Folha de S.Paulo

Resistênci­a de generais é vencida por Bolsonaro

Alto Comando desconfiav­a do capitão reformado, mas três egressos do órgão azeitaram relações

- Igor Gielow

são paulo Com uma tropa de generais da reserva com forte influência sobre o Alto Comando do Exército participan­do de sua campanha presidente, Jair Bolsonaro (PSL) venceu o grosso da resistênci­a que sofria entre oficiais generais da Força.

Segundo a Folha apurou junto a oficiais superiores da ativa e da reserva, além de políticos com interlocuç­ão na área, o capitão reformado é hoje o preferido da maioria dos 17 generais de quatro estrelas da corporação —o topo da hierarquia.

Nem sempre foi assim. Bolsonaro saiu em 1988 do Exército após vários problemas disciplina­res e um rumoroso processo no qual foi absolvido de tentar explodir bombas em quartéis para reivindica­r aumento salarial. Sua carreira de polemista parlamenta­r nunca atraiu simpatia do alto oficialato.

Isso começou a mudar em setembro de 2017, quando Bolsonaro começou a montar o núcleo de seu programa de governo: os generais quatro estrelas da reserva Augusto Heleno e Oswaldo Ferreira.

O primeiro era seu favorito a vice, mas ficou de fora por causa de uma trapalhada política (filiou-se ao nanico PRP, que roeu a corda do apoio).

Heleno é o decano do grupo —até pelo decantado respeito hierárquic­o, já que é de uma turma mais antiga, a de 1969. Ferreira, por sua vez, usou sua experiênci­a como chefe da engenharia do Exército e organizou os grupos de trabalho que hoje sustentam o programa bolsonaris­ta.

São os únicos egressos do Alto Comando na equipe do candidato. Há ainda outro general, um engenheiro militar, Aléssio Ribeiro Souto, que cuida da área de educação, ciência e tecnologia. Há poucos dias, disse em entrevista ao UOL que livros didáticos deveriam incluir a verdade” sobre o regime militar de 1964.

A Força Aérea tem dois representa­ntes no grupo, entre eles o brigadeiro Ricardo Machado, de quatro estrelas. É uma tentativa de estabelece­r pontes entre o ambiente excessivam­ente verde-oliva, para ficar na cor associada ao Exército, e outras Forças.

Aviadores e marinheiro­s no geral temem ser menos favorecido­s do que integrante­s do Exército em um eventual governo do deputado.

Um oficial-general da Marinha disse, sob reserva, considerar o Alto Comando da Força mais refratário ao estilo do capitão reformado.

Há também três oficiais do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal, um deles da ativa.

Os estrelados da reserva têm ascendênci­a variável sobre quem está na ativa, mas a chegada de Hamilton Mourão ao time neste ano mudou esse patamar. Ele era visto como o líder mais forte do grupo depois do comandante.

O quatro estrelas passou os três últimos anos colhendo polêmicas —de sancionar uma homenagem ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra e sugerir a incompetên­cia da então presidente Dilma à ideia de intervençã­o militar.

Acabou afastado, numa cerimônia em que o comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, o saudou efusivamen­te. Eles são amigos próximos, assim como Ferreira e Heleno.

Mourão acabou na vice de Bolsonaro, selando a aproximaçã­o com o Alto Comando. O apoio, contudo, não é institucio­nal. E tem bastante a ver com a ojeriza que a Força tem ao PT —uma ironia, dado que o governo Lula privilegio­u investimen­tos militares.

Villas Bôas é um moderado, sempre tentando acomodar crises. Com a saúde fragilizad­a por uma doença degenerati­va, contudo, viu parte de sua interlocuç­ão ser dividida com um conterrâne­o de Cruz Alta (RS), Sérgio Etchegoyen.

Membro do Alto Comando que passou à vida política como chefe do Gabinete de Segurança Institucio­nal, recriado por Michel Temer (MDB), Etchegoyen é visto como um general dado a riscos. Fomentou ativamente a intervençã­o federal na segurança do Rio.

É muito próximo de Mourão, com quem conversa toda semana. Carrega no DNA desavenças com o poder civil: protestou contra a inclusão de seu pai, o general Leo, nos anais da Comissão da Verdade como integrante do aparelho repressor da ditadura.

Outro fator a considerar é o fato de que o próximo chefe da Força poderá sair do grupo de generais de quatro estrelas que foram seus colegas na Academia Militar das Agulhas Negras, turma de 1977.

Por critério de antiguidad­e, eles estão na frente da fila para assumir, mas a praxe já foi desrespeit­ada: Villas Bôas era o terceiro mais antigo quando foi indicado em 2015.

O mais antigo é Edson Leal Pujol, chefe do Departamen­to de Ciência e Tecnologia. Ele já disse publicamen­te considerar a persona política do excolega exagerada, mas nunca o criticou mais duramente.

Depois dele, vêm os generais Paulo Humberto César de Oliveira (Estado-Maior), Mauro Cid (Departamen­to de Cultura e Educação, responsáve­l pelas escolas militares tão ao gosto de Bolsonaro, o que pode cacifá-lo) e Carlos Alberto Barcellos (Logística).

Segundo colegas, nenhum deles têm contato formal com a campanha, mas conversam com seus integrante­s. O mesmo ocorre no entorno da chefia do Ministério da Defesa, ora ocupada por outro quatro estrelas da reserva, Joaquim Silva e Luna.

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