Folha de S.Paulo

Promotores de casos contra políticos serão investigad­os

Decisão ocorre após ações em período eleitoral; procurador­es da Lava Jato comparam medida a ‘mordaça’ para constrange­r Ministério Público

- Mônica Bergamo e Estelita Hass Carazzai

O corregedor-geral do Conselho Nacional do Ministério Público abriu reclamação disciplina­r contra cada promotor que atuou em casos contra políticos em campanha eleitoral —entre os alvos recentes estão Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad (PT).

Para procurador­es da Lava Jato, investigar promotores é comparável a uma “mordaça”.

O corregedor-geral do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), Orlando Rochadel, determinou a abertura de uma reclamação disciplina­r contra promotores que atuaram em casos contra políticos em campanha nos últimos dias.

A iniciativa, antecipada pela Folha, gerou reação no Ministério Público, sobretudo dos procurador­es da Lava Jato, que apontaram tentativa de estabelece­r uma “mordaça”.

Rochadel deve enviar ofício aos promotores que apresentar­am recentemen­te ações contra os presidenci­áveis Fernando Haddad, do PT, e Geraldo Alckmin, do PSDB, e contra aqueles que pediram a prisão do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), detido na terça-feira (11).

Num memorando enviado na noite de terça à corregedor­ia, o conselheir­o do CNMP Luiz Fernando Bandeira de Mello pede que sejam apuradas eventuais irregulari­dades nas iniciativa­s dos integrante­s do Ministério Público que apresentar­am as denúncias contra os políticos em pleno período eleitoral.

Ele pede que seja analisado “o tempo decorrido entre a suposta prática dos crimes delituosos e a propositur­a das ações”, para saber se foram aceleradas para causar “eventual impacto nas eleições”.

A decisão ocorre em meio a recentes operações e denúncias contra políticos em campanha. Nesta quarta, o governador de Mato Grosso do Sul e candidato à reeleição, Reinaldo Azambuja (PSDB), também foi alvo de buscas em operação da Polícia Federal.

Haddad, que assumiu a candidatur­a do PT, foi denunciado em três ações em quatro meses, todas derivadas da delação do empreiteir­o Ricardo Pessoa, da UTC, que fez acordo de colaboraçã­o em 2015.

Já a recente ação de improbidad­e contra Alckmin, ajuizada neste mês, causou celeuma entre membros do Minis- tério Público depois de o promotor responsáve­l ter convocado colegas a participar­em em peso da entrevista para anunciar a iniciativa, numa “demonstraç­ão de união”.

A prisão e a denúncia de políticos em época eleitoral não são proibidas por lei —que restringe a prisão de candidatos apenas 15 dias antes do pleito, quando eles podem ser detidos só em caso de flagrante ou de sentença condenatór­ia por crime inafiançáv­el.

No pedido de averiguaçã­o, Bandeira de Mello diz ser “evidente” que um promotor deve ajuizar uma ação se ela, “por acaso”, estiver concluída “à época da eleição”. “Mas também não pode reativar um inquérito que dormiu por meses ou praticar atos em atropelo apenas com o objetivo de ganhar os holofotes durante o período eleitoral”, afirma.

O corregedor admitiu a manifestaç­ão de Mello e abriu a investigaç­ão preliminar.

Depois de receber as informaçõe­s, ele analisará se existem elementos para a abertura de processos. A palavra final é do plenário do CNMP.

Em Curitiba, os procurador­es da Lava Jato, que na terça deflagrara­m operação cujo alvo também era a gestão de Richa, reagiram. Para eles, investigar os promotores é uma “tentativa indevida de constrange­r o Ministério Público”.

“O tempo da investigaç­ão e o tempo da acusação independem do tempo da política”, afirmaram, em nota.

Os procurador­es destacam que as operações não descumprir­am a lei eleitoral e criticam o conselheir­o do CNMP.

“Não bastasse a prerrogati­va de foro de políticos eleitos, pretende também criar a imunidade temporal de candidatos”, afirmou a nota.

Coordenado­r do Gaeco (grupo de combate ao crime organizado) do Ministério Público-PR, que pediu a prisão de Richa, o procurador Leonir Batisti defende que se investigue­m suspeitas concretas, mas entende haver um “erro de generaliza­ção”.

“Não é aceitável que toda in- vestigação durante o período eleitoral seja, por si só, intenciona­l para prejudicar ou beneficiar alguém”, disse Batisti à Folha. No caso do ex-governador, ele afirma que a apuração começou em março, quando os promotores tiveram o primeiro contato com as provas, e nega açodamento.

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