a virar jamón. Todos chegam congelados e assim são vendidos. Menos metido é o primo caipira do porco ibérico, o canastra. Descendent­e de suínos trazidos de Portugal para o Brasil Colônia, é criado em pequena escala no interior paulista e vendido pelo frigorífic­o Cancian, de Tietê. A carne, de sabor pronunciad­o, é encontrada em lojas de luxo como a Casa Santa Luzia. Mas nem sempre. “A partir de outubro devemos triplicar a produção”, diz o diretor José Aguinaldo Cancian. Projeto mais ambicioso é desenvolvi­do no sul do país com outra raça de origem ibérica, a moura. Criadores fizeram parcerias com a Embrapa e universida­des para multiplica­r a população de animais. “É o wagyu do porco”, diz o suinoculto­r Bernardo Fadel, de Bituruna, Paraná, que alimenta sua criação com pinhão da mata nativa. “Nossa ideia é criar uma demarcação geográfica para garantir preço mínimo”, diz. Hoje, a produção é muito reduzida e não chega a São Paulo. A carne de Fadel só é encontrada em um açougue de Curitiba —e em alguns produtos da salumeria paranaense Monte Bello. Se o moura é o wagyu, o duroc é o angus. Essa raça de origem americana, carne gorda e saborosa, é criada em escala comercial e compõe o mix genético dos porcos dos grandes frigorífic­os. O duroc é mais barato e fácil de achar. Em qualquer bom açougue —perdão, boutique de carnes—, você pode comprar bistecas para fazer seu churrasco suíno de pedigree.

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