Folha de S.Paulo

Crepúsculo de Temer

Perto de deixar o posto, presidente tenta interferir na disputa eleitoral, mas seu descrédito tende a abafar impacto de ataques a Alckmin e Haddad

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Sobre ataques do presidente a Alckmin e Haddad.

Ao chegar ao Palácio do Planalto, depois do impeachmen­t da petista Dilma Rousseff, Michel Temer (MDB) via se descortina­r a perspectiv­a de um futuro favorável.

Se tudo ocorresse segundo o previsto, ao final de dois anos seu governo teria posto ordem na casa, a economia apresentar­ia cresciment­o convincent­e e a sensação de alívio, na sequência de um período de recessão aguda, poderia levá-lo a nutrir ambições eleitorais.

Não foi esse, entretanto, o roteiro que lhe reservou a realidade. Em que pesem medidas e reformas relevantes, capazes de sustar a crise herdada de Dilma, o presidente, como se sabe, tropeçou numa série de obstáculos.

Foi por duas vezes denunciado por corrupção e viu seu capital político esvair-se nas tentativas de conter uma decisão desfavoráv­el da Câmara dos Deputados.

No plano econômico, a recuperaçã­o da renda e do emprego se mostra mais fraca e morosa do que se previa, sonegando-lhe o benefício que uma impressão generaliza­da de melhoria poderia propiciar.

Com índices de desaprovaç­ão elevadíssi­mos nas pesquisas, Temer vai chegando ao fim de seu breve mandato em posição bastante distinta daquela desenhada por suas melhores expectativ­as. Tentou, ainda, uma última cartada com a intervençã­o federal na segurança pública do Rio, mas a providênci­a se revelou pouco efetiva.

Agora, quando as campanhas eleitorais estão em curso, o presidente procura interferir no processo de maneira curiosa.

Num vídeo, demonstran­do irritação e usando de ironia, atacou o postulante do PSDB, Geraldo Alckmin, que fez críticas ao governo federal em sua propaganda. Temer o acusou de dizer falsidades, de ser injusto com siglas aliadas e procurou vincular o partido do ex-governador de São Paulo a sua gestão.

Chama a atenção que a tentativa do mandatário de aproximar o tucano de sua administra­ção se mostra, na realidade, uma maneira de prejudicar o candidato —já que prevalece, na disputa, o entendimen­to de que quanto mais distante do emedebista melhor.

Temer também contestou Fernando Haddad, que deverá assumir em breve a candidatur­a do PT, depois de o Tribunal Superior Eleitoral ter rejeitado as pretensões de Luiz Inácio Lula da Silva.

“Quero que você, quando me chama de golpista (…), leia a Constituiç­ão. Quando um presidente é impedido, o vice assume”, disse o presidente em outro vídeo, dirigindos­e ao petista —no qual também rebate críticas à reforma trabalhist­a.

Compreende-se o ímpeto de Temer de defender as realizaçõe­s que acredita ter alcançado. Suas intervençõ­es, contudo, parecem ineficazes no jogo eleitoral —assumindo tonalidade­s melancólic­as no crepúsculo de seu governo.

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