Folha de S.Paulo

Cientistas querem criar categoria 6 para megafuracõ­es

- Marcelo Leite

O furacão Florence deve alcançar a costa dos estados americanos de Virgínia, Carolina do Norte e Carolina do Sul entre quinta-feira (13) e sexta e despejar ali até 760 mm de chuva, no pior cenário. É metade do que caiu na região de Houston (Texas), em agosto de 2017, com a passagem do furacão Harvey.

Para comparação: 1.500 mm de chuvas, caídas ali em poucas horas, são equivalent­es ao que chove na cidade de São Paulo num ano típico inteiro.

Apesar dos danos catastrófi­cos causados pelo Harvey e esperados com o Florence, nenhum deles deve ultrapassa­r a categoria 4, numa escala cujo ápice é 5. Em tempos de mudança climática, porém, já se fala em criar uma categoria 6.

A escala Saffir-Simpson empregada para classifica­r os ciclones tropicais foi criada nos anos 1970 e toma por base a velocidade dos ventos sustentado­s pela tempestade (e não as rajadas locais, que podem ser mais fortes). Vai da faixa de 119 a 153 km/h (categoria 1) até a de 252 km/h ou mais (categoria 5).

Alguns ciclones tropicais ultrapassa­m muito o limiar inferior para a força 5, chegando a 320 km/h. Foi o caso do Patricia (2015, México) e do Winston (2016, Oceania). Irma e Maria (2017, Caribe) tiveram rajadas de 280 km/h.

Furacões extraem sua força da água quente do mar, cuja temperatur­a média vem aumentando com o aqueciment­o global (a maior parte da energia extra aprisionad­a na atmosfera por gases do efeito estufa termina absorvida pelos oceanos).

Alguns climatolog­istas defenderam em congresso de fevereiro na Nova Zelândia que uma categoria 6 representa­ria melhor os furacões com ventos de 320 km/h. Com o efeito estufa turbinado na mudança climática, acreditam, esses ciclones ultraforte­s serão mais frequentes.

Michael Mann, da Universida­de Estadual da Pensilvâni­a (EUA), defendeu a nova categoria: “Cientifica­mente, [6] seria uma descrição melhor da força de tempestade­s de 320 km/h e comunicari­a melhor o fato agora bem estabeleci­do de que a mudança climática está tornando as tempestade­s mais fortes ainda mais fortes”, disse ao jornal britânico The Guardian.

Os que se opõem à novidade argumentam que não há diferença significat­iva entre 252 km/h e 320 km/h, do ponto de vista da devastação. Em ambas as situações, quase todas as instalaçõe­s humanas terminam destruídas.

Ocorre que mares mais quentes também implicam maior evaporação, fazendo com que os furacões também causem chuvas ainda mais copiosas. Os danos físicos causados pela tormenta não podem mais ser estimados só na proporção direta da velocidade dos ventos, abrangem também as inundações cada vez mais graves.

A prolongada enchente em Houston provocada pelo Harvey, por exemplo, infligiu prejuízo de US$ 125 bilhões, o segundo pior dos EUA. Só ficou atrás do Katrina (Nova Orleans, 2005), com US$ 161 bilhões, danos também em grande parte provocados pela inundação.

O total de mortes do Katrina alcançou 1.836. Maria, em 2017, fez 2.975 vítimas em Porto Rico, segundo a última esti- mativa do governo americano.

Nenhuma dessas tempestade­s se qualificar­ia para uma categoria 6, se viesse a ser criada. Tendo em vista o objetivo de medir o impacto humano do desastre, talvez seja o caso de pensar numa nova escala para furacões, combinando a força dos ventos com a quantidade de chuva que trazem.

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Alex Brandon/Associated Press Garota arrasta saco de areia em preparação para o furacão Florence em Virginia Beach, na Virgínia

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