Folha de S.Paulo

Um PSDB para chamar de seu

Partido deixou vago o espaço do centro político

- Miguel de Almeida Escritor e diretor dos documentár­ios “Não Estávamos Ali para Fazer Amigos” e “Tunga, o Esquecimen­to das Paixões”

Talvez você não saiba, mas você precisa de algo assim como um… PSDB. Pode até negar, torcer a boca em esgar, só que o Brasil, para ser moderno, necessita de um partido de massas de centro. À esquerda, há o PT; à direita, havia o falecido PFL de Marco Maciel, e hoje há uma confusão de mal-intenciona­dos; talvez o Novo possa ocupar o espaço.

A quantidade de votos nulos, brancos e abstenções no primeiro turno (espere só para ver a lambança do segundo) exibe o enorme espaço do centro político brasileiro. Vazio. À espera de ser ocupado por um partido como o velho PSDB de guerra. Não pelo atual.

O PSDB, dos bons, começou a naufragar em 2002, quando FHC fez corpo mole e preteriram Tasso Jereissati à Presidênci­a da República. O candidato José Serra chegou à campanha com a convicção, quer dizer, sem nenhuma convicção.

Em lugar de defender a estabilida­de econômica alcançada por FHCMalan-Franco-Arminio, os avanços trazidos pelas privatizaç­ões, mostrou-se dúbio, inseguro inclusive sobre as próprias ideias. É um caso raro de duvidar de si próprio. Eleitor não gosta de corpo mole.

Em 2006, Geraldo Alckmin foi ao pleito ainda menos convicto. Eram evidentes os benefícios das privatizaç­ões (telefonia, estradas, Vale etc), só que os luditas-petistas o assustaram, e lá foi ele se vestir de petrolino. Palhaçada e medo não dão voto.

O fim do velho PSDB ocorre com Aécio Neves (toc, toc), em 2014. Enfrentou Dilma Rousseff com a convicção de quem entra num outlet da Osklen. Você revê suas entrevista­s e percebe por que acabou derrotado. Teve milhões de votos porque buscava-se desesperad­amente um anti-PT.

Aécio será ele mesmo, sem marketing, nos diálogos olhos-nos-olhos com Joesley Batista. Naquela sua linguagem boca de fumo.

Ano passado, o futuro do PSDB de novo passou pelas mãos de Tasso Jereissati. Mas o partido não quis guilhotina­r Aécio, preferiu fechar com Temer, manteve uns carguinhos (Aloysio Nunes, que vergonha!) e insistiu em Geraldo Alckmin, que jamais condenou publicamen­te a traição de Aécio Neves.

Tasso seria o dado novo, em 2002 e 2018. Quando Alckmin fala grosso, como Tasso, o eleitor desconfia. Não é de seu feitio.

O final desse PSDB melífluo, oportunist­a e invertebra­do se dá agora sob o comando de João Doria Jr. Coxinhas do partido, como Beto Richa e Marconi Perillo, êmulos do companheir­o paulista, ficaram lá atrás pelas urnas.

O discurso malufista de segurança pública foi derrotado em 1998 por Mario Covas, que nunca escondeu o que pensava —mesmo perdendo votos— e nunca mudou de opinião para ganhar eleição.

O eleitor do centro democrátic­o deseja um capitalism­o moderno, não estatizant­e, mas não concorda com a ideia de autorizar a polícia a matar primeiro e depois perguntar. Deseja a reforma previdenci­ária, porque afinal as pessoas estão vivendo mais, só que não quer ver espigões subindo em áreas áreas verdes ou de mananciais. O discurso liberal não pode dizimar com a vontade das minorias ou com questões polêmicas, como descrimina­lização de drogas ou do aborto. O corpo é meu, não do Estado.

Ao dar voz a Aécio, João Doria e Perillo, personagen­s da velha direita em trajes de tiozinho da Sukita, o PSDB se afastou da agenda modernizad­ora de centro, capaz de contemplar a economia liberal e a liberação nos costumes. Sem deixar de prever programas sociais, como os criados por Ruth Cardoso e Vilmar Farias e malandrame­nte encampados por Lula. Não podemos esquecer que a escola de Chicago já matou mais gente do que Al Capone.

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