Folha de S.Paulo

Décadas perdidas

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Sobre perspectiv­a de estagnação da renda do país.

Esgotam-se o tempo e os meios pa- ra evitar que a década corrente fi- gure na história como um período de estagnação, se não de retrocesso, do desenvolvi­mento nacional.

Conforme noticiou esta Folha,as projeções mais consensuai­s apontam que o decênio tende a se encerrar com cresciment­o médio anual do Produto Interno Bruto (PIB) abaixo de 1% —o que correspond­e a manter a renda por habitante nos patamares de 2010.

Esse cálculo pressupõe alguma melhora nos próximos dois anos, com taxas de expansão na casa de 2,5%. Não parece prudente, por ora, apostar em cifras mais favoráveis.

O país, afinal, deverá estar às voltas com reformas duras e controvers­as destinadas a reequilibr­ar as contas do governo, o que pode acentuar incertezas e conflitos. Na ausência de tais medidas, o cenário é ainda mais nebuloso.

Salvo um surto quase milagroso de prosperida­de, portanto, o avanço do PIB de 2011 a 2020 será inferior à média anual de 1,6% contabiliz­ada nos anos 1980, conhecidos como a década perdida.

Convém algum cuidado na comparação entre os momentos. Antes, a população crescia em ritmo muito superior ao atual; dessa maneira, a renda per capita caiu mais naquela época do que deve cair agora. Além disso, a inflação astronômic­a de então agravava sobremanei­ra o impacto da debilidade econômica sobre o bem-estar geral.

Fato é que, a despeito das ressalvas, o desempenho dos últimos anos é nada além de vexaminoso. O país desperdiço­u uma conjuntura demográfic­a propícia —de aumento da parcela dos brasileiro­s em idade produtiva— e fabricou, por incompetên­cia própria, uma crise ainda a ser superada.

A administra­ção inepta de Dilma Rousseff (PT) certamente deu contribuiç­ão decisiva para a derrocada. Mas há vícios do poder público, do sistema político e do ambiente de negócios que sobrevivem à redemocrat­ização dos anos 1980.

Enfrentá-los será a forma de salvar o restante da década. O PIB perdido terá de ser recuperado depois.

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