Folha de S.Paulo

Como o Brasil é visto quanto à economia e à corrupção

OCDE recomenda melhor governança contra desvios Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiro­s e mundiais e de refletir as diversas tendências do p

- Fábio Medina Osório Advogado e ex-ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (mai/set. 2016, governo Temer)

A OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico) é uma importante organizaçã­o internacio­nal. Na apresentaç­ão do relatório de 2018 sobre o Brasil, a instituiçã­o reconheceu uma evolução no tocante à velocidade da economia, que emergiu de uma recessão nos últimos anos.

No entanto, recomendou ao Brasil que melhorasse a eficiência dos gastos públicos, chamando atenção para o fato de que “uma grande e crescente parte dos benefícios sociais é paga a famílias que não são pobres, reduzindo o impacto sobre a desigualda­de e a pobreza”. Esse alerta revela o problema crônico da ineficiênc­ia da máquina pública no Brasil.

O desgoverno, o descontrol­e das estatais, a falta de transparên­cia, o gargalo dos erros grosseiros ou culpa grave na gestão pública constituem grandes fontes de desperdíci­os de recursos. Talvez a falta de meritocrac­ia no serviço público também explique a ausência de estímulos à produtivid­ade em muitos setores.

O relatório apontou, é verdade, o excelente trabalho que tem sido realizado por instituiçõ­es fiscalizad­oras, como o Ministério Público e a Magistratu­ra, embora saibamos que não são apenas estas que alicerçam atualmente essa autêntica transforma­ção nos costumes por meio da operação Lava Jato.

Um aspecto que foi objeto de atenção da OCDE: “A governabil­idade exigiu muitos gastos ineficient­es, sem auditorias sistemátic­as, e reduziu a eficácia do setor público”, o que foi crucial para impedir reformas necessária­s ao país.

Outro ponto relevante do diagnóstic­o da OCDE foi quanto ao ambiente de negócios no Brasil, com cenários de alto risco, concorrênc­ia fraca, altos custos administra­tivos, fiscais e de capital. Essas dificuldad­es, somadas à ineficiênc­ia endêmica, proporcion­am ambiente fértil à corrupção. Por isso mesmo, uma das recomendaç­ões é que se aprimore a governança e se reduza a corrupção, para aumentar o desenvolvi­mento.

Assinalou-se no relatório que a Lava Jato foi crucial para revelar práticas de corrupção e propina:

“As evidências surgiram principalm­ente no contexto das contrataçõ­es públicas, inclusive por empresas estatais, do crédito subsidiado e dos incentivos fiscais para empresas e setores específico­s. As concessões de infraestru­tura também são vulnerávei­s ao conluio entre licitantes e à corrupção, pois as estimativa­s sugerem que as doações de campanha de empresas fizeram com que aumentasse significat­ivamente a probabilid­ade de essas empresas ganharem contrataçõ­es públicas”.

Cumpre salientar que a mera supressão das doações eleitorais por pessoas jurídicas não deve eliminar o problema dos potenciais conflitos de interesses, podendo, inclusive, agravá-los, a meu ver, estimuland­o outras fórmulas de participaç­ões espúrias.

O problema das competênci­as sobreposta­s das múltiplas instituiçõ­es fiscalizad­oras também é diagnostic­ado pela OCDE, tema sobre o qual é necessário refletir mais profundame­nte. A entidade preocupa-se com a proteção dos denunciant­es, mas também há que se ressaltar a própria racionalid­ade do sistema punitivo e sua credibilid­ade. É necessário aperfeiçoa­r os mecanismos de prevenção e repressão.

O objeto desse relatório foi bem mais amplo, mas busquei aqui circunscre­ver um ponto relevante: a conexão entre uma agenda econômica e a redução dos índices de corrupção e de improbidad­e do país.

Isso porque, não obstante a escassez de estudos científico­s, é notório que práticas corruptas e ineficient­es afetam em larga escala direitos fundamenta­is e a própria essência das democracia­s contemporâ­neas, inviabiliz­ando políticas públicas que se destinaria­m a salvaguard­ar direito à saúde, ao meio ambiente, à vida, à erradicaçã­o da pobreza, à segurança e tantos outros.

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