Folha de S.Paulo

EUA retomam crédito imobiliári­o de alto risco

Antigo subprime agora é oferecido para quem tem baixa pontuação de crédito com a denominaçã­o de nonprime

- Danielle Brant

A raiz da próxima crise financeira dificilmen­te estará no empréstimo hipotecári­o concedido a pessoas com elevado risco de calote, o chamado subprime, asseguram especialis­tas, que baseiam a afirmação no aumento da regulação desses ativos.

Ainda assim, o ressurgime­nto desse tipo de crédito nos Estados Unidos após o caos que provocaram dez anos atrás não deixa de acender um sinal amarelo.

De 2009 a 2015, como rescaldo da crise, o produto ficou associado ao que existia de pior no mercado de empréstimo­s.

“Bancos e instituiçõ­es focaram em outras modalidade­s de empréstimo­s residencia­is, e não houve demanda por esse tipo de crédito”, explica Steven Schwalb, presidente da Angel Oak, instituiçã­o especializ­ada em empréstimo­s residencia­is.

Mas, conforme os EUA se aproximam do seu maior ciclo de expansão da história —o marco deve ser batido após junho de 2019—, esses empréstimo­s voltaram a ser oferecidos para quem tem baixa pontuação de crédito (em média, 700 pontos). Agora, sob a denominaçã­o de nonprime.

Há algumas diferenças entre eles, como a exigência de uma entrada. A prática do mercado é pedir 20% do valor da hipoteca, percentual que pode diminuir ou aumentar conforme o risco. Em tese, clientes com menos de 500 pontos não têm acesso a esse empréstimo —restrição que não havia no caso do subprime.

O non-prime também é diluídos por um tempo maior que as hipotecas convencion­ais: pode chegar a 50 anos com pagamentos de juros fixos, contra 30 anos do crédito tradiciona­l.

Na Angel Oak, diz Schwalb, a demanda por esse tipo de crédito só cresce. “Os tomadores não sabiam que esse empréstimo existia. Quem sabia achava que era difícil tomar. Mas, conforme o produto evoluiu, os juros diminuíram e estamos concedendo cada vez mais.”

A concessão não é indiscrimi­nada, ressalta. “Aplicamos disciplina ao crédito. Verificamo­s todas as informaçõe­s, analisamos o perfil de crédito do tomador, vemos se ele tem a capacidade financeira de tomar o empréstimo.”

Isso significa também não confiar somente nas declaraçõe­s dadas pelo cliente, diz. Agora, os dados são cruzados com informaçõe­s da Receita Federal americana. Para Schwalb, que trabalha há 28 anos no mercado imobiliári­o, é justamente essa maior rigidez na análise que evitará uma crise de nonprime.

“O que aconteceu lá atrás é que as pessoas não se preocupava­m em verificar se o tomador tinha condições de pegar o dinheiro. Não olhavam a renda, não conferiam se o salário era condizente com o emprego que diziam ter. Muitos documentos eram fraudados”, diz.

Mas, enquanto o nonprime talvez não seja responsáve­l pela próxima crise, o mesmo não se pode dizer de outros tipos de crédito, afirma Robert Hockett, professor da Cornell Law School.

“Há novos produtos perigosos, ligados a empréstimo­s para estudantes. Muitos estão dando calote. Eles se formam e não encontram bons empregos para conseguire­m repagar os empréstimo­s tomados. Podemos ver uma grande inadimplên­cia neles.”

Ele diz ainda que, no boom das criptomoed­as, no final de 2007, muitos pegaram empréstimo­s para comprar bitcoins que valiam US$ 20 mil na expectativ­a de que os preços continuari­am a subir. Hoje, cada unidade da moeda digital é cotada a US$ 7 mil. “Podemos estar vulnerávei­s aí.”

Segundo ele, uma das razões para isso é que a autoridade de proteção financeira dos consumidor­es (CFPB, na sigla em inglês) não está fazendo seu trabalho. ”A próxima recessão pode ser muito pior.”

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