Folha de S.Paulo

Com esse cenário, passei a olhar guias de viagem

- Ruy Castro

Diante da probabilid­ade de ter de viver sob Lula, digo, Fernando Haddad, ou Jair Bolsonaro nos próximos quatro anos, andei consultand­o guias de viagem, cadernos de turismo e prospectos de agências em busca de ideias sobre para onde me escafeder, dentro das minhas possibilid­ades. O Brasil, certamente, não será um país salubre com essas facções no poder. Depois de concluir que não poderia ir muito longe, convenci-me de que a maioria dos lugares também tem seus problemas —ditaduras falidas, presidente­s malucos, guerras religiosas, ameaças terrorista­s ou povos em fuga da miséria e morrendo no mar.

Resolvi então procurar um lugar para onde pudesse ir sem sair da minha própria cabeça —um lugar imaginário, utópico, distante dos aborrecime­ntos que nos esperam. Há muitas opções: Atlântida, Avalon, Brigadoon, Camelot e a própria Utopia —mas esses vivem congestion­ados, todo mundo quer ir para lá. Resolvi procurar opções menos batidas. A ilha de Speranza, a cujas costas foi dar o náufrago Robinson Crusoe. Lilliput e Laputa, as ilhas de Gulliver. Kor, na África Oriental, em cujas cavernas reina Ayesha. E, naturalmen­te, Oz.

Pensei em Opar, também na África, onde fica o tesouro de Tarzan. Bangalla, idem, na África, onde a dinastia do Fantasma mantém a paz há 400 anos. A chiquérrim­a Xanadu, onde moram Mandrake e a princesa Narda. E até mesmo Mu, o reino pré-histórico de Brucutu.

Sempre tive vontade de conhecer Pasárgada, onde Manuel Bandeira era amigo do rei. E Maracangal­ha, para onde Dorival Caymmi ia de chapéu de palha e convidava uma certa Anália, e, quando ela não queria ir, ele ia só, de tão bom que era.

Mas o melhor destino é a Terra do Nunca, onde nenhuma criança é obrigada a ficar adulta e até os piratas são benignos. Lá, em algum lugar para o qual não há a menor pista ou indicação, está enterrado o futuro do Brasil.

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