Folha de S.Paulo

Promessas de Alckmin

- Matias Spektor Professor de relações internacio­nais na FGV. Escreve às quintas

A campanha de Geraldo Alckmin produziu a mais ambiciosa plataforma de política externa deste ciclo eleitoral.

A proposta envolve dobrar o espaço do comércio exterior na composição do PIB (Produto Interno Bruto). A medida é revolucion­ária, pois seria a adrenalina necessária para reverter a trajetória da produtivid­ade brasileira, que hoje condena a sociedade ao atraso.

Nas contas do Banco Mundial, daria para tirar uns 6 milhões de cidadãos da pobreza.

Acontece que uma reviravolt­a dessa natureza golpearia aqueles grupos de interesse que vivem das rendas fáceis do protecioni­smo. Ou seja, o governo teria de ir para guerra.

Não surpreende que o sonho tenha durado pouco. A tinta mal havia secado no papel da campanha quando a candidata a vice na chapa do tucano explicou à GloboNews que não haverá abertura radical coisa alguma.

Diante das câmeras, Ana Amélia expôs com orgulho seu compromiss­o com a proteção seletiva que é marca registrada de nosso modelo econômico. É compreensí­vel, portanto, o avanço de Bolsonaro, munido pelas ideias de Paulo Guedes, e de João Amoêdo pelo campo liberal, que de outra forma escolheria Alckmin para presidente.

A plataforma ainda promete levar o Brasil à OCDE e redobrar a aposta em compliance diante de normas globais de corrupção e transparên­cia. O que isso significa na prática a plataforma não diz.

Por fim, a campanha promete ativismo diplomátic­o no combate ao tráfico de drogas e de armas. Mas como?

É aqui onde o eleitor fica mais perplexo. Em entrevista ao Jornal Nacional, Alckmin negou reiteradam­ente que lideranças encarcerad­as do PCC exerçam autoridade fora dos presídios. Vá lá, todo candidato fala algumas inverdades. Mas neste quesito o problema é grave porque o eleitor precisa saber o que o ex-governador acha de fato sobre o tema.

Quando a mensagem sobre segurança não parece crível, esse eleitor migra para Bolsonaro.

Alckmin sabe que o crime transnacio­nal representa nossa maior ameaça externa. Também sabe que o PCC goza de presença física na Bolívia e no Paraguai, além de uma rede articulada no restante da América do Sul, na África e na Europa.

O que não está claro é se ele entende que isso é produto da recente hierarquiz­ação do crime no Brasil e que esse processo, por sua vez, resulta da ordem paralela no sistema prisional.

Campanha eleitoral é impostura, dizia Paulo Francis. Os candidatos prometem coisas que nenhuma pessoa informada leva a sério.

Alckmin acaba de apresentar aos eleitores uma plataforma externa nominalmen­te arrojada. Seu desafio, agora, é sinalizar direito que seu compromiss­o com essa agenda não é papo barato para se eleger.

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