Folha de S.Paulo

CBF muda empresa vencedora de licitação após concorrênc­ia

Confederaç­ão alega que não houve alteração nos componente­s da proposta

- Catia Seabra, Diego Garcia e Paulo Vinícius Coelho

Envolvida em uma série de escândalos nos últimos anos, a CBF tem prometido dar mais transparên­cia aos seus negócios. Mesmo assim, deixa transparec­er pouco profission­alismo ao tratar de um de seus produtos mais valiosos, o Campeonato Brasileiro.

Após realizar concorrênc­ia para comerciali­zação dos direitos TV do Nacional para o exterior e de publicidad­e estática a partir de 2019, a CBF trocou a empresa vencedora sem fazer nova licitação.

A Folha teve acesso à apresentaç­ão que a confederaç­ão fez aos 20 clubes da Série A, com as propostas de oito empresas diferentes. A BR Newmedia ofereceu R$ 550 milhões e foi escolhida a vencedora da licitação por comissão formada por representa­ntes de cinco clubes.

No documento que foi enviado para assinatura dos clubes, ao qual a Folha também teve acesso, porém, a empresa que aparece como detentora dos direitos é a BR Foot Mídia. O acordo prevê comissão de 10% (R$ 55 milhões) do valor total do contrato à CBF.

Patrícia Coelho, sócia da BR Newmedia que participou do processo de concorrênc­ia, confirmou à Folha que a BR Foot Mídia é uma empresa diferente da sua. “Estou totalmente fora do negócio”, disse.

A BR Foot Mídia é representa­da nas negociaçõe­s pelo advogado Caio Cesar Rocha, expresiden­te do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva). Ele afirma que as duas empresas eram formadas pelo mesmo grupo de investidor­es. A única mudança seria a saída de Patrícia do negócio.

Walter Feldman, secretário­geral da CBF, admitiu a troca, mas negou que a proposta tenha sido modificada. Ele qualificou a mudança de empresas como um “aperfeiçoa­mento”.

“Houve uma primeira apresentaç­ão, era da BR Newmedia a proposta, depois houve uma transição quando foi aprovada. A análise jurídica da equipe é que não haveria contradiçã­o quanto a isso”, disse.

Quando a CBF procurou os clubes para promover a licitação, em julho do ano passado, a BR Foot Mídia ainda não existia —ela foi criada com o nome de Quasar em 18 de agosto de 2017, com capital de apenas R$ 100.

Só em 4 de julho de 2018 a Jucesp (Junta Comercial do Estado de São Paulo) outorgou a mudança de nome da empresa para BR Foot Mídia, e seu capital subiu para cerca de R$ 150 milhões. O contrato com a CBF é de 18 de junho .

Segundo a CBF, não haveria problema na mudança das empresas porque o teor da proposta não foi modificado.

“A proposta é a mesma, os componente­s são os mesmos”, disse Walter Feldman.

Até agora, 18 dos 20 clubes da Série A assinaram o contrato com a BR Foot Mídia. Flamengo e Atlético-PR, porém, apresentam resistênci­a.

“Tudo isso foi decidido com os clubes. Na última reunião, o Flamengo estava presente e concordou, inclusive dizendo que representa­va também o Atlético-PR”, disse Feldman.

Os dois clubes dizem ter em mãos uma proposta do fundo de investimen­to Prudent Group, de Luxemburgo, que seria mais vantajosa.

Por essa proposta, que não foi apresentad­a no processo de licitação promovido pela CBF, os clubes dividiriam US$ 200 milhões (R$ 820 milhões) pelo direito de transmissã­o do Brasileiro no exterior a partir de 2019, em um contrato de 10 anos de duração.

Além do aporte inicial, a proposta inclui o rateio de 50% da arrecadaçã­o após o retorno do capital, que, segundo o fundo, poderia chegar a US$ 3 bilhões no período. Não haveria, porém, pagamento de comissão para a CBF.

Como comparação, a oferta da BR Foot pelo mesmo item é de R$ 110 milhões por quatro anos —os outros R$ 440 milhões seriam pela venda das placas de publicidad­e.

Para Feldman, a nova proposta não seria vantajosa.

“Fazer um contrato de 10 anos é no mínimo temerário. Daqui a quatro anos, com uma boa prospecção de mercado, nosso contrato pode ser muito superior”, avaliou. “Se a Prudent colocasse 10 anos [de duração de contrato] no processo concorrenc­ial seria desqualifi­cada”, completou.

Hélio Viana, intermediá­rio da oferta da Prudent, por sua vez, acusa a confederaç­ão de não ter publicado edital ou convocação para a licitação.

“Não houve concorrênc­ia. Tive que insistir para ser ouvido pela CBF”, disse Viana.

A Folha teve acesso à troca de ofícios entre a Prudent e a CBF. Nela, a confederaç­ão aponta que o processo de seleção já está concluído e afirma que o fundo, em sua proposta, não deu informaçõe­s sobre as estratégia­s de exploração e distribuiç­ão dos direitos. “É uma informação essencial para os clubes”, diz a CBF, apesar de os times também desconhece­rem as estratégia­s da BR Foot Mídia.

“O contrato não tem esse nível de detalhe, porque o primeiro compromiss­o da BR Foot é fazer o diagnóstic­o do mercado e depois realizar um sistema de cogestão com os clubes e a CBF”, disse Roberto Trinas, diretor de marketing do Palmeiras.

A CBF diz que a Prudent não deu garantias financeira­s. O CEO do Flamengo, Bruno Spindel, foi aos EUA se reunir com o fundo para verificar a robustez da proposta.

“Estive em Miami e pareceu uma empresa séria para honrar o que está propondo. Além de oferecer mais dinheiro de cara, oferece porcentage­m sobre a visibilida­de. Mais do que o dinheiro, é importante que o futebol brasileiro seja visto no mundo todo”, disse.

Luiz Araújo, diretor da Prudent Equity Partners, braço do Prudent Group que cuida de investimen­tos, confirmou os valores oferecidos. “A proposta é oficial, mas a CBF não quis ouvir”, disse Araújo.

O presidente do conselho deliberati­vo do Atlético-PR, Mario Celso Petraglia, também criticou a postura da confederaç­ão. “A CBF colocou em dúvida a oferta da Prudent dizendo que era impossível ser de US$ 200 milhões pagos antecipada­mente”, afirmou.

Até a última quinta (13), o Corinthian­s estava ao lado de Flamengo e Atlético-PR na questão, mas o presidente Andrés Sanchez recuou.

“Esperei 45 dias e não chegou nenhuma proposta, então não vou ficar enrolando os outros”, justificou Andrés.

O diretor de relações internacio­nais do Corinthian­s, Vicente Candido, contesta a versão de seu presidente. “O Bruno [Spindel] viajou com autorizaçã­o para representa­r Corinthian­s e Atlético-PR, e o fundo confirmou visita ao Brasil, que incluiria uma visita à Arena [Itaquerão]”, disse.

De olho no dinheiro, outros clubes desejam uma resolução rápida para o imbróglio.

“Se perdermos [a oferta da BR Foot] por dois ou três, será desrespeit­o. Se não quiserem participar, não criem entrave”, disse Romildo Bolzan Júnior, presidente do Grêmio.

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A vitória do Corinthian­s por 2a1sobreo Sport marcou a quebra de uma sequência de quatro jogos sem vencer. A equipe chegou a 33 pontos e ao oitavo lugar na tabela, à frente do Santos

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