Folha de S.Paulo

A ideologia e as soluções para a saúde suplementa­r

Debate sobre o setor deve ser feito de modo objetivo

- Marcio Serôa de Araujo Coriolano Presidente da CNseg (Confederaç­ão Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdênci­a Privada e Vida, Saúde Suplementa­r e Capitaliza­ção)

A filosofia clássica ensejou um debate, que perdura até hoje, apontando que a ideologia seria uma espécie de conhecimen­to às avessas. Esse debate parece estar ocorrendo hoje junto com as dificuldad­es enfrentada­s pelo sistema de saúde suplementa­r. São algumas tendências de pensamento que se revezam na mídia para condenar as supostas falhas insuperáve­is de um sistema que, na insuficiên­cia crônica do atendiment­o público, abriga hoje mais de 47 milhões de brasileiro­s.

O imbróglio na mídia é tamanho que chegou a envolver a mais alta dignitária da Corte Suprema em recente decisão desproporc­ional ao efeito da medida que se buscava. Antevendo o pior, a ANS, órgão regulador, recuou para anular a medida e reabrir consultas.

Esses estranhame­ntos infelizmen­te fazem parte de um Brasil hoje fragmentad­o em torno de interesses corporativ­os. A ideologia, figurando agora como um apanhado heterogêne­o de discursos autocentra­dos, atrapalha os debates democrátic­os e a convergênc­ia de ideias e providênci­as para tirar o país da situação que enfrenta.

Exemplo importante dessa fragmentaç­ão da discussão sobre os melhores caminhos para a saúde privada é a cortina de desconheci­mento que esconde a livre opção daquele 1/4 da população que quer assistênci­a médica digna. Ninguém a obrigou. Ao contrário, esse contingent­e de brasileiro­s que busca o abrigo dos seguros e planos de saúde só faz crescer, ainda que com um interregno provocado pelo desemprego, filho da recessão recente.

Enquanto a ideologia ganha terreno, a população beneficiár­ia assiste, preocupada, à virulência de um discurso que pretende ameaçar o benefício que eles, ou seus empregador­es, vêm sustentand­o com esforço.

É preciso desvendar o véu ideológico o quanto antes. O enfrentame­nto das dificuldad­es de compatibil­izar custos médicos e capacidade de pagamento precisa considerar que o sistema privado de saúde tem falhas, sim, mas para cuja solução devem se responsabi­lizar todos os elos da cadeia de valor da saúde.

As operadoras de saúde, hoje únicas responsabi­lizadas pelo aumento de custos médicos, são a ponta do iceberg. A base do bloco é formada pela extensa indústria de fármacos, materiais, equipament­os, dispositiv­os de implantes, diagnóstic­os, hospitais, clínicas, todos fora do alcance da regulação articulada do Estado.

Na ausência de um marco regulatóri­o que coordene essa diversidad­e de atores, e em presença de dificuldad­es que podem colocar em risco o provimento de serviços básicos que interessam os cidadãos, é oportuna uma ampla pactuação.

O que está em jogo não são as ideologias das partes, suas convicções sobre o papel do público e do privado, mas como dar continuida­de à reestrutur­ação do sistema público, com propostas e ações concretas, e como garantir a permanênci­a de um sistema privado que destina diariament­e R$ 750 milhões para procedimen­tos médicos e hospitalar­es que salvam e protegem brasileiro­s.

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