Especialistas esclarecem dúvidas frequentes sobre prevenção e tratamento
Não se sabe tudo sobre a doença, mas algumas práticas podem minimizar os riscos e até o sofrimento de pacientes graves
Uma das principais preocupações em matéria de saúde, o câncer é uma fonte permanente de dúvidas, sobretudo para os pacientes ou integrantes de seu círculo.
A reportagem submeteu algumas das perguntas mais frequentes a especialistas em oncologia. Confira as respostas abaixo.
A detecção precoce de um câncer garante acura? Nem sempre. Grande par tedos tumores tem cura quando diagnosticados precocemente, segundo ArturKatz,di retor-geral do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês.
Certos cânceres têm cura mesmo quando diagnosticados tardiamente, comoéo caso do câncer de testículo.
Mas as variáveis da doença e dos pacientes tornam impossível predizer sua evolução.
Tenho histórico familiar de câncer. Isso significa que terei a doença? O câncer é provocado por uma mutação genética que leva à multiplicação desordenada das células. Essa mutação, porém, não é necessariamente hereditária e, mesmo quando herdada, não significa que quem a tem vá desenvolver a doença.
A grande maioria dos cânceres está ligada a fatores relacionados ao meio ambiente e a hábitos de vida, enquanto apenas 5% a 10% são decorrentes de fatores hereditários.
Há testes genéticos que detectam mutações específicas passadas de pais para filhos. O procedimento é recomendado para quem tem histórico de vários parentes de primeiro grau acometidos com a doença ou que sabidamente tenham desenvolvido cânceres hereditários, segundo Mayana Zatz, geneticista diretora do Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e Células-Tronco da USP.
O teste genético com resultado negativo significa que a pessoa não terá a doença? Não. Mesmo sem mutações detectadas, o risco de desenvolver câncer é o mesmo de qualquer outra pessoa. Por isso, recomenda-se sempre a prevenção, afirma Mayana Zatz, da USP.
Artur Katz, oncologista do Sírio-Libanês, lembra que a ciência ainda não é capaz de reconhecer todas as mutações que podem estar relacionadas ao surgimento de tumores hereditários.
No caso incomum de alguém ter histórico familiar crítico e receber um resultado negativo, o especialista recomenda manter o acompanhamento médico e refazer o teste em algum outro momento, uma vez que a tecnologia está sempre em constante aperfeiçoamento.
Para garantir a segurança do resultado, alerta, é fundamental realizar o exame com um profissional da área.
Se o câncer não voltar em cinco anos, o paciente está livre da doença? Não necessariamente. A maior parte das recidivas acontece nos primeiros cinco anos, e cerca de 80% delas se concentram nos dois primeiros anos.
Ou seja, quanto mais tempo passa, menor é a probabilidade de retorno da doença.
Ainda assim, ultrapassar a marca dos cinco anos sem a volta dos sintomas não é garantia de imunidade, de acordo com Helano Freitas, líder de pesquisa clínica do A.C. Camargo Cancer Center.
Quem se curou de um tipo de câncer tem mais chance de desenvolver outro tumor do que alguém que nunca teve a doença? Sim, mas esse fato deve ser interpretado em termos relativos, afirma o médico Helano Freitas.
A existência do câncer significa que houve falha dos sistemas de defesa do organismo, e essa falha pode voltar a ocorrer. Não é o caso de viver em estado de preocupação constante, diz Freitas; basta fazer o acompanhamento médico com regularidade.
Siddhartha Mukherjee, pesquisador da Universidade Columbia, afirma que as razões para um segundo câncer não são completamente conhecidas, mas sabe-se que, de alguma forma, o ambiente ou os hábitos de vida do paciente tornaram a doença possível.
Cuidados paliativos são apenas para pacientes terminais? Não. Profissionais recomendam a intervenção de uma equipe de cuidados paliativos assim que qualquer doença grave for diagnosticada.
Para Daniel Forte, coordenador de cuidados paliativos do Sírio-Libanês, essas ações podem ajudar a reduzir o sofrimento do paciente e até contribuir para aumentar sua sobrevida.
É possível tomar medidas para prevenir o câncer? Especialistas recomendam algumas medidas simples: não fumar, manter uma alimentação saudável, evitar o sobrepeso, vacinar-se contra o HPV, usar filtro solar, conhecer o histórico familiar e praticar alguma atividade física frequente.
É preciso levar em conta, no entanto, que a doença é ligada a fatores genéticos e ambientais ainda não completamente conhecidos, como ressalta o pesquisador Mukherjee.
Ou seja, deve-se tomar cuidado para não culpar o paciente como se ele fosse responsável pela própria doença.
Mesmo que a mulher não tenha a mutação [genética] do câncer de mama, ela não pode deixar a prevenção de lado porque isso não significa que ela esteja livre de risco. É preciso ter cuidado Mayana Zatz, diretora do Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e Células-Tronco da USP Se as pessoas não se capacitam para tomar decisões compartilhadas, acabamos caindo em uma medicina paternalista, na qual o médico decide sozinho que riscos o paciente vai correr Daniel Forte, coordenador da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês O cérebro humano e os sistemas de computação tradicionais já não são suficientes para lidar com toda essa informação de saúde disponível, para enxergar e integrar tudo isso
Mariana Perroni, médica intensivista e coordenadora médica na IBM A tecnologia democratiza; instituições que antes precisavam gastar bilhões de dólares comprando computadores hoje podem usar um serviço na nuvem e pagar por aquilo só quando usarem Francisco Sapori, cientista de computação especialista de saúde da Microsoft Há gargalos evidentes em prevenção, controle e tratamento de câncer que não são tratados de forma efetiva. A diferença entre o sistema público e o privado, por exemplo Eduardo Calderari, diretor de Acesso ao Mercado, Relações Governamentais e Operações Comerciais na Roche Farma Brasil Precisamos nos unir para criar um marco de conscientização contra o câncer de colo de útero, que é evitável com ações preventivas. Como a campanha Novembro Azul para o câncer de próstata Angélica Nogueira Rodrigues, oncologista presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos
No Brasil, morrer é muito sofrido. O país é o 42º no ranking de piores países para morrer. É pior do que Uganda. E é claro que isso depende muito do quanto investimos na saúde José Aparecido da Silva, professor do Departamento de Psicologia da USP-Ribeirão Preto
Foi preciso eu perder cabelos, cílios e sobrancelhas para perceber que, para me sentir bem, dependia somente de mim, do que eu tinha dentro de mim e de como eu me via no espelho Vânia Castanheira, coach de bem-estar e saúde e autora do livro “O Câncer Foi minha Cura”
Atualmente, cirurgia não é sinônimo de dor e sofrimento. Quase metade das cirurgias podem ser feitas de maneira minimamente invasiva, como já é possível fazer com câncer de pulmão José Ernesto Succi, médico membro do núcleo de Oncologia Torácica da Unifesp Se eu não penso sobre morte, como vou tomar uma decisão sobre esse assunto? Fica tudo no campo do achismo. Como vou entrar em qualquer discussão sobre qualidade de morte assim? Sandra Caires Serrano, de Cuidados Paliativos do Hospital A.C.Camargo Cancer Center Estava tudo pronto para meu casamento, mas, quando chegou o dia, eu estava dormindo [em coma induzido]. Deveria estar esperando a noiva no altar, mas ela é que estava esperando eu acordar Ramon Cordovil, técnico em mecânica industrial, paciente de leucemia e criador de campanha por doação de medula óssea O desafio com a inteligência artificial, com o uso do Watson, passa por barreiras tecnológicas, mas já gera frutos para o paciente nosso —não é o paciente lá nos Estados Unidos ou em outros países
Pedro Meneleu, superintendente-geral do Instituto do Câncer do Ceará (ICC)