Folha de S.Paulo

Haddad vai jogar com a 13

Petista tem posição confortáve­l, mas precisa se mostrar viável contra Bolsonaro

- Celso Rocha de Barros Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universida­de de Oxford (Inglaterra)

Fernando Haddad é o candidato do Partido dos Trabalhado­res à Presidênci­a do Brasil e Manuela D’Ávila é sua candidata a vice. A confirmaçã­o da substituiç­ão definitiva dos nomes na chapa petista deve vir nos próximos dias, talvez nas próximas horas.

Todo mundo sabia que isso tudo aconteceri­a: você pode discordar das decisões de Moro e do TRF-4, mas, depois de elas terem sido tomadas, a inabilitaç­ão de Lula era inevitável.

Os petistas têm o direito de reclamar da rapidez incomum da decisão, mas ela provavelme­nte os beneficia.

A estratégia de manter Lula na disputa enquanto fosse possível revelou-se um sucesso. O PT ainda pode perder, mas é muito difícil imaginar que lançar outro nome desde o início teria deixado o partido em posição melhor do que está.

Lula se despede das eleições tendo dado um nó tático em adversário­s e comentaris­tas como poucas vezes se viu.

Mas havia o risco real de esticar demais a corda de sua candidatur­a e deixar Haddad com pouco tempo para se afirmar como candidato. Insistir até agora com Lula foi um ato de protesto. Insistir até o fim seria um teatro idiota.

As chances de Haddad e Manuela são boas. Lula tem quase 40% das intenções de voto. Não há motivo para duvidar que entre um terço e metade desses votos se desloquem para Haddad já no primeiro turno.

Ciro Gomes e Marina Silva serão adversário­s formidávei­s na disputa pelo eleitorado lulista, mas o apoio explícito de Lula é uma senhora vantagem. O PT é um partido mais estruturad­o do que o PDT ou a Rede. Terá apoio de governador­es importante­s, inclusive de direita.

E não é só isso: Haddad tem bem menos tempo de TV do que Alckmin, mas tem mais do que Ciro e Marina. Como mostra artigo dos cientistas políticos Felipe Borba e Emerson Cervi em 2017 na revista Opinião Pública, o efeito mais claro do horário de TV nas disputas presidenci­ais até hoje foi ajudar ultrapassa­gens entre candidatos oposicioni­stas. O horário eleitoral deve ajudar Alckmin, mas deve ajudar mais Haddad.

Haddad já entra em campo, portanto, como um dos favoritos para vencer a eleição presidenci­al.

Mas essa não é uma eleição normal. Para começo de conversa, estamos aqui discutindo o quanto um cara preso conseguirá transferir para um cara solto seu imenso favoritism­o. E isso não é, nem de longe, o mais esquisito sobre a eleição. O fator aberrante é Jair Bolsonaro. Bolsonaro não é um candidato normal. Não é possível ter certeza de que aceitaria uma derrota eleitoral, ou de que governaria democratic­amente.

A aversão inspirada por Bolsonaro da centro-direita para cá pode fortalecer quem se mostrar mais capaz de derrotar o doidão do Paulo Guedes e, pelo menos, garantir que haverá eleição em 2022.

Por isso, Haddad não pode se sentir confortáve­l com sua posição na largada —que é, repito, excelente—, mas precisa já se mostrar viável contra Bolsonaro no segundo turno. Mesmo quem preferir o petista pode votar em Ciro ou Marina se achar que Bolsonaro venceria o PT.

Para evitar esse cenário, o PT vai ter que ressaltar sua liderança na oposição a Temer enquanto já ensaia a moderação do segundo turno. A jogada até agora foi de craque, mas essa conclusão em gol não será fácil.

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