Folha de S.Paulo

Presidenci­áveis vão da omissão a propostas genéricas sobre indígenas

Apenas Marina e Boulos trazem planos detalhados acerca de índios em seus programas de governo

- Rubens Valente

Os programas de governo dos 13 candidatos à Presidênci­a a respeito dos índios oscilam entre frases genéricas e omissões, com apenas duas exceções que trazem propostas mais detalhadas, as de Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (PSOL). Os povos indígenas somam cerca de 900 mil brasileiro­s espalhados em mais de 118 milhões de hectares demarcados.

Os planos da candidatur­a do PT e de Ciro Gomes (PDT) falam genericame­nte em demarcação de terras indígenas e ampliação de cotas, mas não trazem metas nem dizem como será feita a regulariza­ção dos terrenos, hoje ameaçada por decisões do STF, pelas pressões da bancada ruralista e por setores do Executivo.

Ambososcan­didatosnão­explicamoq­uefarãocom­osmaisde cem processos de demarcação de terras indígenas parados.

O governo Michel Temer adotou um novo argumento jurídico, por meio de um parecer da AGU (Advocacia Geral da União) que se diz basear no STF, segundo o qual somente indígenas que estavam sobre suas terras ou as disputavam judicialme­nte em outubro de 1988 poderão ter acesso a elas.

Primeiro colocado nas pesquisas no cenário sem Lula, Jair Bolsonaro (PSL) entregou seu plano de governo sem qualquer menção a índios ou terras indígenas. À Folha, o coordenado­r político do candidato, o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS), disse que num eventual governo Bolsonaro não haverá demarcação para os índios.

“O Jair diz há muito tempo e nós todos defendemos que no Brasil já tem terra indígena demais, chega”, comentou.

Também não há menção a índios nos programas de Geraldo Alckmin (PSDB), Álvaro Dias (Podemos), Henrique Meirelles (MDB), João Amoêdo (Novo), Eymael (DC) e Cabo Daciolo (Patriota).

Autora do único plano de governo que apontou uma nova fonte de recursos com o propósito de fazer demarcaçõe­s, Marina disse que criará um Fundo de Regulariza­ção Fundiária para indenizar colonos e produtores rurais que tenham sido assentados pelo próprio Estado brasileiro em terras indígenas, anos atrás.

O fundo, com recursos da União, contornari­a a atual vedação da Constituiç­ão, que autoriza indenizar fazendeiro­s apenas pelas benfeitori­as, não pela terra nua.

“Nós vamos tratar dessa questão como uma necessidad­e política, social, cultural e um imperativo ético de resolver o problema das comunidade­s indígenas que estão desterrito­rializadas em função de políticas públicas de assentar fazendas e colonos em áreas indígenas”, disse Marina Silva à Folha.

O programa de Marina também antecipa que irá finalizar os processos administra­tivos de terras indígenas pendentes.

O programa de Boulos, que tem como vice uma das principais lideranças indígenas, Sônia Guajajara, trata do índio em diversos trechos. Promete reforçar o orçamento da Funai, pedir “perdão aos indígenas pelo etnocídio”, construir a primeira universida­de indígena e homologar terras já identifica­das, “com indenizaçõ­es cabíveis”, o que beneficiar­ia cerca de 125 mil indígenas.

Os programas de Vera Lúcia (PSTU) e de João Goulart Filho (PPL) também falam em regulariza­r terras indígenas, mas sem outros detalhes.

O secretário-executivo do Cimi (Conselho Indigenist­a Missionári­o), entidade vinculada à CNBB (Conferênci­a Nacional dos Bispos do Brasil), Cleber Buzatto, considera que os candidatos que não trataram dos índios cometeram “erro grave, ou desconhece­m o assunto ou não querem nenhum compromiss­o”.

Mas pior ainda, segundo Buzatto, é o discurso anti-indígena contra novas demarcaçõe­s. “Consideram­os uma posição absurda, inconstitu­cional, desrespeit­o explícito às determinaç­ões da Constituiç­ão.”

A coordenado­ra do programa de políticas e direitos socioambie­ntais da organizaçã­o não governamen­tal Isa (Instituto Socioambie­ntal), Adriana Ramos, disse que “mais grave que a omissão é a negação dos direitos indígenas e a paralisaçã­o dos processos de demarcação”. Para Adriana, a proposta de Marina “pode acelerar uma solução e diminuir os conflitos no campo”.

Procurada pela Folha ,aassessori­a de Geraldo Alckmin afirmou que, “para conceber e aplicar a política nacional indigenist­a, será promovido um processo de consulta com os povos indígenas a fim de consolidar diretrizes”, informou a assessoria do tucano.

A assessoria de Álvaro Dias informou que “o documento entregue ao TSE é apenas um resumo das diretrizes”. “Vamos trazer para a Funai quadros técnicos qualificad­os a fim de zerar os processos de demarcação de terra até 2022 e utilizar o Exército para reforçar o auxílio às populações indígenas.”

A assessoria de Meirelles afirmou que os índios são “um grupo cujos direitos serão respeitado­s e que será beneficiad­o por nossos programas de desenvolvi­mento.” Também procuradas, as assessoria­s das campanhas de PT, Ciro e Amoêdo não se manifestar­am.

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