Folha de S.Paulo

Liga Mundial de surfe fará etapa inédita em piscina com ondas ideais, na Califórnia

Modelo desenvolvi­do por Kelly Slater, 11 vezes campeão, cria ondas tidas como ideais por atletas

- Bruno Rodrigues

A busca quase utópica por mares em condições ideais levou o americano Kelly Slater, 11 vezes campeão mundial, a fabricar suas próprias ondas. A ideia deu certo, e agora a piscina montada por ele na Califórnia (EUA) receberá uma etapa da Liga Mundial de Surfe (WSL).

De quinta-feira (6) a domingo (9), os principais surfistas do mundo competirão na piscina do chamado Surf Ranch Pro, pela oitava etapa da temporada, a primeira da história com ondas artificiai­s.

A disputa no rancho de Slater é uma novidade aguardada desde a sua inauguraçã­o, em2015,apósnovean­osde desenvolvi­mento do projeto.

Inaugurada como um lago para esqui aquático, a piscina é uma parceria com Adam Fincham, pesquisado­r na USC (Universida­de do Sul da Califórnia) e especialis­ta em mecânica dos fluidos. Fincham, que cresceu na Jamaica, não sabia quem Slater era até o surfista contatá-lo, em 2006.

“Foi trabalho dele [Fincham] descobrir como fazer o swell [ondulação, formada por tempestade­s no mar], e era meu trabalho descobrir como quebrar aquele swell”, afirmou Slater em uma entrevista à revista Science.

Piscinas de ondas não são uma novidade e existem há 50 anos. Mas até a melhor delas, segundo os especialis­tas, não consegue se aproximar do que foi feito no Surf Ranch Pro, localizado no centro da Califórnia, a 175 quilômetro­s da praia mais próxima.

Funciona assim: uma lâmina de metal parcialmen­te submersa chamada “hydrofoil” corre a lateral da piscina, movimentan­do-se por um trilho com a ajuda de mais de 150 pneus de caminhão e cabos, atingindo cerca de 30 quilômetro­sporhora.

A lâmina faz movimentos de vaivém para os lados, primeiro empurrando a água para dentro e criando a onda, depois recolhendo a estrutura de metal, “recuperand­o” par- te da água que foi empurrada.

Esse processo cria o que os físicos chamam de sóliton, uma onda solitária que imita um swell individual no mar aberto. Isso é, uma sessão inteira, que pode durar até 50 segundos, oferecerá aos surfistas a possibilid­ade de várias ondas ideais e quase idênticas.

Com isso, alguns analistas do esporte acreditam que a piscina colocará ainda mais à prova a capacidade técnica dos atletas, que no mar aberto podem ficar à mercê das condições climáticas, decidindo baterias e etapas com ajuda da sorte e da boa leitura do mar por parte dos surfistas.

A elite mundial do surfe teve a oportunida­de de experi- mentar a piscina de Kelly Slater em setembro do ano passado, em um evento organizado pela Liga Mundial de Surfe e sem a cobertura da imprensa, mas montado em formato de competição. O brasileiro Gabriel Medina venceu a disputa masculina.

Stephanie Gilmore, seis vezes campeã mundial, ficou por 14 segundos dentro de um tubo, uma eternidade para os padrões do mundo do surfe.

“Não há desculpas. Não há mãe natureza. É só você”, disse Carissa Moore, norte-americana que venceu a etapa feminina do evento-teste.

A utopia transforma­da em realidade pode representa­r um passo importante para o esporte, que em 2020 estará na Olimpíada de Tóquio.

Com o Surf Ranch, as autoridade­s do surfe ganham argumentos para defender a continuida­de da modalidade no programa olímpico. Afinal, com uma piscina dessas, qualquer cidade, mesmo que não litorânea, estaria apta para receber o evento.

Pensando nisso, a WSL Holdings, empresa por trás da Liga Mundial de Surfe, comprou de Kelly Slater a piscina e, portanto, o modelo do projeto.

Empresário­s que trabalham com piscinas de ondas há décadas indicam que o Surf Ranch, pela complexida­de do sistema e pelo número de aparelhos mecânicos, não seria capaz de gerar lucro tão facilmente —a WSL Holdings não divulgou o valor de compra.

Por outro lado, os defensores alegam que a piscina não tem fim em si mesma ou em competiçõe­s de surfe.

A ideia é criar projetos imobiliári­os no entorno dessas piscinas, com hotéis e espaços de entretenim­ento.

Mas esse ainda é um sonho distante, ao contrário daquele dos surfistas profission­ais de surfar a onda perfeita. “Esse é o futuro”, declarou Medina, após vencer o evento em 2017.

“Kelly criou a onda perfeita quintessen­cial. E poder surfá-la repetidame­nte vai empurrar a barra do surfe para cima como nunca foi empurrada antes”, afirmou o surfista Gerry Lopez, de 67 anos, uma lenda do esporte.

O evento que se inicia nesta quinta será dividido em uma fase de qualificaç­ão e uma fase final. A primeira delas, qualificat­ória, terá três rodadas e reunirá 36 atletas no masculino e 18 no feminino.

Em cada rodada, os surfistas entrarão na água uma vez e surfarão duas ondas, uma com o pé direito à frente e a outra com o esquerdo.

No fim de cada rodada, os atletas terão surfado seis ondas cada um. A melhor sessão com o pé direito e a melhor com o esquerdo formam a soma final para a classifica­ção.

Avançam para a fase decisiva os oito melhores homens e as quatro melhores mulheres.

A rodada final será disputada como a anterior. Vence quem somar mais pontos.

A quatro etapas do fim da liga masculina de surfe, o Brasil tem o líder, Filipe Toledo, o segundo colocado, Medina, e o quarto, Italo Ferreira. A página do Facebook da WSL e o canal ESPN transmitem, ainda sem confirmaçã­o de horário.

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