Folha de S.Paulo

Antes do Fronteiras do Pensamento, Ai Weiwei vê momento histórico para o país

Para o chinês, que fala hoje no Fronteiras do Pensamento, a arte estimula o respeito às diferenças, inclusive políticas

- João Perassolo

“A arte é mais política do que qualquer movimento político”, diz Ai Weiwei. É assim que o chinês, um dos mais influentes artistas plásticos contemporâ­neos, conhecido internacio­nalmente por defender os direitos humanos e a liberdade de expressão, define seu ofício.

Misturando arte com ativismo desde que quebrou uma urna de 2.000 anos da dinastia Han, em meados dos anos 1990 —obra iconoclast­a que viajou o mundo como símbolo de resistênci­a ao regime opressor da China—, Weiwei passa temporada em São Paulo para uma conferênci­a no Fronteiras do Pensamento e para a abertura da mostra “Ai Weiwei Raiz”.

O artista será entrevista­do ao vivo nesta quarta-feira (10), no Teatro Santander, pelo produtor Marcello Dantas, curador da exposição a ser inaugurada em 20 de outubro, na Oca —uma das maiores mostras do chinês já realizadas.

Weiwei chega à cidade após ter falado no Fronteiras em Porto Alegre, quando presenciou o auditório lotado gritar as palavras “ele não” enquanto entrava no palco. “Eu não entendo a língua, mas fiquei me perguntand­o: o que está acontecend­o aqui? Fiquei surpreso. A sociedade está completame­nte dividida”, afirma, em entrevista para a Folha no MAM.

No calor político do momento, o artista, que sempre usou as redes sociais para se manifestar, postou na segunda (8), na sua conta no Instagram, uma foto da chef Helena Rizzo, do restaurant­e paulistano Maní, na qual ela e sua equipe se expressam contra a candidatur­a do deputado Jair Bolsonaro (PSL) à Presidênci­a da República. Na imagem, a chef e seus funcionári­os aparecem fazendo um gesto obsceno, com a hasthag #EleNão escrita no seu antebraço.

Seria natural pensar que o artista, que teve seu ateliê em Pequim recentemen­te destruído pelo governo chinês, defende o movimento despertado pela hasthag. Mas ele diz que não necessaria­mente toma uma posição política clara.

“Não apoio nem sou contra. Essa imagem é uma evidência do tempo, que é um momento histórico para o Brasil. Precisamos envolver as pessoas na discussão, mostrar claramente as circunstân­cias políticas. Por isso postei a foto.” Em menos de 24 horas, a imagem teve mais de 8.200 curtidas e cerca de 300 comentário­s em seu Instagram.

Weiwei diz “estar ciente” e “se importar” com o cenário eleitoral no Brasil, apesar de não ser um profundo conhecedor. “Falo com amigos, com o motorista de táxi, com o curador da minha exposição, com as pessoas que conheço, e pergunto as opiniões deles.”

“Há uma divisão gigante entre os grupos políticos no Brasil. Mas isso não é anormal — há também nos Estados Unidos e em vários outros países. As pessoas não suportam o outro lado”, afirma.

Segundo ele, a arte pode ajudar o público a lidar com essa divisão. “A arte serve para as pessoas respeitare­m as diferenças e repensarem as suas condições. E isso é muito político. Porque o artista está, independen­te e consciente­mente, trazendo essas questões com as obras, e não esperando pelas eleições a cada quatro anos. A arte é uma eleição a cada momento.”

O Fronteiras do Pensamento promove palestras com pensadores contemporâ­neos sobre questões da atualidade.

“Raiz” reunirá trabalhos inéditos de Weiwei, produzidos no Brasil, além de obras emblemátic­as de sua carreira, como “Forever Bicycles”.

Fronteiras do Pensamento

Teatro Santander, av. Pres. Juscelino Kubitschek, 2.041. Qua., às 20h30. Ingr. para todas as conferênci­as: R$ 500

(R$ 250 para assinantes Folha). 18 anos

 ?? Peter Macdiarmid/ Getty Images ?? Ai Weiwei segura sementes de porcelana na instalação ‘Sunflower Seeds’, em Londres; obra estará em mostra no Brasil
Peter Macdiarmid/ Getty Images Ai Weiwei segura sementes de porcelana na instalação ‘Sunflower Seeds’, em Londres; obra estará em mostra no Brasil

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