Folha de S.Paulo

A hora de uma ideia

Programas de candidatos contemplam renda mínima

- Leandro Ferreira

Assessor do vereador Eduardo Suplicy (PT-SP), mestrando em políticas públicas na UFABC e membro da Rede Brasileira da Renda Básica de Cidadania

Semanas atrás circulou a informação de que Jair Bolsonaro (PSL) incluiu em seu programa de governo a perspectiv­a de implementa­r a renda mínima como forma de modernizaç­ão do programa Bolsa Família. A proposta alega vínculos com Milton Friedman, pensador liberal do século 20 que imaginava redução drástica de políticas sociais em torno de um único benefício pago diretament­e aos necessitad­os.

A comunidade internacio­nal que discute formas universais de garantia de renda é unânime em reconhecer a contribuiç­ão de Friedman para o chamado Imposto de Renda negativo, mas credenciam os primórdios da discussão sobre o direito à renda a pensadores anteriores a ele, como Thomas More, autor de “Utopia”, de 1516, e Thomas Paine, autor de “Justiça Agrária”, de 1797.

Ao redor do mundo, a pergunta que se faz em diversos países é: chegou a hora dessa ideia?

O processo eleitoral brasileiro nos dá algumas pistas. Além de Bolsonaro, que, ao se orientar por Friedman, deve restringir o programa aos mais pobres, já que o Imposto de Renda negativo complement­a a renda apenas de quem não atinge certos patamares, outras candidatur­as incorporar­am a ideia a suas propostas registrada­s no Tribunal Superior Eleitoral.

Parte dos planos importante­s ocupa-se do assunto. Marina Silva (Rede), há de se reconhecer, tinha a proposta em seu programa de 2014.

Seu vice, Eduardo Jorge (PV), estimulou a reedição em uma frase para que a renda mínima universal seja estudada.

Ciro Gomes (PDT) incorporou a proposta como renda mínima universal destinada a determinad­a faixa de idade.

Ele chegou a dar declaraçõe­s sobre um piso a partir do qual se iniciaria o regime de capitaliza­ção previdenci­ário, o que elevaria o valor do benefício, mas o restringe a grupos etários, tornando difícil avançar para o restante da população.

Quando se trata de transitar do Bolsa Família para uma Renda Básica de Cidadania, universal e incondicio­nal, Guilherme Boulos (PSOL) e Lula (PT) propõem que isso se dê nos termos da Lei 10.835/2004, originária de projeto do ex-senador Eduardo Suplicy (PT), figura inconteste quando se toca no assunto.

Ambos descartam corte de benefícios existentes. Fernando Haddad (PT) conhece a ideia em profundida­de. Quando prefeito de São Paulo, enviou projeto de lei para a Câmara Municipal de um programa do tipo para a cidade.

As diferenças conceituai­s entre renda mínima e renda básica podem ser exploradas em um momento mais apropriado, mas o sentido das propostas é de alargament­o de benefícios de caráter potencialm­ente universal.

A renda básica emerge como parte da efetivação da cidadania. A desburocra­tização e a ampliação da dignidade humana —hoje sequestrad­a pelo estigma da pobreza (de se comprovar pobre reiteradas vezes para receber alguma renda)— são ganhos evidentes no horizonte.

Poderemos perguntar ao próximo presidente, diante da diversidad­e de propostas de alguma forma de renda básica: Sr.(a) presidente, já não chegou a hora dessa ideia? Alguns candidatos parecem concordar que sim.

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