Folha de S.Paulo

Longa acerta na protagonis­ta, mas apresenta personagen­s de interesse nulo

- Inácio Araujo

É uma noite especial para o Hotel Artemis: Los Angeles está sitiada por uma revolta contra o corte de água e criminosos acorrem ao local.

O Artemis não é bem um hotel, mas uma clínica onde Nurse (Jodie Foster) atende a bandidagem que precisa de cuidados médicos e não pode recorrera um hospital regular. Nessa noites e desenrola o filme.

O ponto de partida é bom, sobretudo para uma ficção científica (a ação se passa em 2028). Há outras boas ideias. Uma delas é, claro, ter Jodie Foster no papel central. Outraéac enografia, que mistura traços de ultra-modernidad­e com primitivid­ade e produz ambientaçã­o inquietant­e.

Nem tudo são flores, porém, no percurso de “Hotel Artemis”. A começar pela fotografia, que às vezes mal permite ver o que acontece.

O roteiro tem virtudes evidentes: o desenvolvi­mento num lugar fechado é um deles, pois concentra o drama dos personagen­s em praticamen­te um só local.

Os problemas, no entanto, são igualmente graves. O primeiro deles é abarrotar o hotel de personagen­s, alguns de interesse dramático nulo. O segundo é encher o diálogo de frases grandiloqu­entes.

A direção coleciona alguns feitos. O mais interessan­teéo andar aflito de Nurse, misto de passinhos de uma velhaco ma corrida de quem precisa resolver múltiplos problemas num ambiente ilegal.

Mas tudo o que compõe Nurse é tão interessan­te quanto o contraste entre a ambientaçã­o semigótica e semifuturi­sta, ou vêla com estetoscóp­io e sangue no jaleco, num lugar que por vezes mais parece um matadouro. Outrof ei toé evitara fácil exploração das massas em revolta ou as naves estrambóti­cas que costumam habitar o futuro cinematogr­áfico.

Aqui também, no entanto, os problemas se acumulam tanto quanto os da médica. É pouco compreensí- vel que, não bastasse a escuridão natel a,comfre quência exista entre os personagen­s e a câmera algum objetos em função cênica, exceto ade prejudicar­a visão.

Se fosse um diretor como Joseph von Sternberg, poderia fazer a mesma coisa, só que, em vez de incômodo, avistado espectador sentiria prazer.

Por interessan­te que seja ter um roteirista e diretor de filmes direcionad­os a um mercado amplo voltar-se a um registro mais sutil, parece que o hábito da Hollywood atual de cortejar o óbvio dificulta levar um projeto como esse a resultado mais consequent­e.

Seria interessan­te vê-lo nas mãos de um John Carpenter (mas Carpenter é desses belos cineastas que o século 21 aposentou prematuram­ente).

Seja pelas deficiênci­as, seja pelas virtudes, “Hotel Artemis” não é de se desprezar: tanto umas quanto outras são sinais de um projeto decente, a que não faltam audácia e boas ideias, embora por vezes frustradas.

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