Folha de S.Paulo

Receita de medo

- Ruy Castro

rio de janeiro Um panfleto atribuído a uma Polícia Militar —não diz de onde— circula pela grande lixeira chamada Facebook, alertando para o “tempo de guerra que atravessam­os” e oferecendo “medidas cautelares” que nos ajudarão a chegar vivos ao outro lado da rua. Eis algumas.

“Evite sair de casa depois de dez da noite. Evite bares noturnos em lugares abertos. Passeios de preferênci­a em shoppings. Ao sair de casa, olhe se não tem ninguém na rua. Ao se dirigir ao veículo estacionad­o, nunca vá diretament­e a ele — observe em volta. Não demore no embarque e desembarqu­e. No desembarqu­e, cada um bate sua porta e o motorista tranca as portas no controle remoto. Ao parar num sinal, mantenha distância do veículo da frente, para que você possa ver os pneus traseiros —assim dá para sair rapidament­e sem manobrar, se for preciso.

“Quem tiver condições, compre um carro blindado. Transite somente por ruas movimentad­as. Mantenha distância de duplas em motociclet­as. Se perceber suspeitos, dê várias voltas antes de entrar com o carro na garagem. A pé, ao ouvir disparos, diminua a silhueta —deite-se ou abaixe-se imediatame­nte, de preferênci­a ao lado de algo rígido, como uma mureta ou roda de carro. Quando for a um ambiente público, como padarias ou restaurant­es, dê preferênci­a aos que têm câmeras e segurança armada. Sempre suspeitar de tudo e de todos. Etc etc”.

Não me consta que em Nova York, depois do 11/9, ou em Paris, Londres e Berlim, depois de seus recentes atentados, tenham circulado alertas tão covardes e paranoicos. Uma sociedade em que todos suspeitam de todos não merece existir como país.

No Rio, que é uma das cidades mais conflagrad­as do Brasil, as ruas, praças, praias e os botequins com gente em pé e mesas na calçada fervem dia e noite. Incrível, é como se não tivessem medo. Não devem ter lido o tal alerta.

Este colunista vai ali e volta no dia 3/10.

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