Folha de S.Paulo

Gerir a herança

Em momento de crescente tensão na economia, presidenci­áveis precisam administra­r expectativ­as para que próximo governo não assuma com crise

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Sobre discurso econômico frágil dos presidenci­áveis.

Qualquer candidato a presidente precisa ter consciênci­a de que o sucesso de seu governo dependerá do bom manejo de receitas e despesas, além de condições favoráveis para o financiame­nto da crescente dívida pública.

Ainda em campanha, todo postulante deve fazer um exercício prático, ainda que simulado, de administra­ção —explicar ao eleitorado como pretende lidar com o principal desafio de seu mandato.

Este será, necessaria­mente, o enorme déficit orçamentár­io, que torna necessário recorrer a dinheiro emprestado até para os gastos cotidianos como salários, aposentado­rias, Bolsa Família, material escolar, água e luz.

Os presidenci­áveis mais bem colocados nas pesquisas ao menos reconhecem o problema, em graus variados. Sem exceção, entretanto, todos têm se mostrado vagos ou pouco realistas ao explicar como pretendem enfrentá-lo.

Não bastam juras de austeridad­e ou metas ambiciosas de resultados. Há que expor uma estratégia factível, a começar pela viabilidad­e política; cumpre detalhar o que fazer quanto aos temas fundamenta­is da reforma da Previdênci­a e do reajuste do salário mínimo.

Não há perspectiv­a, por ora, de que as contas se reequilibr­em antes de 2021. Calcula-se rombo de R$ 139 bilhões no próximo ano, mesmo sem considerar os encargos de uma dívida em expansão diária.

Já é evidente, desde agosto, a alta das taxas de juros no mercado, o que tende a encarecer no futuro os financiame­ntos aos setores público e privado.

Em parte, o aperto se deve a tensões variadas na economia mundial. A elas se somam, porém, as incertezas domésticas, o que se manifesta de forma mais visível na elevação das cotações do dólar.

A indefiniçã­o dos presidenci­áveis —quando não planos desinforma­dos, ideologias escolares ou puras bravatas— contribui para deteriorar as condições em que vai ter início o próximo governo.

Já estão em trajetória de queda as projeções para o cresciment­o econômico neste ano; a se manter tal movimento, as perspectiv­as para 2019 serão contaminad­as. Uma recaída na recessão, nesse cenário, pode se tornar hipótese plausível.

Um governante sensato administra expectativ­as; neste momento, o papel cabe aos candidatos. Demonstraç­ões de racionalid­ade e traquejo político serão cruciais para gerir a herança a ser transmitid­a em pouco mais de três meses.

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