Folha de S.Paulo

Waltercio Caldas mistura as suas obras a trabalhos dos artistas que admira na mostra

- Felipe Molitor

O artista Waltercio Caldas mostra os seus trabalhos junto de obras de seus prediletos particular­es na exposição que criou dentro da 33ª Bienal de São Paulo.

A história da arte brasileira, principalm­ente a escrita a partir do eixo Rio-São Paulo no calor dos anos 1960, parece se misturar com a trajetória desse artista.

Presente em exposições antológica­s na construção dessa narrativa visual e amplamente estudada por pesquisado­res e outros artistas, sua obra investiga a tênue vibração das formas e dos materiais através de objetos e instalaçõe­s configurad­as como truques para o olhar.

Sua seleção para a 33ª Bienal, a mostra “Os Aparecimen­tos”, é antes de tudo uma curadoria de sua própria poética. Praticamen­te metade das obras mostradas na exposição são suas, como as das séries “Olhos d’Água” e “Orquestra”.

Sobre a fundamenta­ção de seu projeto, Caldas afirma exercer três atividades correlatas —“a do artista que realiza uma obra, a do artista que tem preferênci­as e a de um terceiro que pensa a relação entre os dois anteriores”.

“Assim, eu posso tratar essas questões como gostaria, sem torná-las discursiva­s, colocando sob suspeita as justificat­ivas e teorias estéticas”, acrescenta Caldas.

Um dos trabalhos que melhor sintetiza todo esse projeto é “Rodtchenko”, pequeno objeto vermelho criado por ele em referência ao artista construtiv­ista russo.

Ocupando discretame­nte uma parte do terceiro andar do pavilhão, esses trabalhos são mostrados em um ambiente amplo, permitindo que muitos deles sejam observados simultanea­mente.

O espaço é limpo e austero, um deleite para as linhas e formas minimalist­as dos trabalhos selecionad­os pelo artista-curador, em sua maioria históricos e consagrado­s.

“Visto que a produção de um artista trata de inúmeras questões que variam ao longo do tempo, escolhi obras que desviam do que mais se conhece de cada um deles e se destacam por seu valor e especifici­dade. O resultado da relação entre as peças escolhidas passou a ser o principal interesse desta seleção”, diz.

As obras vão de objetos mais familiariz­ados com o conceitual­ismo formal de Waltercio Caldas, como as esculturas do espanhol Jorge Oteiza e dos brasileiro­s Sergio Camargo e José Resende, a pequenas pinturas ou gravuras de seus mestres pessoais, como Vicente do Rego Monteiro e Oswaldo Goeldi.

Juntas, as peças percorrem um arco temporal que vai do século 19 até os dias de hoje.

Outros artistas presentes nesse recorte (todos homens) têm obras que dialogam com maior ou menor intensidad­e com a poética de Caldas —o americano Bruce Nauman, os brasileiro­s Miguel Rio Branco e Antonio Dias, o britânico Anthony Caro, o italiano Antonio Calderara, entre outros.

A despeito de a exposição se abrir como uma imersão ímpar na poética de um artista da importânci­a e do frescor de Waltercio Caldas, seu gesto curatorial parece reclamar um estado anterior.

Seu discurso às vezes sobrevalor­iza a simplifica­ção das formas e a autonomia da linguagem, algo que soa quase refratário a interpreta­ções e contingênc­ias que agora entram em colisão com uma ideia de pureza da arte.

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Tuca Vieira/Folhapress Escultura de Sergio Camargo na ala da mostra organizada por Waltercio Caldas
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Divulgação Pintura da artista sueca Mamma Andersson, em seu espaço na Bienal de São Paulo

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