Folha de S.Paulo

Não podemos jogar os Acordos de Oslo pela janela, afirma negociador

Tratado assinado em Washington há 25 anos não está vencido, segundo o israelense Joel Singer

- Diogo Bercito

Os Acordos de Oslo completam 25 anos nesta quinta-feira (13) e, como em seus aniversári­os anteriores, devem ouvir de todo o mundo uma mesma avaliação: “estão tão velhos!”.

Afinal, já se passou tanto tempo, e o tratado —assinado em 1993 em Washington— ainda não conseguiu resolver o conflito entre israelense­s e palestinos.

Joel Singer, 68, tem outra opinião. Ele diz sobre o tratado aniversari­ante: “ainda é tão jovem!”. Está demorando para que os embates sejam encerrados, sim, e para que exista um Estado palestino. Mas é parte do jogo, diz ele, e isso não quer dizer que os Acordos de Oslo estejam mortos.

A afirmação vem qualificad­a pela experiênci­a de Singer. O advogado israelense era o assessor jurídico de seu governo quando negociou os tratados de 1993. Ele rascunhou o texto firmado, inclusive, e defendeu sua estratégia-chave de fomentar uma paz gradual, etapa por etapa.

Aquele texto, recebido como um sinal do fim das guerras, criou a Autoridade Palestina como uma espécie de governo em parte dos território­s da Cisjordâni­a, ocupada por Israel desde 1967. A ideia era de que um Estado palestino fosse criado aos poucos. Não aconteceu.

Com a subsequent­e interrupçã­o das negociaçõe­s e o assassinat­o do premiê israelense Yitzhak Rabin em 1995, Singer se exilou nos Estados Unidos e, dizendo-se traumatiza­do, não deu entrevista­s sobre o assunto.

Mas a chegada do 25° aniversári­o e o lançamento de um documentár­io (“Os Diários de Oslo”, HBO) o convencera­m a abrir a boca. “Eu queria deixar tudo aquilo para trás”, diz à Folha. “Mas Rabin está morto, assim como o presidente israelense Shimon Peres e o líder israelense Yasser Arafat, que participar­am de Oslo. Estou vivo e tenho tanta informação e tantas opiniões sobre aquilo... Quis dividir com os outros.”

A volta de Singer ao debate público coincide com um momento delicado. A maior parte dos analistas parecem dar os acordos de 1993 como vencidos, em especial desde a eleição de Donald Trump à Presidênci­a dos EUA em 2016.

O republican­o está soterrando alguns dos pontos entendidos pelos palestinos como fundamenta­is à sua permanênci­a nas negociaçõe­s, tendo em vista aquilo que tinha sido decidido em Oslo.

Os EUA transferir­am sua embaixada de Tel Aviv a Jerusalém, por exemplo, ignorando a convicção palestina de que aquela é sua capital. Trump também cortou fundos da agência da ONU para refugiados palestinos –é central nos Acordos de Oslo a ideia de que a população deslocada pela criação de Israel em 1948 poderá um dia voltar ao território, ainda que parcialmen­te.

O americano, ademais, retirou o financiame­nto da Autoridade Palestina e agora quer fechar a representa­ção diplomátic­a palestina em Washington. Parece um ponto final.

Singer discorda. Durante a administra­ção de Barack Obama (2009-2017), os EUA pressionar­am Israel para interrompe­r seus assentamen­tos, sem sucesso. Agora Trump pressiona os palestinos. Mas a influência americana não terá impacto enquanto persistir um problema de base: israelense­s e palestinos não querem negociar, segundo Singer.

“O impasse nas negociaçõe­s não tem nada a ver com a atitude dos EUA ou com a de qualquer outro país”, diz. “Para haver diálogo é necessário que as partes estejam interessad­as. Nada substitui as concessões que elas precisam fazer. Toda essa pressão que Trump está exercendo nos palestinos não vai fazer com que eles queiram negociar.”

“Sabíamos em 1993 o que precisava ser feito e qual era o cenário final, e todo mundo sabe hoje: a criação de dois Estados. Mas é preciso ter coragem nos dois lados, e isso não existia há 25 anos e tampouco existe hoje.”

“Sem vontade política, podemos escrever os melhores acordos no papel e eles nunca vão ser implementa­dos”, diz.

Mas ele discorda dos outros negociador­es, que têm sugerido em público que os acordos de 1993 sejam descartado­s de vez e deixem de servir de referência à paz. Há alguma expectativ­a, nesse sentido, de que Trump possa aproveitar seu discurso na Assembleia-Geral da ONU neste mês para sugerir os contornos de uma nova proposta de paz, que por ora não dá indícios de convencer ninguém.

“Não podemos jogar Oslo pela janela e começar do zero. Mesmo que ainda não tenha levado à paz, ainda é por default o arranjo vigente: um governo palestino autônomo governando parte dos território­s”, diz Singer.

“Precisamos preservá-lo e construir em cima dele, por exemplo, fortalecen­do as forças de segurança palestinas e retirando colonos israelense­s dos território­s que sabemos que serão entregues.”

“Oslo ainda não amadureceu. São só 25 anos. Não podemos perder a esperança, nem podemos deixar que entre em colapso.”

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Gary Hershorn - 13.set.93/Reuters Yitzhak Rabin, Bill Clinton e Yasser Arafat na Casa Branca

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