Pesquisa influencia Bolsa, que dispara, e dólar, que recua
Na contramão do mundo, que teve dia ruim, avanço de Bolsonaro faz Bolsa brasileira disparar 3,80% e dólar ficar abaixo de R$ 4
No dia seguinte à pesquisa Ibope que mostrou crescimento do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) para 31%, a Bolsa teve a maior alta diária desde novembro de 2016, e o dólar caiu. O mercado o considera mais inclinado que Fernando Haddad (PT) a promover as reformas necessárias para a recuperação da economia.
O mercado financeiro começa a colocar em suas projeções —e no preço dos ativos— a possibilidade de Jair Bolsonaro (PSL) vencer a corrida presidencial ainda no primeiro turno.
A euforia que tomou conta das mesas de operação se refletiu nos números nesta terça-feira (2).
A Bolsa disparou. Registrou alta de 3,80% —a maior alta diária desde novembro de 2016. O pregão foi a 81.612 pontos, no maior nível desde 22 de maio, no início da paralisação dos caminhoneiros.
A alta foi puxada por ações de estatais. Os papéis do Banco do Brasil subiram mais de 11,41% e impulsionaram ações do setor bancário. Os papéis preferenciais da Petrobras avançaram 8,66%, enquanto os ordinários ganharam 6,74%.
O mesmo efeito se viu no câmbio. O dólar recuou 2,09%, ficando abaixo de R$ 4 —fechou em R$ 3,9350, o menor patamar desde 17 de agosto. Ao longo do dia chegou a ser negociado a R$ 3,9060.
Apenas três divisas emergentes se valorizaram frente ao dólar nesta terça: o peso argentino, o real e o iene.
A reação no mercado brasileiro foi completamente descolada do exterior. Refletiu em particular o resultado da pesquisa Ibope, divulgada na segunda-feira (1º), após o fechamento do mercado.
O levantamento mostrou crescimento da vantagem de Jair Bolsonaro (PSL) sobre o segundo colocado, Fernando Haddad (PT).
Segundo o Ibope, Bolsonaro avançou para 31% das intenções de voto, enquanto o petista ficou estagnado em 21%. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
Em um segundo turno, os dois voltaram a aparecer empatados, com 42%. Além disso, a rejeição a Haddad disparou.
A pesquisa foi registrada no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sob o número BR08650/2018.
“Muitos analistas esperavam que as intenções de voto de Bolsonaro fossem afetadas depois dos protestos contra o candidato no fim de semana”, escreveu Tony Volpon, economista-chefe do banco UBS em relatório.
“A pesquisa surpreendeu porque Bolsonaro estava perdendo tração”, diz Victor Candido, economista-chefe da corretora Guide.
“Ele apanhou a semana inteira na imprensa, dos adversários e aí chega na pesquisa e abre quatro pontos, e Haddad fica estagnado.”
O favoritismo de Bolsonaro foi reforçado no início da noite desta terça com a divulgação da pesquisa Datafolha.
O capitão alcançou 32% das intenções de votos. Em segundo lugar, Haddad tem 21%.
Entre analistas brasileiros, há quem trabalhe com a possibilidade de Bolsonaro sair vencedor já no primeiro turno.
O capitão reformado é considerado um candidato mais inclinado a promover as reformas que o mercado considera necessárias para a recuperação da economia.
A visão dos investidores locais contrasta com análises feitas por economistas estrangeiros, que não alimentam as mesmas certezas sobre o fôlego reformista de Bolsonaro.
Nesta segunda, a agência de classificação de risco Standard&Poor’s disse que Bolsonaro representava um risco maior à agenda econômica do mercado do que Haddad.
Semanas antes, a revista The Economist, conhecida por seu viés liberal, também apontou riscos com Bolsonaro.
“O mercado interno torceu nariz [para a Economist e a S&P]. A reação é de que esses caras não conhecem o Brasil”, afirma Candido.
“Não importa muito se ele [Bolsonaro] é ou não reformista, se ele se rendeu ou não ao liberalismo. É percebido como reformista. Isso combinado à narrativa de que não há espaço para o PT”, diz Felipe Miranda, economista e estrategista-chefe da Empiricus.
Para Miranda, até então os preços dos ativos não embutiam nenhuma probabilidade de vitória no primeiro turno, o que também ajuda a explicar a queda do dólar e a disparada da Bolsa.
“Quanto é essa probabilidade? Cinco por cento? Dez por cento? Preciso colocar essa probabilidade nos preços, ela existe”, diz.
O Ibope indica que Bolsonaro tem 38% dos votos válidos (descontados brancos e nulos), ante 25% de Haddad. No Datafolha, a relação é 38% e 24%, respectivamente. Para vencer no primeiro turno, um candidato precisa obter 50% mais um dos votos válidos.
“Uma vitória de Bolsonaro já no primeiro turno ainda exige que ele conquiste 70% dos votos depositados nos quatro candidatos ‘azuis’ (Alckmin, Alvaro, Amoedo e Meirelles) ou 55% dos votos deles somados aos de Marina Silva”, escreveu a XP em relatório.
Para os analistas, a permanência da euforia vai depender das próximas pesquisas.
É o extremo viável na eleição que barraria as sandices econômicas que já sabemos que virão do PT.
De fato, Haddad não tem dado sinais de convencer o mercado de que fará algo muito diferente do que se viu em 13 anos de governo. O problema Victor Candido economista-chefe da Guide maior é que não há tempo a perder.
Se em 2011 era possível aceitar Dilma com toda sua inoperância política, agora a crise já está instalada nos porões da casa. Sem a reforma da Previdência, todo o regime fiscal que começou a ser criado em 2016 vai por água abaixo.
Não ajuda no discurso petista dizer que vai parar as concessões de óleo e gás para esperar a Petrobras se fortalecer, revogar a reforma trabalhista e taxar o spread bancário.
Ou seja, mais do mesmo, e isso o mercado sabe muito bem onde dará. É crise na certa.
Bolsonaro, por outro lado, agrada ao mercado pelo seu provável superministro da Fazenda, Paulo Guedes.
A agenda ultraliberal do candidato é o ar de continuidade das políticas que Michel Temer começou a fazer em 2016.
Vale dizer que Bolsonaro não é o candidato dos sonhos do mercado. Alckmin sempre teve esse papel, mas essa terceira via se provou malfadada e o mercado vai com o que é possível, literalmente.
Não há nesse cálculo nenhum componente político. O encanto pela agenda liberal é na economia, só que a grande dúvida é qual a viabilidade disso tudo.
Guedes ainda parece errático em suas propostas. Vai vender as estatais ou não? Qual a reforma tributária afinal? A reforma da Previdência é a que está no Congresso ou vai para o regime de capitalização?
São dúvidas que o mercado não ignora, mas que para ele parecem mais razoáveis do que a agenda petista.
Mas a curva de aprendizagem de Guedes e Bolsonaro no governo coloca a dúvida também se haverá tempo hábil para errar. Atrasar as reformas coloca a agenda fiscal em rota de colisão não muito diferente do que o PT entregaria.
Se o candidato é autoritário ou não e se seu vice-presidente aludiu a um autogolpe se necessário, não são questões relevantes para o mercado.
Se ele acha que as reformas vão ser feitas é o que importa, mesmo com toda a irrealidade das propostas.
Por isso, há uma grande chance de a lua de mel do mercado com Bolsonaro acabar em divórcio nada amigável se ele não mostrar viabilidade política real para sua agenda.
“O mercado interno torceu nariz [para a Economist e a S&P]. A reação é de que esses caras não conhecem o Brasil