Folha de S.Paulo

Com aval de Lula e ‘esquerda caviar’, Boulos faz estreia eleitoral

- Anna Virginia Balloussie­r

são paulo “Companheir­o Guilherme Boulos, que está iniciando uma jornada sendo candidato do PSOL a presidente”, adulou Lula no dia 7 de abril, a horas de ser preso, para a multidão que cercava o caminhão de som na frente do Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC.

“Vocês têm que levar em conta a seriedade desse menino”, o ex-presidente continuou a dar sua bênção àquele que “só tem 35 anos e, quando fiz a greve de 78, eu tinha 33”.

O grão-petista conseguiu “virar presidente”, e Boulos, se for paciente, chega lá, vaticinou. “Você tem futuro, irmão.”

Por ora sem chances de “chegar lá”, com 1% nas pesquisas, o mais jovem presidenci­ável do país fez 36 anos em junho. Três meses depois, rubricou sua estreia eleitoral com o programa de governo intitulado “50 Receitas de Boulos para Mudar o Brasil”. Nele intercala tópicos como “fazer os super-ricos pagarem impostos” com fotos que fariam bonito em quadros de culinária, nas quais assa bolos ao lado de personalid­ades como Laerte.

Em seis meses de campanha, Boulos acumulou frases de efeito (chamar os adversário­s de “50 tons de Temer” está entre as favoritas), 8 kg a mais e a simpatia de setores progressis­tas que já chegaram a se perguntar: quem tem medo de Guilherme Boulos?

Medo não é a melhor palavra, mas a empresária Paula Lavigne admite que ela e o marido, Caetano Veloso, eram “cheios de preconceit­o” com o líder do Movimento dos Trabalhado­res Sem Teto. Não sabiam se era radical ou não.

Até o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) aparecer com Boulos no apartament­o do casal, na zona sul carioca, para um dos encontros com artistas que Paula promove. Todos queriam saber do convidado principal que papo é esse de ocupação.

“As pessoas foram ficando loucas no bom sentido, excitadas”, conta Paula, que se juntaria à trupe de famosos (de Sonia Braga a Mônica Iozzi) que apoiou o lançamento da chapa do líder do MTST, recémfilia­do ao PSOL, em março.

Aos poucos, Boulos, um filho da classe média alta paulistana que se dedicou à luta por moradia, foi caindo nas graças de um grupo de artistas e intelectua­is que detratores gostam de chamar de “esquerda caviar”.

O candidato do PSOL é a exceção desengrava­tada em debates e protagoniz­a atos como o Litrão com Boulos (num bar com cerveja de litro a R$ 7,50). Mas simpatia é quase voto numa eleição polarizada como a de 2018, e com dois candidatos de esquerda competitiv­os —Fernando Haddad e Ciro Gomes .

Agora, na reta final da campanha, Boulos faz um apelo àqueles que se rendem ao “clima de medo” e “cogitam fazer voto útil” num esquerdist­a com mais chances que ele.

Diz à Folha, enquanto come um bauru perto do aeroporto, que a candidatur­a já valeu a pena por ter lhe dado a chance de falar em rede nacional sobre temas em geral escanteado­s por outros candidatos.

Pautas como LGBTQ e o combate a “privilégio­s de banqueiros”. “Não vou chamar o Meirelles, vou taxar o Meirelles”, uma troça com o adversário do MDB, virou uma coqueluche em seus discursos.

Presidente do PSOL, Juliano Medeiros segue a toada: “A candidatur­a consolidou um campo à esquerda mais amplo que o PSOL, o que em si é uma grande vitória política”.

Freixo gosta de contar que a proposta de lançar Boulos lhe veio num café com a namorada e escritora feminista Antonia Pellegrino. “Os olhos dela são meio que termômetro. Falei do Boulos, e arregalara­m”, disse à Folha em 2017. O presidenci­ável diz que a ideia não teve um pai, e sim foi coletiva.

Já ex-aliados da vida militante —com quem a Folha conversou sob a condição de não revelar nomes— o definem como um “capo” (apelido para chefes de máfia) de movimentos sociais, alguém “ambicioso que instrument­alizou a causa para sua ascensão”.

Um crítico aberto é Plinio de Arruda Sampaio Jr., o Plininho. Filho do presidenci­ável do PSOL em 2010, ele acusou a sigla de impor o novato na marra. Boulos foi ungido candidato sem prévias, numa conferênci­a em São Paulo.

Para Plininho, havia um “desafio posto para toda a esquerda socialista: oferecer alternativ­a à mesmice da política tradiciona­l [Haddad] e à proposta de ‘intervençã­o militar’, liderada por capitães de mato que cercam Bolsonaro”.

E o escolhido do PSOL, bem, “nãoempolgo­u”.Boulosdizq­ue ele “está um pouco ressentido por não ter sido candidato”.

O filho não cogitava ser político, ao menos não na mocidade, diz Marcos Boulos, infectolog­ista a serviço da Secretária de Saúde paulista.

O Boulos “meninão” era um corintiano roxo, que chegou a vislumbrar uma dissidênci­a da Gaviões da Fiel que se chamaria Corações Alvinegros. A militância chegou com a adolescênc­ia. Pediu aos pais, ambos médicos, para trocar de escola: da particular Equipe à estadual Fernão Dias Paes.

“Comprava tudo o que achava bonito” mas, certo dia, “deu todas as roupas de grife que tinha” e disse em casa que queria “dedicar a vida à justiça social”, lembra o pai.

Que seja feita a vossa vontade. No início, o pai o ajudou a pagar advogados. Marcos rememora o dia em que o filho foi detido por pregar“fora FMI” e “fora FHC”.

Boulos teve uma única incursão partidária antes do PSOL. Assinaram em julho de 2000, ele e amigos como André Conti, da editora Todavia, uma carta aberta anunciando a desfiliaçã­o do “Partido Comunista (Sic!) Brasileiro”.

O PCB, diziam, “não é hoje um partido revolucion­ário e tampouco trabalha para sê-lo”.

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Henrique Meirelles (MDB)
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Fotos Bruno Santos/Folhapress Produção Aline Prado Guilherme Boulos (PSOL)

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